Os primeiros movimentos grevistas em Alagoas

Publicado originalmente na Revista do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes da Universidade Federal de Alagoas nº 4, ano II, de junho de 1987

Seção de Tecelagem da Companhia de Fiação e Tecidos São Miguel

Moacir Medeiros de Santana

O desconhecimento de fatos históricos marcantes

Podemos afirmar que a História de Alagoas, da fase iniciada a 15 de novembro de 1889, com a Proclamação da República, praticamente ainda não foi escrita, tão escasso é o número de estudos existentes acerca de temas republicanos.

Segundo Congresso Operário em 1913 no Rio de Janeiro

Dessa forma, do período aludido, muitos acontecimentos históricos marcantes, ocorridos no território alagoano, permanecem desconhecidos. Para exemplificar, concernente aos relacionados com a nossa história social, nada se escreveu sobre a criação, a 21 de dezembro de 1890, do Partido Operário Alagoano, um dos mais antigos do Brasil, bem assim da atuação da Liga Operária Alagoana, de 29 de maio de 1892, a primeira associação artístico-operária alagoana, declaradamente socialista, fundida ao Partido Operário Socialista do Estado de Alagoas, em 20 de agosto de 1893, nessa data criado, e que a 22 de outubro seguinte lançava o número inicial de O Proletário, seu órgão social, que começou a estampar a “Constituição” que teria de reger o mencionado partido político, filiado ao Partido Operário Brasileiro.

Relativamente a fatos históricos mais recentes, naquela mesma circunstancia, citamos o 1º Congresso Operário de Alagoas, instalado em 22 de janeiro de 1933, e as atividade da Ação Integralista Brasileira, instalada a 20 de agosto de 1933, e que a 8 de dezembro do ano seguinte estava a promover o 1º Congresso Provincial Integralista de Alagoas, facção política aquela que três anos após, a 4 de dezembro de 1937, teve encerradas suas atividades, quando Decreto-lei do Estado Novo dissolveu todos os partidos políticos do país.

Também nenhum informe foi até hoje difundido a respeito da instituição de greve em Alagoas, — tema principal deste trabalho. onde surgiu há quase um século, precisamente há 96 anos, uma vez que a primeira ocorreu em 1891.

A greve em Constituições brasileiras e na legislação penal

Operários da União Mercantil em Fernão Velho no ano de 1922

Antes de discorrermos acerca da utilização, em nosso Estado, deste hoje tão empregado mecanismo de pressão, a greve, assunto até agora não contemplado nos estudos alagoanos de natureza histórico-social, lembramos que no Brasil, de 1937 a 1946, segundo dispositivo constitucional, esta era considerada recurso antissocial; era o que preceituava o art. 139, da Constituição de 10 de novembro daquele ano de 1937. Nove anos depois, é que o Decreto-lei nº 9.070, de 15 de março de 1946, passou a considerar lícita a greve, direito reconhecido pela Constituição de 18 de setembro seguinte, através de seu art. 158.

Anteriormente, omissa a nossa primeira Constituição republicana, quanto ao Direito de Greve, o Código Penal de 11 de outubro de 1890, em seus artigos 204 e 206, classificava a greve como crime, punível com prisão celular, qualquer que fosse o fato que a determinasse, doutrina praticamente esposada pelo Código Penal Brasileiro, de 7 de dezembro de 1940, em seus artigos 197 e 200.

E mal surgiram os movimentos grevistas, as autoridades cuidaram logo em jogar a comunidade contra os grevistas. Assim foi que, coincidindo com o apogeu do sindicalismo brasileiro, da fase 1917-1920, tratou-se de incutir na opinião pública, através da imprensa, dos discursos de líderes políticos e econômicos e de declarações policiais, “a ideia de que as greves e agitações do período (acima) eram produto da maquinação estrangeira, (…) e por volta de 1920, a campanha anticonspiração começara a surtir o efeito desejado”. (1).

