Padre Pinho e Juvenópolis, a Cidade dos Meninos de Maceió

Estátua do Padre Pinho em Juvenópolis

A partir de 27 de outubro de 1940, com a instalação da Ação Católica em Alagoas, a Igreja Católica local passou a viver um dos períodos de maior ativismo religioso e social da sua história.

A iniciativa da organização de tal movimento cristão em Alagoas foi entregue ao arcebispo Dom Ranulpho da Silva Farias, que teve como assessor eclesiástico o então padre Adelmo Machado.

Foi como um dos resultados desta mobilização que se instituiu, no dia 13 de maio de 1945, o Secretariado de Assistência Social da Juventude Masculina Católica da Arquidiocese de Maceió, sob a coordenação do padre João de Barros Pinho, líder do grupo de jovens do Centro Arquidiocesano e da Juventude Estudantil Católica (JEC) São Luiz Gonzaga, núcleo do Colégio Estadual de Alagoas, antigo Liceu Alagoano.

Liceu Alagoano em 1920, na Rua do Livramento. A partir de 1945 passou a ser o Colégio Estadual de Alagoas

Esta associação se propunha, obedecendo ao artigo 2º do seu Estatuto, atuar em “defesa da sociedade contra todos os males modernos, pelos meios que parecem convenientes, inclusive: imprensa, rádio, assistência aos operários, assistência aos estudantes pobres, divertimentos sadios, pugnando, sobretudo, pelas causas justas, pelo respeito à dignidade do homem, dentro dos princípios de uma democracia cristã”.

Padre Pinho

Não se conseguiu identificar sua origem familiar, mas sabe-se que o padre João de Barros Pinho nasceu em São José da Laje no dia 29 de junho de 1915 e que já morando em Maceió foi matriculado no Seminário Arquidiocesano Nossa Senhora da Assunção em 12 de março de 1931.

Não foi um dos melhores alunos daquela instituição. Tinha imensa dificuldade em Latim, mas compensava com ótimo desempenho em História do Brasil, sendo reconhecida também a sua capacidade de análise crítica dos fatos históricos.

Chegou a ser reprovado em Latim quando cursava a quinta série ginasial. O professor e Reitor Monsenhor Tobias pediu para ele, no exame oral, traduzir o verso “INFANDUM ME JUBES REGINA RENOVAREM DOLOREM“. Somente conseguiu a aprovação no dia 6 de junho de 1936, quando prestou novos exames.

No curso superior, conseguiu boas avaliações em Filosofia, Psicologia, Biologia e Ciências Naturais. Nas demais disciplinas era um “aluno esforçado”. Cursou ainda Teologia.

Seminário Arquidiocesano de Maceió em 1949

Ainda estudante, já expressava a sua sensibilidade com os problemas das pessoas mais carentes e desassistidos, aproveitando suas férias para realizar palestras de instrução religiosa para adultos deste segmento social.

Em 1941, ano em que foi ordenado padre (16 de novembro), conseguiu com o então prefeito de São Miguel dos Campos, Otácilio Marques de Sá, a instalação da Escola Duque de Caxias, voltada para a educação as crianças pobres da Fazenda Santa Maria.

No dia seguinte à sua ordenação, celebrou sua primeira missa solene na Igreja do Rosário dos Homens Pretos, na Rua do Sol.

Sua atuação pastoral se deu inicialmente na comunidade Nossa Senhora do Amparo. Foi ainda capelão da Escola Doméstica Maria Imaculada, do Colégio Guido de Fontgalland, do Colégio Marista de Maceió e Reitor da Igreja de Nossa Senhora do Livramento.

O jovem Padre Pinho

Antes de assumir a coordenação da Juventude Estudantil Católica, foi administrador do Seminário N. S. da Assunção em Maceió.

No início de julho de 1949, Padre Pinho era um dos componentes da delegação alagoana que esteve no Rio de Janeiro participando do Congresso Pan-americano de Serviço Social. Com ele viajaram também João Fireman, padre Hélio Souza, Deraldo Campos, Ramiro Martins, Vandeti Farias e o jornalista Edson Falcão.

Hospedado no Mosteiro de São Bento, padre Pinho visitou a Agência Meridional e informou aos jornalistas sobre o quadro social de Alagoas e que aproveitaria sua permanência no Rio para tratar de “assuntos referentes ao seu Estado, devendo avistar-se com o general Góis Monteiro, com os dirigentes do Serviço Social de Menores e outras entidades referentes ao problema”.

