Avenida da Paz, o aterro de Jaraguá

Praia da Avenida em 1932

O povoamento da futura capital de Alagoas teve como núcleo inicial as moradias no entorno do engenho que se localizava na atual Praça D. Pedro II e as palhoças de pescadores que se distribuíam pela Praia da Pajuçara.

Também pode-se afirmar que foi o ancoradouro de Jaraguá que possibilitou que aquela enseada da comarca de Alagoas se transformasse no destino de várias embarcações em busca de abastecimento e, muitas delas, à procura de madeira e de outros produtos comercializáveis na Europa.

Av. da Paz ainda com as gameleiras derrubadas em 1911

Foi para se chegar a este porto natural que surgiram os primeiros caminhos em direção a Maceió. O mais antigo deles permitia o transporte de mercadorias do vale do Mundaú até Jaraguá. Seu trecho na futura capital originou a Estrada de Bebedouro, Rua do Comércio, Avenida da Paz e Rua Sá e Albuquerque.

Um destes segmentos, a Avenida da Paz, foi por muito tempo um enorme areal que se atingia após atravessar o hoje Riacho Salgadinho logo após a Boca de Maceió (Praça dos Palmares e imediações).

Em 1840, segundo Craveiro Costa em seu livro Maceió, “quem vinha de Jaraguá ou para Jaraguá se dirigia, atravessava o riacho em uma jangada mediante o pagamento de 40 réis. A jangada foi substituída por uma pinguela e esta por uma ponte de madeira, ao lado da atual Enfermaria Militar [hoje Circunscrição do Serviço Militar, CSM], mais ou menos onde Melo e Póvoas levantou o forte de São João, em 1820”.

Quando desembarcou no porto de Jaraguá, em 27 de dezembro de 1818, o primeiro governador da nova capitania, Melo e Póvoas, não encontrou um bairro. Havia um “areal escaldante e alvo do litoral”, descreveu Craveiro Costa, detalhando ainda que “do atual ponto de desembarque à vila [Maceió], palmilhando a areia batida de rijo canícula causticante, era uma caminhada de estafar”.

Av. da Paz antes de 1911

Foi este caminho de areia entre os povoamentos de Jaraguá e Maceió que veio a se transformar numa das avenidas mais importantes da cidade.

O primeiro equipamento urbano ali implantado foi o Cemitério dos Ingleses, que pode ser localizado na Planta traçada em 1820 por José da Silva Pinto a pedido de Melo e Póvoas e utilizada por Carlos Mornay em 1841.

Esse cemitério, em 1875, foi assunto do jornal da maçonaria Labarum de 29 de outubro, num artigo intitulado O cemitério dos protestantes nesta cidade: “Vimos, há poucos dias, passando pelo recinto murado que demora à rua do Saraiva desta cidade, antigo Aterro, em Jaraguá, e onde se sepultam as pessoas acatólicas, que a abertura para a estrada, praticada num dos muros laterais fronteiro a rua, era obstada por uns paus atravessados em forma de curral de bois para guardarem duas ou três vacas que ali pastavam por cima das sepulturas ao nível do chão, que se achava entulhado de quantas imundícies e arbustos parasitas podem crescer em terreno que, nos disseram, está de há muito tempo, servindo de verdadeiro esterquilínio!!!”.

O articulista cobrava que se colocasse um portão “naquele jazido de mortos” e os identificava como sendo estrangeiros, na maioria ingleses e norte-americanos. Criticou duramente o sr. G. W. Wucherer por não ter tomado nenhuma providência. “Ninguém se moveu até hoje, o indiferentismo continua como que para exacerbar os ânimos e a responsabilidade cairá principalmente sobre a cabeça do aristocrata o sr. Wucherer que pode gozar de todos os cômodos da vida, como representante de uma potência estrangeira, enquanto que os restos mortais dos súditos cujos interesses ele deve advogar, se acham contundidos pelas patas dos animais e cobertos de imundície de toda a espécie!”.

O local do antigo Cemitério dos Ingleses sofreu interdito do intendente Antônio Guedes Nogueira pela Lei n° 119, de 21 de setembro de 1908.