Para dar um exemplo do tipo de noticiário alarmante e tendencioso dessa época, transcrevemos a manchete e parte do texto da matéria divulgada por periódico alagoano, de Maceió, o Correio da Tarde, no dia 14 de março de 1919:

A ANTROPOFAGIA DOMINANTE NA RÚSSIA

Na Rússia anarquizada pelo maximalismo, importam homens e mulheres para serem abatidos, como rezes, para alimentação do povo. (2)

Formação do operariado brasileiro como classe

As greves, como já registramos, apareceram em Alagoas — e intensificaram-se no resto do país — durante o regime republicano.

Nos primeiros anos do novo regime, o movimento operário era praticamente inspirado pelo Socialismo, — “o confuso e vago socialismo, (segundo Astrogildo Pereira) que se apresentava sempre sob as vestes do mais frouxo reformismo, que apenas de nome ouvira falar de Marx e de marxismo”. (3) a despeito de o Anarquismo, a partir do final do século XIX até o início do atual [XX], haver dominado a própria imprensa operária brasileira. A heterogeneidade dos grupos literários, sem a hegemonia de um deles que fosse, foi que possivelmente contribuiu para o retardamento do predomínio dos denominados anarcossindicalistas, somente verificada a partir da primeira década do século atual [XX], com a intensificação de atividades sindicais, inclusive através da criação de novas associações de classe.

Amaldo Spindel, apesar de afirmar que a movimento operário brasileiro, na fase que antecede a virada do século XX, “foi virtualmente dominado por um movimento socialista de caráter reformista“, (4) estranhamente chama atenção para o fato de que “os três primeiros partidos operários do Brasil”, surgidos em 1890, no Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e São Paulo, através de seus manifestos programas, mostram que se tratavam, na realidade, de partidos reformistas baseados em uma plataforma mais de classe média do que efetivamente do operariado“, acrescentando ainda que “suas propostas parecem ir mais no sentido da diminuição dos conflitos entre o capital e o trabalho e de melhoria das condições de vida das classes média e operária” (5) a ponto de um daqueles partidos operários, o do Rio de Janeiro – Partido Socialista Brasileiro consignar em seu programa, “que seus fins são mais sociais do que políticos, ao passo que o do partido paulista contém menção expressa contra greves“. (6)

Em maio de 1891, matéria procedida pelo título “Operários!“, divulgada pelo Diário das Alagoas, após referir-se “aos frêmitos da revolução que (agitavam) o mundo operário“, avançou o prognóstico de que a guerra social não devia tardar, atribuindo à Igreja Católica uma função conciliadora, ao assegurar que somente ela, “que se (dirigia) ao coração, à inteligência, à vontade dos homens”, poderia impedir a catástrofe, para a seguir informar que, no Brasil, “as primeiras paredes’ coincidiram com a impiedade oficial que do Estado separou a Igreja Católica”. (7)

Francisco Fost e Victor Leonardi, em sua História da Indústria e do Trabalho no Brasil, ao tratarem desse agitado período de nossa História social, ofereceram esclarecimentos a respeito do processo de formação do proletariado brasileiro, afirmando que os primeiros proletários modernos haviam aparecido no continente europeu, como em alguns países da América Latina, concomitantemente com os primeiros estabelecimentos fabris, mas o contrário ocorrera no Brasil, onde a existência de uma sociedade escravista, que levava o escravo a conviver com os trabalhadores livres, “dificultou e entravou, durante muitos anos, o processo de sua formação (do operário) como classe”, (8) o que só viria a acontecer na vigência do regime republicano, instituído pouco mais de um ano a Abolição da Escravatura.

Vale agora apontar outro fator que impediu, antes da República, a aglutinação de operários em organizações: a circunstância de que, somente com a promulgação da Constituição em 24 de fevereiro de 1891, ficou garantida a liberdade de associação. Diante, porém, de dúvidas suscitadas em decorrência de interpretação do referido dispositivo constitucional, só dois anos depois, através do decreto nº 173, de 10 de setembro de 1893, finalmente foi regulamentada a criação de associações políticas.