O programa “Honra ao Mérito” da Rádio Nacional era patrocinado pela Standard Oil Company of Brazil e ia ao ar todas as quartas-feiras, às 21h35. Na audição do dia 19 de setembro de 1951 homenageou o padre Pinho por sua obra em favor da infância e juventude de Alagoas conferindo-lhe a medalha de ouro e o diploma de “Honra ao Mérito”.

Em 6 de maio de 1965, a Câmara Eclesiástica do Arcebispado aprovou a provisão de cônego honorário em favor do padre João de Barros Pinho.

Nesse período já estava muito doente e permaneceu longo tempo internado na Santa Casa da Misericórdia. Estava internado no final de 1966, quando foi celebrada pelo arcebispo suas Bodas de Prata Sacerdotal, na Capela do Hospital São Vicente, quando foi convidado para integrar o Cabido Metropolitano.

O cônego João Pinho faleceu no dia 20 de julho de 1967, em plena Semana Mundial dos Pobres (19 a 25 de julho). Nos últimos anos de vida também promovia anualmente em Maceió o Natal dos Cegos.

Reconhecimento

O dr. José Medeiros, que ainda estudante o conheceu em 1950 após uma missa na Igreja do Livramento, lembrou dele em artigo publicado na Gazeta de Alagoas de 14 de março de 2012 como um “padre diferente, de batina desbotada, surrada, chinelos tipo sertão. Na face, um sorriso largo, voz persuasiva, boa conversa e um bom conselho. Sempre apressado”.

José Medeiros, que foi deputado e faleceu em 12 de abril de 2015, lembrou que foi apresentado a ele por um participante da Juventude Universitária Católica:

“Ele me perguntou onde morava: numa pensão da Rua do Sol, respondi. Ele riu e disse: ‘Tenho uma pensãozinha na Rua Cônego Machado; com o dinheiro arrecadado dos que ali moram sustento 20 meninos de rua’. Uma semana depois mudei-me para a pensão que os estudantes chamavam de ‘reduto de beneficência’”.

Demerval Brandão, em depoimento publicado no jornal A Cruz, órgão da Paróquia de S. João Baptista (Rio de Janeiro), em 27 de agosto de 1967, descreveu assim o Padre Pinho e seus ideais: “era batalhador pela implantação da Liturgia e da Opus Dei entre os simpatizantes e militantes que congregavam a Juventude Católica, porquanto, os primeiros ensaios do Ofício Divino — em português pelo laicato — eram recitados com seriedade pelos jovens estudantes liderados pelo entusiasmo do Padre Pinho”.

Recordou ainda que “todos aqueles que tiveram a ventura de compartilhar dos ensinamentos e dos trabalhos realizados na JEC de outrora tem vivo na memória as reuniões semanais dos círculos de estudo, os esportes praticados, os passeios recreativos e os retiros espirituais”.

Demerval concluiu identificando João de Barros Pinho como um verdadeiro seguidor de Cristo, que “soube penetrar nos problemas humanísticos através de esforços filantrópicos, dando testemunho de desprendimento, dedicação, trabalho e amor ao próximo”.

Secretariado de A. S. da Juventude Masculina Católica

Foi na casa do Padre Pinho e sede improvisada deste braço da Ação Católica, na Rua Barão de Atalaia, Centro de Maceió, que surgiu o embrião da futura Juvenópolis. Lá os desamparados, principalmente os jovens, podiam ser encaminhados para empregos já portando sua Carteira Profissional e Identidade. Aos poucos, alguns menores também passaram a se abrigar no local e o trabalho do Padre Pinho começou a ser reconhecido e elogiado.

A sua primeira diretoria foi assim composta: Newton Alcântara Oliveira, presidente; Dogival da Silva Brandão, secretário; Bráulio Leocádio, tesoureiro. O Padre Pinho era o diretor espiritual.

A partir do início da noite da segunda-feira, 16 de maio de 1949, em plena Semana Santa, fortes chuvas caíram ininterruptamente em Maceió por 70 horas, até que, na madrugada da quinta-feira, 19 de maio, desabaram barreiras e uma tromba d’água desceu o Riacho Salgadinho destruindo casas e pontes do Vale do Reginaldo, incluindo a Ponte da Av. da Paz.