O governante que primeiro pensou em beneficiar a Estrada de Jaraguá foi José Bento da Cunha Figueiredo. Em relatório de 5 de junho de 1850 solicitava recursos para que a Câmara Municipal aterrasse “uma rua que vá da ladeira do Algarve [ladeira ao lado da atual Praça dos Palmares] até Jaraguá. Estou convencidíssimo, que em breve será ela povoada, não só por ser a rua que tem de prender duas povoações mui dependentes uma da outra, como porque naturalmente será escolhida como mais cômoda habitação para aqueles que ali tiverem empregos e negócios diários. Acresce ainda a vantagem de se facilitar o trânsito, e consequentemente de auxiliar nesta parte o comércio, diminuindo muito as despesas de condução”.

Avenida da Paz no início do século 20

Por um anúncio publicado no Correio Maceioense de 20 de outubro de 1850 sabe-se que aquele trecho litorâneo ainda não tinha denominação: “Roga-se a qualquer pessoa que tenha achado no caminho de Jaraguá da parte de dentro, junto aos coqueiros, um relógio embrulhado num papel lacrado, com subscrito ao sr. Paulo Joaquim Telles Júnior, o queira entregar em Jaraguá e casa do sr. Francisco Ferreira de Andrade, ou em Maceió, rua do Comércio, loja de Manuel Antônio Supardo, que será generosamente gratificado”.

Em fevereiro de 1854, o presidente da Província, José Antônio Saraiva, divulgou em seu relatório que “a estrada que liga esta Cidade à Povoação de Jaraguá, sobremaneira frequentada, devia ser melhorada convenientemente, e por tal forma, que se tornasse cômodo e fácil o trânsito. Encarregada ao Presidente do Conselho de Obras Públicas, acha-se ela quase concluída, faltando apenas plantar o arvoredo, calçar as testadas da ponte de Maceió, e acabar a parte que fica acima do pontilhão, que mandei fazer no lugar denominado Água Negra” [um alagadiço próxima a hoje Estação Ferroviária de Maceió].

A área recebeu os primeiros aterros em 1870. Segundo José Fernandes Maya Pedrosa, em seu livro Histórias do Velho Jaraguá, isso ocorreu “por razões sanitárias e para promover acesso do porto até a cidade, facilitando a passagem das carroças e suas mercadorias”. Maya Pedrosa explica ainda que a obra “abrangeu a área pantanosa por trás das casas da Avenida até a margem do Salgadinho”.

A partir desta melhoria, a faixa de terra e areia onde se situava a Estrada de Jaraguá passou a ser conhecida como Aterro de Jaraguá e pouco tempo depois já era a Estrada do Saraiva, em homenagem ao seu benfeitor. A sua continuação em Jaraguá era a Rua da Alfandega, antiga Rua da Praia e Rua da Frente e depois renominada para Rua Sá e Albuquerque.

Conselheiro Antonio Saraiva foi quem primeiro urbanizou o Aterro de Jaraguá

José Antônio Saraiva, ou Conselheiro Saraiva, foi nomeado presidente da Província de Alagoas por quatro períodos: de 19 de agosto de 1853 (assumiu somente em 19 de outubro) a 26 de abril de 1854, de 23 de outubro de 1854 a 4 de maio de 1855, de 5 março de 1856 a 20 de maio de 1856, e de 16 de julho de 1856 a 19 de fevereiro de 1857.

Assim surgiu a Rua do Saraiva ou Rua do Conselheiro Saraiva, que permaneceu como tal até 1919, quando foi rebatizada como Avenida da Paz em ato comemorativo ao fim da Primeira Guerra Mundial.

Não há documento oficial definindo a extensão desta rua no final do século XIX, mas o Orçamento de Maceió para 1895, estabelecido na Lei nº 28, de 25 de fevereiro daquele ano, ao ser publicado no Gutenberg de 7 de março tornou público no seu Art. 20 que o Intendente estava autorizado a “fazer o calçamento da rua do Saraiva, desde o trapiche Jaraguá até a Ponte dos Fonsecas…”.