Situação do operariado nas indústrias

Engenho Conceição em São Miguel dos Campos em 1932

No alvorecer da República, proletários em potencial, os ex-escravos, que viriam a engrossar o extenso grupo dos sem-trabalho ou/e dos subempregados, justamente por haverem pertencido à classe dos escravizados, não estavam habituados a cobrar pelo seu trabalho, nem os empregadores a pagar seus serviços, o que gerou, em contrapartida, o pagamento de salários aviltantes e a substituição, marcadamente no sul do país, do trabalhador local pelo imigrante estrangeiro.

E quando aqueles egressos da escravidão, no caso específico do Nordeste, proletarizaram-se, utilizados como mão-de-obra aproveitável, o tratamento a eles dispensado de certo modo até piorou, porquanto não só os métodos extenuantes de trabalho empregados assemelhavam-se aos da época em que eram cativos, como o padrão salarial baixo a eles imposto, acrescido de custos de vida altos, os submetiam, na prática, a um regime de fome.

Oitenta anos após a Abolição da Escravatura, em 1968, o prof. Nelson Chaves, Diretor do Instituto de Nutrição, da Universidade Federal de Pernambuco, depois de realizar pesquisa com grupo de cem trabalhadores rurais do município de Ribeirão, na zona açucareira do vizinho Estado de Pernambuco, chegou à conclusão de que eles consumiam apenas uma média de 1.323 calorias, metade do mínimo indispensável a quem trabalha, razão pela qual viviam “num estado de fome crônica dos mais graves do mundo”. (9)

Daí versos de nossa poesia popular, da chamada literatura de cordel, a respeito do trabalhador da agroindústria açucareira, como os registrados por Clóvis Amorim (10) em trabalho apresentado ao 2º Congresso Afro-Brasileiro, realizado na Bahia, em janeiro de 1937:

Sai sumana, entra sumana,
nêgo não larga trabaio,
passa má, morre de fome…
E cadê treze de maio.

Cala a boca, nêgo besta,
É mió ficá calado.
Treze de maio pra nóis
é desejo de capado…

Nas demais indústrias, a situação não podia ser diferente. Em 30 de outubro de 1913, em artigo escrito a propósito da organização do operariado da fábrica de tecidos do município alagoano de São Miguel dos Campos, que iniciara suas atividades em 18 de julho daquele ano, mas certamente induzido por um dos motivos que levara à greve, dias antes, os operários têxteis de Cachoeira, a diminuição de jornada de trabalho, Joaquim Ignacio Loureiro lembrou a conveniência da adoção de 8 horas de trabalho diários, para aqueles homens, mulheres e crianças, esgotados pelo excesso de horas trabalhadas, e que estavam sujeitos a perder 1/4 de seus salários, caso não fossem encontrados nas fábricas, diante de seus postos, ao primeiro movimento das máquinas:

O operário para chegar à fábrica às 6 horas precisa levantar-se pelo menos 5; pelo que até meio-dia, 7 horas de trabalho, sempre de pé, porque nos 45 minutos para almoço muitos poucos poderão sentar-se alguns instantes. Prolongando-se os trabalhos até 9 horas, com a interrupção dos 45 minutos, teremos ao todo 15 horas de trabalho. (11).

Todavia, só vinte e um anos depois, em 1934, a Constituição da República Brasileira, de 15 de julho daquele ano, estipulou em 8 horas o dia de trabalho. (12)

As greves do período 1891 a 1914

Operários saindo da Fábrica Progresso Alagoano em Rio Largo

A primeira greve deflagrada em Alagoas teve início no dia 18 de abril do já citado ano de 1891, motivada por reivindicação salarial partida de trabalhadores da zona portuária de Jaraguá, estivadores e lancheiros, estes últimos, tripulantes das alvarengas, barcaças e outras embarcações. (13)

Relativos aos vinte e cinco primeiros anos da República, conseguimos localizar um total de vinte movimentos grevistas em nosso Estado, desencadeados por dez diferentes categorias: alfaiates, carroceiros, estivadores, ferroviários, lancheiros, sapateiros, tipógrafos, trapicheiros e operários das indústrias de cigarros e têxtil.

Onze deles tiveram, como motivo específico, reivindicação salarial; dois, solidariedade a greves de outras classes; dois outros, com motivação mista: aumento de salário, diminuição de jornada de trabalho e substituição de “fiscal”; um, devido a antipatia votada por operários a empregado de empresa; mais um, por desinteligência entre operários e gerente e, por fim, três, com causa não determinada.