A tragédia foi noticiada em todo o país e alguns repórteres se deslocaram até Maceió para acompanhar de perto os desdobramentos.

Ponte do Salgadinho destruída pela tromba d’água de 1949

O prefeito João Vasconcelos tentava atender as centenas de prejudicados e ao mesmo tempo denunciava a existência de falsos flagelados, pois sabia que aproximadamente mil propriedades tinham sidos danificadas ou destruídas e que já tinha recebido na prefeitura “nada menos de 10.000 pessoas”.

Em meio a confusões como esta, O Jornal do Rio de Janeiro destacou o trabalho da senhorita Rosita de Góis Monteiro, filha do governador Silvestre Péricles, e do padre Pinho, que coordenavam o setor de Roupas da Comissão de Emergência.

O impresso carioca informava que era este o único setor onde se notava a planificação do trabalho, “pois o padre Pinho dispõe de um perfeito cadastro de todo o pessoal vitimado pelas enchentes”.

Padre Pinho, com a ajuda do Secretariado de Assistência Social da Juventude Masculina Católica, organizou um birô de emprego para a obtenção de documentos e colocações para aqueles que os necessitassem, informava o jornal sem saber que este trabalho já vinha sendo realizado há algum tempo pela “Ação Católica”.

Coube ao próprio padre Pinho esclarecer ao repórter: “muito antes das enchentes, já vínhamos trabalhando para melhorar a situação do povo pobre de Alagoas. Somente no ano passado [1948] o nosso birô obteve a documentação indispensável a 300 desempregados, além de lhes arranjar empregos, prestar assistência médica, pagar as suas pequenas dívidas”.

Continuou: “Mantemos também um serviço de auxílio aos cegos, em número superior a 100. E tudo isso sem qualquer auxílio, quer por parte do governo estadual, quer por parte do governo federal. Entretanto, o nosso maior sonho é a fundação de uma cidade de meninos desamparados. Para isso, esperamos contar com o apoio de todas as autoridades brasileiras, pois o nosso trabalho é puramente social, sem qualquer outro caráter, que o de minorar os sofrimentos de centenas de alagoanos”.

Essa instituição, que funcionou na rua Barão de Atalaia atendendo a idosos, menores carentes, cegos, operários, pequenos jornaleiros, fazia o cadastramento de famílias e conseguia registros, de nascimento, de batizados, de casamentos. Seu segundo endereço foi na Rua Senador Mendonça.

A partir de 13 de maio de 1953, com a reforma dos estatutos, passou a ser o Secretariado de Assistência Social. Juvenópolis somente seria incorporado oficialmente à denominação em 1966.

Boys Town

Foi o padre católico romano Edward Joseph Flanagan o fundador do Boys Town em 12 de dezembro de 1917. Era um orfanato para meninos conhecido como “City of Little Men” em Omaha, Nebraska, nos EUA. Foi esta “Cidade dos Pequenos” a pioneira no desenvolvimento de métodos para o cuidado de jovens na América. Enfatizava a preparação social como um modelo de lares públicos para meninos em todo o mundo.

O primeiro estabelecimento do padre Flanagan

Por este trabalho, que ainda continua acontecendo em Omaha, em 2015 estava bem avançado o processo para a beatificação do irlandês monsenhor Edward Flanagan.

No Brasil, Flanagan ficou conhecido a partir do início de 1939, quando começou a ser exibido o filme Boys Town (aqui, Com os braços abertos), estrelado por Spencer Tracy em 1938.

Divulgava o trabalho e a vida do padre irlandês. A fita fez muito sucesso e Tracy ganhou o Oscar de Melhor Ator de 1938. Neste mesmo filme, Mickey Rooney estrelou no papel de um dos residentes do orfanato.

É provável que o então seminarista João de Barros Pinho tenha tomado conhecimento desta experiência ao assistir ao filme ou mesmo ao ler a crítica sobre ele, como a escrita no jornal Correio Paulistano de 13 de maio de 1939.

“A pequena comunidade é formada por uns duzentos meninos governados por eles mesmos. O prefeito e seus assistentes são também os meninos escolhidos pela maioria, que se encarregam da disciplina e vêm que os regulamentos estabelecidos sejam respeitados”, descrevia a sinopse.