Desses primeiros anos do novo regime, 1891 apresenta-se como recordista quanto ao número de greves, que foram cinco, a começar pela já mencionada “parede” dos estivadores e lancheiros, de 18 de abril, acrescida da dos carroceiros, logo a seguir deflagrada, em solidariedade àquelas duas categorias; (14) dos trapicheiros, em 20 do mesmo mês; lancheiros, a 27 de julho (15) e a de operários cigarreiros, das fábricas de Lopes Sá & Cia, e Moraes & Filho, em 21 de dezembro. (16)

No dia em que foi iniciada a greve de 27 de julho de 1891, alguns lancheiros que não haviam aderido ao movimento, foram impedidos, à mão armada, pelos grevistas, de embarcar mercadorias, em navio ancorado no fundeadouro de Jaraguá. (17)

Quanto à primeira repressão policial contra grevistas, ocorreu quando a polícia distribuiu forte pancadaria entre os carroceiros, que haviam oferecido, como já registramos, sua solidariedade aos estivadores e lancheiros. (18)

A 5 de fevereiro de 1892, os operários da estação da Estrada de Ferro Alagoas Railway, por não haverem, até então, recebido seus salários, entraram em greve. No dia seguinte, porém, os grevistas foram pagos, voltando ao trabalho. (19)

Em nova greve dos estivadores, deflagrada em abril de 1892, os grevistas impediram que colegas “furassem” o movimento, através de piquetes montados nos locais de trabalho. (20)

Os cigarreiros da fábrica de Leobino Silva, a 24 de janeiro de 1899 entraram em greve, em face de haverem diminuído seus salários. Só retornaram ao trabalho no dia 26, quando o proprietário da fábrica decidiu pagar-lhes os anteriores salários. (21)

A 10 de fevereiro de 1900, os estivadores fizeram mais uma greve, por não haverem sido atendidos na solicitação de aumento de suas diárias, feito às casas exportadoras locais, entre elas Williams, Goble & Co., representadas por Charles Goble e E. Keneth Mackray. “E como estes ingleses — informou o semanário O Povo — já pensam senhores do nosso Estado, querendo calcar os brasileiros com os pés enormes que possuem, por isso o sr. Mackray teve de ficar com a cabeça rachada sem saber qual a pessoa que lhe prestou esse grande serviço”. (22)

O ferimento em questão, superficial, aliás, ocorreu no terceiro dia da parede, quando grevistas, em número superior a 50, impediram que nova turma contratada efetuasse o embarque de mercadorias em vapor surto no porto, conseguindo finalmente que os exportadores passassem a pagar o preço exigido de 8$000 réis diários. (23)

O bel. Joaquim Paulo Vieira Malta, então Secretário do Interior de Alagoas, ao se referir a esse movimento paredista dos estivadores, asseverou que aqueles dois “estimados e respeitáveis súditos de S. M. Britânica”, no caso os representantes de Williams, Goble & Co. — e mais um brasileiro, haviam sido de surpresa agredidos pelos grevistas, acrescentando que “a repressão não se fez esperar, devido ao espírito de ordem e justiça que preside aos vossos (do governo) atos”. (24)

Em 6 de janeiro de 1906, os 89 operários cigarreiros da Fábrica Estrela do Nordeste, de Maceió, pertencente a Isaac Menezes & Cia., deflagraram um movimento grevista, por melhores salários.

Depois de várias negociações, foi concedido o aumento pedido. Mas apenas a 50 operários, porquanto foram demitidos 39, (25) número reduzido dias depois, com a readmissão de 5 deles. (26)

A 13 de janeiro de 1909 rebentou a mais importante das greves da região Nordeste, tendo como principal objetivo a consecução de aumento salarial para os ferroviários da Great Western Brazil Railway, companhia inglesa à qual haviam sido arrendadas, desde 6 de agosto de 1901, várias ferrovias do Nordeste.