Ainda em 1938, um curta-metragem promovendo Boys Town, The City of Little Men, teve a participação do próprio Flanagan, que aparece mostrando as instalações da instituição.

Em 1941 foi lançado outro filme como sequência do primeiro. Men of Boys Town também foi estrelado por Spencer Tracy.

Campanha por Juvenópolis

Aproveitando a boa repercussão que teve o seu trabalho assistencial durante as chuvas de maio de 1949 e contando com o apoio do governador Silvestre Péricles e de alguns deputados federais, padre Pinho passou a desenvolver ações para conseguir a ampliação das estruturas do seu empreendimento.

Foi a seu pedido que, em julho daquele mesmo ano, o deputado federal padre Medeiros Neto apresentou na Câmara dos Deputados o projeto de Lei nº 549, autorizando o Poder Executivo a “ceder imóvel ao Secretariado da Assistência Social da Juventude Masculina Católica de Maceió, para os fins que menciona”. Era o prédio do antigo quartel do 20º Batalhão de Caçadores na Praça Siqueira Campos, que posteriormente foi denominada como Praça Dr. Afrânio Jorge, mas ficou conhecida mesmo como Praça da Faculdade.

Quartel do 20º Batalhão de Caçadores em 1934

O prédio serviria para sediar “um serviço de assistência a menores desamparados e de alfabetização de adultos, nos termos da legislação do país”.

Na justificativa deste projeto, o padre Medeiros Neto explicou que a instituição beneficiada, após receber e dar assistência aos menores desamparados, iniciaria “um perfeito trabalho de recuperação moral, mesmo de adultos, através de cursos de alfabetização e de cultura social e humana”, utilizando os “princípios de reeducação adotados pelo ilustre sacerdote norte-americano [irlandês], Monsenhor Eduardo Flanagan”.

Outra conquista deste mesmo período foi o reconhecimento do Secretariado de Assistência Social da Juventude Masculina Católica da Arquidiocese de Maceió como Órgão de Utilidade Pública, formalizado pela Lei nº 915, de 13 de novembro de 1949, publicada no Diário Oficial da União em 18 de novembro de 1949 com a assinatura do então Presidente da República, Eurico Gaspar Dutra.

Para tristeza do padre Pinho, quando tudo já estava encaminhado para a sanção governamental da cessão do histórico prédio, foi preciso renunciar a ele para resolver exigências legais e viabilizar a Faculdade de Medicina de Alagoas, que seria oficialmente criada no dia 3 de maio de 1950, mas que somente começaria a funcionar no ano seguinte.

O reconhecimento da Faculdade junto ao Conselho Nacional de Educação e o Ministério de Educação passava pela arrecadação de um milhão de cruzeiros, em dinheiro ou em bens, e pelo desenvolvimento de algumas ações.

Ainda no final de 1949, o governador Silvestre Péricles de Góis Monteiro cedeu à Faculdade o Hospital Santa Leopoldina, que também ficava na Praça Siqueira Campos. Foi insuficiente e os olhos dos diretores da nova instituição se voltaram para o antigo Quartel.

Padre Pinho em 1951

Quem convenceu o padre Pinho a abrir mão do prédio foi o mesmo deputado federal padre Medeiros Neto, que apresentou, após o acordo, novo projeto de lei alterando o destinatário da cessão (nº 588, em 20 de julho de 1950).

Em compensação, Secretariado de Assistência Social recebeu, como doação da família Leão (Usina Utinga), o Sítio Petrópolis com 56 hectares de terra em Bebedouro. A concessão previa que cessada a existência do Secretariado, o sítio seria automaticamente transferido para a Arquidiocese.

A primeira diretoria do Secretariado de Assistência Social foi assim formada: presidente, Newton Alcântara Oliveira; secretário, Dogival da Silva Brandão; tesoureiro, Bráulio Leocádio e o diretor espiritual, padre João de Barros Pinho.

Juvenópolis

A Cidade dos Meninos sonhada pelo Padre Pinho começou a tomar forma no início de 1950, após receber a doação do Sítio Petrópolis e a promessa de uma ajuda substancial do Governo Federal, como noticiou o Diário de Pernambuco de 12 de maio daquele ano.

Segundo o jornal pernambucano, no dia anterior o ministro da Agricultura tinha enviado ofício à Câmara dos Deputados informando que além do crédito de Cr$ 15.000.000,00 (quinze milhões de cruzeiros) autorizado pela Lei nº 738, de 13 de junho de 1949, para socorrer as vítimas da inundação ocorrida em maio no estado de Alagoas, o Ministério havia autorizado a “abertura do crédito de Cr$ 400.000,00 (quatrocentos mil cruzeiros), atendendo ao pedido do governador Silvestre Péricles. para a construção de um abrigo para a juventude Católica sob direção do Padre João de Barros Pinho, com o fim de amparar menores abandonados cujo número foi aumentado com o flagelo que assolou aquele Estado”.

Em anexo ao ofício, foram enviadas “cópias do programa de obras elaborado pelo governador do Estado de Alagoas, para aplicação do referido crédito”. Estava também anexada a cópia da carta enviada pelo Padre Pinho, “em que expõe um projeto para a construção pretendida…”.

Não foi possível confirmar se estes recursos chegaram até à instituição.

Instalações de Juvenópolis

Em 1950, o Sítio Petrópolis já recebia as primeiras crianças, ocupando a única casa ali existente. No ano seguinte, as obras de Juvenópolis já tinham começado.

No Diário de Pernambuco de 25 de agosto de 1955, D. Jerônimo de Sá Cavalcanti O.S.B, de Garanhuns, dedicou um longo texto (Onde o Amor Domina) ao que viu em Juvenópolis.

Recomendando conhecer Juvenópolis, D. Jerônimo afirmou que ali “se ergue uma grande obra de assistência social e de verdadeira caridade cristã”.

Não se espere ver aí um majestoso edifício de três ou mais andares, vastos salões, dormitórios arejados, campo de esporte, jardins bem cuidados, enfim obra de suntuosidade. Não. Nada disto. O que se encontra nesta obra de suntuoso é apenas amor ao próximo na sua mais forte expressão”.

“Um padre formado no Seminário de Maceió, sem ter visitado os centros culturais da Europa ou percorrido as obras de assistência social da América, de compleição delicada, baixo e irrequieto resolveu amparar os meninos pobres de Alagoas. Onde o dinheiro? Onde o prédio? Os seus auxiliares? O Padre João Pinho, este o nome do fundador do Juvenópolis, não se preocupou com tais problemas O que lhe interessava era ter as crianças num lugar qualquer e de qualquer maneira. “A Providência, que não deixa cair de nossas cabeças um cabelo sem o seu consentimento também cuidará dos meus meninos” é o que sempre diz o Pe. Pinho. E a Providência tem realmente protegido a obra deste sacerdote piedoso, bom e extraordinário”.

Sobre a propriedade cedida pela família Leão, disse D. Jerônimo: “A velha casa da fazenda foi transformada em internato para crianças. A sala de visitas é a capela. Simples e original com um altar protegido de uma cortina azul, encimado de um Cristo Glorioso. Seus ornamentos são os prescritos pela Liturgia: quatro castiçais, dois jarros de flores, toalhas e a almofada do missal. Cobrindo o estrado diante do altar está um velho tapete. Não há bancos nem genuflexórios. Quando os meninos vão à missa, cada um leva a sua cadeira ou melhor, o seu banquinho do refeitório”.

“Por toda a casa — construção antiga de taipa e já muito estragada — foram colocadas camas para os meninos. Camas patentes que alguma alma generosa doou ao Padre. Onde comem aquelas crianças! Num vasto galpão de madeira, levantado em três dias pelo próprio Pe. Pinho e seus meninos maiores. Aí perto fica também a cozinha, o banheiro e a copa. Numa pequena sala estão três ou quatro máquinas de costura, onde alguns garotos aprendem a arte de alfaiate”.

Capela de Juvenópolis

Citou que ajudavam “cinco moços universitários que, de dia dão aulas, tomam conta da disciplina e à noite frequentam os seus cursos nas Faculdades”.

Continuou: “Entramos por curiosidade na rouparia. Um quarto muito pequeno, 2m por 4m mais ou menos. Em pequenos compartimentos ali está a roupa dos meninos. Cada um recebe o que é preciso. Calça, camisa, toalha, lençol e fronha. A maioria deles chega quase nu, sem coisa alguma. Em geral são órfãos. Meninos abandonados, jogados no meio da rua, expostos aos vícios e a toda sorte de miséria”.