Iniciada na sede da Superintendência da referida empresa, em Recife, no mesmo dia irradiou-se aos Estados de Alagoas, Paraíba e Rio Grande do Norte, paralisando totalmente o tráfego ferroviário na região.

Na noite de 14, a União Operária Alagoana reuniu-se para hipotecar solidariedade aos grevistas, quando distribuiu boletim concitando o povo a patrocinar a causa dos ferroviários (27)

Durante a tarde desse mesmo dia circulou novo boletim, convidando o povo e o comércio para um comício, realizado na praça Floriano Peixoto, às 17 horas, com grande comparecimento popular, tendo para isso concorrido a solicitação dos grevistas, ao comércio local, para o fechamento das portas de seus estabelecimentos, antes do horário normal, o que aconteceu em quase sua totalidade.

Ocuparam a tribuna o então acadêmico Rodriguez de Melo, Manoel de Loureiro, dr. Virgílio Antônio de Carvalho, jornalista Luiz Silveira, dr. Guedes Lins, entre outros.

Após o comício, a pedido da comissão de grevistas, o comandante do Batalhão Policial permitiu que a banda de música de sua corporação, que tocava em retreta naquele logradouro, encabeçasse passeata pelas ruas da cidade, quando foram visitadas as redações dos jornais locais, onde discursaram, por A Tribuna, Rodriguez de Melo; pelo Gutenberg, dr. Eusébio de Andrade; pelo Diário Popular, Virgínio de Campos; pelo Jornal de Alagoas, jornalista Luiz Silveira e pelo Correio da Tarde, o jornalista Costa Bivar.

Seção de Tinturaria e Engomação da Fábrica Progresso

Os acadêmicos alagoanos, de Direito e Medicina, em férias em Maceió, a 16 realizaram reunião de solidariedade aos grevistas da Great Western, quando foram designados os acadêmicos Gastão Silveira, Pontes de Miranda, Teodoro Palmeira e João Agnelo Barbosa, para redigirem um protesto, e na mesma oportunidade escolhido o dr. Orlando Araújo para orador da manifestação popular que, de fato, realizou-se na Praça D. Pedro II, ao cair da tarde do referido dia.

Na mesma manifestação discursaram Carlos Alencar e Antônio Peixoto, este membro da comissão de greve, e em seguida a massa popular saiu em passeata, falando diante do Jornal de Alagoas, o seu diretor, jornalista Luiz Silveira, Baltazar Mendonça e Candeira Neto, e, diante da sede do Bloco Alagoano, aquele último e Júlio Martins, membros da referida associação, tendo a aludida passeata regressado à mesma praça D. Pedro II, onde após discurso do dr. Orlando Araújo, dispersou-se. (28)

As localidades servidas pelos trens da Great Western ficaram logo privadas do serviço postal, bem como do transporte de mercadorias, cujos preços, diante da diminuição dos estoques, começaram a subir em alguns pontos dos Estados afetados pela paralisação dos trens.

No quarto dia de greve, periódico alagoano noticiava que ” (continuava) a descer do interior, à cavalo, considerável número de pessoas, que têm negócios urgentes na capital”. (29)

No dia 20, precedido da banda de música do Batalhão Policial, para tal fim contratada, saiu pelas ruas da capital um bando precatório pedindo auxílio para os paredistas.

Depois de doze dias de greve, a Great Western cedeu, por fim, a pressão dos grevistas, segundo despacho telegráfico recebido pela comissão de greve, em Maceió, na noite de 24. (31)

As 9.30 horas do dia seguinte, precedida da banda de música do 33º Batalhão de Caçadores, realizou-se uma passeata, saída da Estação Central da Great Western, de Maceió, “o povo (delirando) de instante a instante, vitoriando o triunfo dos paredistas“, soltando foguetes e “à luz de fogos de bengala”. (32)

Durante o desfile falaram vários oradores, dissolvendo-se o mesmo diante da sede da União Operária Alagoana, onde se fizeram ouvir Pedro Nolasco Maciel e Virgínio de Campos, (33) ambos combativos socialistas conterrâneos, hoje completamente desconhecidos das gerações atuais.