Como educa o Pe. Pinho os seus meninos? Não como em orfanato nem internato. Não com uma disciplina de quartel ou mesmo de seminário. Sua educação se inspira na escola natural e humana — a família. Os meninos gozam de ampla liberdade e vivem como se todos fossem irmãos. Podem andar por toda a casa. Não há silêncio obrigatório. Até mesmo à noite, no dormitório podem conversar. Não há notas de comportamento ou castigos coletivos. Quando alguém erra é admoestado com ternura ou rigor”.

“A personalidade da criança é respeitada e se desenvolve orgânica e harmonicamente. Admirei como estes meninos se comportam no refeitório. Não gritam nem discutem. Conversam. Parecem meninos “de família” como se diria”.

E concluiu: “Ali está em Maceió uma grande obra onde reina em toda a plenitude o amor cristão. Se os poderes públicos soubessem olhar para aquele trabalho humilde e quase anônimo, bem que poderiam dar uma melhor e mais segura ajuda na educação dos nossos moços”.

Em 30 de setembro de 1956, o jornal O Lar Católico (MG) publicou uma nota elogiosa ao trabalho desenvolvido em Juvenópolis informando que naquela data mais de 80 crianças eram atendidas na instituição, “por especial favor da Providência Divina”, mesmo reconhecendo que havia várias contribuições do Governo.

“O que de curioso se acha nesta Juvenópolis é o método pedagógico empregado pelo diretor da Casa, que encarrega os próprios alunos de se recompensarem com a nota de comportamento em cada semana. Esse método de autodisciplina vem satisfazendo os requisitos de êxito educacional. O mesmo senso de responsabilidade é dado às crianças no que se refere à prática e estudo de religião”, destacou o jornal.

No Rio de Janeiro

Padre Pinho passou um período, não identificado por esta pesquisa, no Rio de Janeiro. Lá também foi o responsável por um abrigo dirigido pela JOC.

Padre Pinho

Essa informação foi fornecida pela professora Alba Correia, que foi militante da Juventude Universitária Católica, a JUC, e conheceu o Padre Pinho.

“Meu irmão Alberto, que nasceu em 1931, após o serviço militar foi tentar a vida no Rio de Janeiro. Em um dos contatos comigo ele falou que estava morando no abrigo da JOC, que tinha como diretor o Padre Pinho. Já nos anos 60, encontrei o Padre Pinho em Maceió e perguntei se meu irmão tinha dado muito trabalho a ele. Ele quis saber o nome dele e confirmou que era muito danado”, lembra Alba Correia, que foi uma das principais lideranças dos professores alagoanos.

O que levou o Padre Pinho a se afastar de Maceió também não foi possível identificar, mas pode ter alguma relação com a derrota do candidato de Silvestre Péricles e a ascensão de Arnon de Melo, ou ainda com o surgimento, em 24 de abril de 1956, da Cidade de Menores Humberto Mendes, inaugurada por Muniz Falcão no local onde funcionou, no Tabuleiro, o leprosário de Maceió, a Colônia Eduardo Rabelo.

Anos 60

No início da década de 1960, Juvenópolis já tinha ampliado seus espaços, passando a ser mais procurada e, consequentemente, aumentando os esforços do Padre Pinho para conseguir recursos e assim manter dignamente os meninos estudando e alimentados.

Recorria sempre aos governantes e completava a arrecadação com donativos do comércio e dos mercados. Em algumas campanhas contou com o apoio dos Lions.

No aprendizado, conseguiu celebrar convênios importantes com o Ministério da Educação e Cultura e Ministério da Justiça para a implantação de cursos profissionalizantes.

A partir de 31 de janeiro de 1961, quando Deraldo Campos assumiu a Secretaria de Educação e Cultura, Juvenópolis passou a receber maior apoio e realizou novas obras de ampliação. Deraldo Campos esteve à frente da Educação estadual até 11 de fevereiro de 1966, quando foi concluído o governo do Major Luiz Cavalcante.

Juvenópolis sem Padre Pinho

Com a morte do Padre Pinho, em 20 de julho de 1967, Samuel Delane Lima e o ex-aluno Manoel Marques assumiram provisoriamente a direção de Juvenópolis, que contava então com 126 alunos.