Em Viçosa, quando da chegada do primeiro trem após aquele movimento grevista, foi realizada uma grande manifestação popular. “Grupo de senhoritas, senhoras e crianças da elite viçosense, precedida da banda marcial da ‘Euterpe‘, ligando fitas à locomotiva, conduziu indescritível cortejo até a gare da estação, orando o cel. Luiz Sá em nome das classes. O povo entusiasmado percorreu as ruas da cidade em verdadeiro deslumbramento”. (34)

A 15 de abril de 1912, os operários das oficinas tipográficas do Jornal de Alagoas — que só voltaria a circular seis dias depois, a 20 — entraram em greve e somente voltaram ao trabalho depois da celebração de acordo com os membros do Sindicato Gráfico Alagoano, através de mediação de Protásio Trigueiros, proprietário de estabelecimento gráfico maceioense, a Litografia Trigueiros. (35)

O ano de 1913 ultrapassou ao de 1891, em número de greves. Atingiu a sete, a primeira delas deflagrada no dia 20 de outubro, pelos operários têxteis da fábrica de Cachoeira, devido a desinteligência entre um operário e o gerente da fábrica, sanado na noite de 22, após entendimento mantido entre os grevistas e os diretores da Companhia Alagoana de Fiação e Tecidos, proprietária do referido estabelecimento fabril.

O governo estadual, logo que tomou conhecimento da deflagração desse movimento grevista, chegou a deslocar uma força policial, para aquela localidade, “a fim de garantir os edifícios da fábrica e os operários que quisessem trabalhar”. (36)

No dia 23, reivindicando aumento salarial e diminuição de jornada de trabalho, os aludidos operários têxteis da fábrica de Cachoeira e os de Rio Largo, da fábrica da Companhia Progresso Alagoano, entraram em greve. O aumento salarial pretendido era de 30% sobre seus salários, enquanto a diminuição de jornada de trabalho era de 14 e 15 para 12 horas diárias, uma vez que os operários costumavam trabalhar das 6 horas da manhã às 8 e 9 horas da noite. (37)

Os diretores das duas fábricas, alegando não poderem resolver pessoalmente as reivindicações dos operários, convocaram uma assembleia geral extraordinária para o próximo dia 16 de novembro, a fim de apresentarem aos acionistas a representação dos grevistas. (38)

Em sessão de 28 do citado mês de outubro, a Federação Operária Alagoana deliberou a saída de um bando precatório, com a finalidade de angariar donativos para as famílias dos operários em greve, (39) o que aconteceu na manhã do dia 30.

A 3 de novembro, comissão da Federação Operária esteve com o Secretário do Interior, ficando acordada a volta dos grevistas ao trabalho, até a decisão da assembleia dos acionistas convocada para o dia 16, no que se referia ao aumento salarial, porquanto as demais propostas haviam sido aceitas pelos diretores das empresas têxteis. (40)

Realizada em 17 de novembro, a assembleia dos acionistas, convocada para o dia anterior, decidiu rever as tabelas dos salários e conceder aumento “em todas as sessões de 5 a 10%, conforme a classe de serviço”; tornar facultativo o serviço das 6 às 8 horas da noite, pagando extraordinário a quem executar tal trabalho; despedir os operários que não comparecessem ao serviço até o dia 20, devendo os mesmos devolver a chave da casa em que residiam, dentro de 8 dias; fechar as fábricas por tempo indeterminado, o suficiente para conseguir novos operários, que aceitassem as condições estabelecidas; solicitar do governo do Estado, garantia permanente contra as agressões ao estabelecimento da fábrica e ao pessoal que aceitasse o trabalho. (41)

Os operários, porém, não concordaram com as propostas dos patrões, pelo que se declararam novamente em greve. (42) Resolvera, então, dirigirem-se, em comissão, ao Governador Clodoaldo da Fonseca, quando pediram sua intervenção junto aos diretores dos referidos estabelecimentos fabris, tendo aquele governante incumbido os desembargadores Esperidião Tenório de Albuquerque e Dario Cavalcante de Araújo Rêgo de conseguirem um acordo definitivo entre as partes litigantes.

A 28 do aludido mês de novembro, o Jornal de Alagoas noticiou “(achar-se) felizmente terminada — devido à mediação governamental — a greve dos operários das fábricas de tecidos de Cachoeira e Rio Largo”. (43)

No mesmo dia em que os sócios daqueles dois estabelecimentos têxteis realizavam assembleia geral, para decidirem sobre as propostas dos operários de suas fábricas, os sapateiros de Maceió entraram também em greve, encerrando com a vitória dos paredistas, no dia 20. (44)

Outra greve realizada neste mês de greves, o de novembro, foi a dos alfaiates, registrada pelo periódico O Comentário, de 23 daquele mês, que esclareceu ter ela, como motivo, reivindicação salarial. (45)

Seção de teares da Industrial Penedense em 1922

Ainda em novembro, os operários têxteis da fábrica de Fernão Velho, pertencente à Companhia União Mercantil, igualmente se declararam em greve, só voltando ao trabalho, depois de haver sido dispensado do serviço um empregado daquela fábrica, ao qual os operários votavam antipatia“. (46)

A propósito das constantes deflagrações de greve, naquele mês de novembro, é o comentário feito por periódico maceioense, em 30 do aludido mês de novembro:

Terra das manias, a mania que a domina agora é a das greves. De fato, há alguns dias ninguém ouve outra coisa em Maceió, que não seja a palavra — greve. (47)

A 1º de dezembro, apresentando como uma das reivindicações, aumento salarial, os trapicheiros, em número superior a 600, declararam-se também em greve.

Nesse movimento grevista, uma outra exigência de seus participantes era a substituição dos denominados “capitães“, pagos pelas diversas casas exportadoras para contarem os volumes conduzidos pelos trapicheiros, contagem que resultava sempre inferior ao número de volumes por eles transportados.

No dia 3 seguinte, os carroceiros e estivadores deflagraram greve de solidariedade aos trapicheiros.

A última notícia que conseguimos obter, relacionada com essa greve, foi um comunicado dirigido ao Comércio e à Agricultura, assinado pelos proprietários e arrendatários de trapiches e armazéns de açúcar, estampado em órgão da imprensa alagoana onde os mesmos informaram haver sido decidido, em reunião realizada a 11 do referido mês de dezembro, “não alterar os preços de serviço de volumes”. (48)

O derradeiro movimento grevista dos cinco primeiros lustros da República, em nosso Estado, foi deflagrado às 8,30 horas do dia 2 de março de 1914, pelos operários têxteis da fábrica de Cachoeira, segundo comunicação feita ao Jornal de Alagoas por uma comissão da Federação Operária Alagoana. (49) Todavia, os motivos, duração e outros informes a seu respeito, não conseguimos obter.

Ao término desta reconstituição de parte do passado de lutas dos operários brasileiros, não podemos deixar de concordar com a afirmativa de Vamireh Chacon, em sua História das ideias socialistas no Brasil, de que “as concessões jurídicas ao trabalho não foram (…) dádivas, e sim árduas conquistas“. (50)

NOTAS DE PÉ-DE-PÁGINA

1 – MARAM, Shaldon Leslie. Anarquistas, imigrantes e o movimento operário brasileiro, 1890-1920. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1979, p. 162.

2 – Apud BRANDÃO, Octavio. O caminho. Rio de Janeiro s. ed. 1950, p. 384.

3. PEREIRA, Astrogildo. A formação do PCB – 1922-1928 Rio Janeiro Vitória 1952 p. 15. Como se vê, o fato de o Socialismo naquele período inicial da República, apresentar-se indefinido, deu ensejo a que A. Pereira fizesse tal comparação entre aquele movimento e o Marxismo, a ponto de considerá-lo como “frouxo reformismo”.

4 – SPINEL, Arnaldo. O que é Socialismo? S. Paulo, Brasiliense; Abril Cultural, 1985, p. 68.

5 – IDEM, p. 70.

6 – IDEM, p. 70-71.

7 – DIÁRIO DAS ALAGOAS, Maceió, 14 maio 1891, p. 1, Operários!

8 – FOST, Francisco & LEONARDI, Victor. História da Indústria e do Trabalho no Brasil. S. Paulo, Global, 1982, p. 109.