Ainda em julho de 1967, numa assembleia extraordinária, o arcebispo Dom Adelmo Cavalcante Machado propôs a reestruturação de Juvenópolis, mas mantendo os diretores.

A diretoria foi composta por: presidente, Samuel Delane Lima; 1º secretário, José Moreira da Silva; 2º secretário, Manoel Marques da Silva; 1º tesoureiro, Luiz Gonzaga Correia da Rocha; Conselho Fiscal — Amaury Prazeres Ramalho, Antônio Santos e Luís Ramalho.

Entre abril de 1969 e o final de 1971, Juvenópolis esteve sob a administração dos Irmãos Maristas da União Norte Brasileira de Educação e Cultura. Com o fim deste convênio, a instituição voltou para o controle do Secretariado de Assistência Social Juvenópolis e entregue ao professor Manoel Messias Vilela e esposa.

Até outubro de 1977, quando terminou a gestão do professor Manoel Messias, a instituição sobreviveu graças aos convênios com a Secretaria de Educação e Cultura, Legião Brasileira de Assistência e Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor. A renda era complementada com a venda dos produtos agrícolas cultivados e de animais dos criatórios de Juvenópolis. Contava ainda com donativos de algumas pessoas da sociedade.

Quem atendeu ao pedido de D. Miguel Fenelon Câmara para assumir a presidência do Secretariado de Assistência Social Juvenópolis foi o professor João Azevedo. Sua diretoria tinha a seguinte composição: 1º secretário, Antônio Santos; 2º secretário, José Damasceno Lima; 1º tesoureiro, Elias Passos Tenório; e 2º tesoureiro, Luís Gomes de Melo.

Essa gestão encontrou a estrutura física em situação precária e Juvenópolis em dificuldades financeiras e educativas. Atendia a 228 menores, sendo 87 internos, 24 semi-internos e 117 externos.

Refeitório de Juvenópolis

A equipe interprofissional era composta por uma orientadora pedagógica, duas orientadoras educacionais, duas orientadoras colaboradoras (UFAL), uma assistente social, 18 estagiárias de Serviço Social, uma médica, dez professores do 1º grau, um professor de Educação Física e um estagiário de Agronomia. Cuidavam da administração uma diretora assessora e três religiosas.

Os alunos externos eram mantidos pelos próprios pais ou responsáveis.

Todos cursavam do 1º grau até a 6ª série e recebiam ensinamentos teórico-práticos, além das técnicas de trabalho. O objetivo era a qualificação para a melhoria no desempenho profissional.

Estes menores prestavam serviços nas agências do Banco do Estado de Alagoas, na Caixa Econômica Federal de Alagoas, na Livraria Palmares e no Centro de Assistência Gerencial de Alagoas.

O Secretariado de Assistência Social Juvenópolis, uma associação privada, registrou seu CNPJ em 28 de setembro de 1972 (12.183.968/0001-80), com o nome fantasia de Juvenópolis.

A última reforma do seu estatuto aconteceu em 2008.

Juvenópolis em 2020

No final da segunda década do século XXI, Juvenópolis atendia a cerca de 300 crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade familiar e social. Abrigava 30 deles e recebia outros 260 para reforço escolar, além de apoiar 360 famílias.

No local também funciona a Casa do Servo Sofredor, acolhendo pessoas do sexo masculino dependentes de substâncias psicoativas para tratamento e recuperação, e a Casa Betania, recebendo com o mesmo objetivo pessoas do sexo feminino.

Não conseguimos informações mais detalhadas sobre todos os presidentes da instituição, mas o atual mandatário do Secretariado de Assistência Social Juvenópolis é o Cônego Walfran Fonseca.

2 Comments on Padre Pinho e Juvenópolis, a Cidade dos Meninos de Maceió

  1. Juvenopolis é uma atitude exemplar continua à cuidar de meninas e meninos em sua formação como também dos desiguais os invisíveis de nossa sociedade moradores em estado de rua como também portadores dependência química, o Amor ao próximo o Acolhimento faz com que Simos todos Irmãos , .
    Parabéns Dom Antônio Muniz ,Pe Walfran e as Irmãs Vera , Leucia e Glória pela continuidade e Amor à este Projeto.

  2. Josenópolis eu conheço desde 1978 minha mãe trabalhou aí eu tinha 8 anos de idade. Ela era na época cozinheira, quando era administrado pelas freiras na época.

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