9- CHAVES, Nelson, apud SANT’ANA, Moacir Medeiros de. Contribuição à história do açúcar em Alagoas. Recife, Museu do Açúcar – IAA, 1970, p. 197-98.

10 – AMORIM, Clóvis. O moleque do canavial. In O negro no Brasil. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1940, p. 71.

11 – LOUREIRO, Joaquim Ignacio. Fabrica S. Miguel. Organização de seu operariado. Jornal de Alagoas, Mació, 30 out. 1913, p. 1.

12 – Cf. Art. 121, § 1°, letra “c”.

13 – GUTENBERG, Maceió, 19 abr. 1891, p. 2. Aos domingos

14 – IDEM, 26 abr. 1891, p. 2.

15 – IDEM, 29 jul. 1891, p. 2.

16 – IDEM, 22 dez. 1891, p. 1.

17 – IDEM, 29 jul. 1891, p. 2, A greve dos Lancheiros.

18 – BOHEMIO. Aos domingos. Gutenberg, Maceió, 26 abr. 1891, p. 2.

19 – CRUZEIRO DO NORTE, Maceió, 17 fev. 1892, p. 2.

20 – GUTENBERG, Maceió, 3, 5, 6 e 7 abr. 1892, p. 2.

21 – A TRIBUNA, Maceió, 27 jan. 1899, p. 2, Notas.

22 – O POVO, Maceió, 19 fev. 1900, p. 1.

23 – A TRIBUNA, Maceió, 13 fev. 1900, p. 1.

24 – MALTA, Joaquim Paulo Vieira. Relatório que ao sr. vice-governador do Est. Alagoas, cel. Francisco Manoel dos Santos Pacheco apresentou o Secr. Interior, bel. (…) em 31 mar. 1900. Maceió, Empr. d’A Tribuna, 1901, p. 3.

25 – GUTENBERG, Maceió, 13 jan. 1906, p. 2.

26 – IDEM, 14 jan. 1906, p. 2.

27 – A TRIBUNA, Maceió, 15 jan. 1909, p. 2.

28 – GUTENBERG, Maceió, 19 jan. 1909, p. 1, A Greve da Great Western.

29 – IDEM, 17 jan. 1909, p. 1, A Greve da Great Western.

30 – A TRIBUNA, Maceió, 21 jan. 1909, p. 1.

31 – IDEM, 26 jan. 1909, p. 1.

32 – GUTENBERG, Maceió, 26 jan. 1909, p. 1, A Greve da Great Western.

33 – A TRIBUNA, Maceió, 26 jan. 1909, p. 1.

34 – IDEM, 27 jan. 1909, p. 1.

35 – JORNAL DE ALAGOAS, Maceió, 20 abr. 1912, p. 2, Ineditoriais.

36 – IDEM, 21 out. 1912, p. 1, Greve na Cachoeira.

37 – O COMENTÁRIO, Maceió, 28 out. 1913, p. 3.

39 – IDEM, 29 out. 1913, p. 1.

40 – DEM, 04 nov. 1913, p. 2.

41 – DEM, 23 nov. 1913, p. 2.

42 – IDEM, 19 nov. 1913, p. 2.

43 – IDEM, 28 nov. 1913, p. 1.

44 – IDEM, 19 e 22 nov. 1913, p. 2.

45 – 0 COMENTÁRIO, Maceió, 23 nov. 1913, p. 3.

46 – IDEM, 02 nov. 1913, p. 3.

47 – JORNAL cit. ref. 46, p. 1.

48 – JORNAL DE ALAGOAS, Maceió, 13 dez. 1913, p. 1.

49 – IDEM, 03 de mar. 1914, p. 1.

50 – CHACON, Vamireh. História das ideias socialistas no Brasil. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira 1955 p. 312.

1 Comentário on Os primeiros movimentos grevistas em Alagoas

  1. Renato Ferreira // 10 de dezembro de 2019 em 07:32 //

    Eu trabalhei na Frabrica Alagoano de fiação e tecidos de Rio Largo, na década de 70, muitas saudades

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