Em janeiro de 1896, o mesmo jornal cobrava das “companhias de carris urbanos” que completassem o calçamento das ruas onde circulavam os seus bondes, revelando que a parte da via onde estavam instalados os trilhos, não haviam recebido estes investimentos. Reivindicava ainda a “conveniência de serem arborizados os trechos da mesma rua onde há falhas dos frondosos gameleiros que bordam do lado do mar a mesma avenida”.

A preocupação com melhorias para esta avenida ressurge no Gutenberg de 22 de fevereiro de 1899, que contestava o “jornal oficial” por publicar que o intendente passaria a obrigar “os proprietários da Rua do Saraiva (aterro de Jaraguá) a edificarem os respectivos terrenos baldios, visto o desagradável aspecto que apresenta dita rua”.

A contestação ao órgão oficial existiu por ter este defendido, dois meses antes quando o intendente era outro, a construção de um “cercado de maria preta” naquela mesma via. “Ontem não afeiava, nem era uma indecência a construção de um curral na rua mais pública da cidade, hoje é uma indecência, um horror inconcebível a falta de edificação de alvenaria na mesma rua!”.

Em setembro de 1899 sabe-se pelos jornais que a Sociedade Familiar Hebe Jaraguaense estava inaugurando sua sede social na rua do Saraiva, no dia 7 daquele mês, uma quinta-feira, realizando um sarau dançante.

No início do século XX, em 19 de janeiro de 1905, o intendente dr. Manoel Sampaio Marques alertava para a “urgente necessidade de há de mandar-se aterrar uma grande depressão que existe na rua Saraiva, em frente aos alicerces da obra do Comendador Manoel Vasconcellos a qual é uma contínua ameaça à vida de transeunte incauto que por aí passar”.

Tropas desfilando na Av . da Paz para o embarque em 1932

No ano seguinte, em fevereiro, pode ter acontecido o primeiro evento carnavalesco na então Rua do Saraiva. Uma notinha publicada na coluna Carnaval do Gutenberg, edição de 8 de fevereiro de 1906, divulgou que “diversos moços residentes à rua Saraiva, no bairro de Jaraguá, tomaram a deliberação de enfeitar o trecho que fica compreendido entre a ponte do riacho Maceió, e o Bazar dos srs. Coura & Cavalcante para os festejos carnavalescos”.

Em setembro de 1907, com o calçamento de parte da rua do Saraiva em andamento — foi pavimentada da Fundição até a Ponte dos Fonsecas —, o intendente Antônio Guedes Nogueira resolveu também pavimentar “grande parte do beco da fundição”, atualmente a Rua Desembargador Paulo da Rocha Mendes, antiga Rua Mato Grosso, entre a Avenida da Paz e a Praça Rayol. Nesse mesmo período ressurgiu a cobrança à Companhia de Trilhos Urbanos para calçar o leito das suas linhas, conforme estabelecido em contrato.

Segundo Félix Lima Júnior no seu livro Maceió de Outrora, em 1911, quando o intendente era Luiz Mascarenhas, resolveu-se pavimentar o Aterro e a Rua da Alfandega (Sá e Albuquerque) com paralelepípedos e aproveitou-se a reforma para cortar as 27 gameleiras. Eram então “enormes, copadas, frondosas, já muito velhas, maiores de oitenta anos, algumas talvez centenárias”.

O intendente tinha recebido reclamações dos proprietários dos prédios daquela orla marítima. Alegavam que “os morcegos, depois de comerem os frutos, satisfaziam suas necessidades fisiológicas nas frentes das casas daquela artéria”. Além disso, “as raízes se estendiam demasiadamente, prejudicando o calçamento da rua e os alicerces dos prédios”.

Novas gameleiras foram plantadas somente em 1933, na gestão do prefeito Orlando Araújo.

Armando Wucherer, em artigo publicado na Gazeta de Alagoas de 10 de março de 1954, recordou “as frondosas gameleiras, a cuja sombra as antigas baianas vendiam caruru e vatapá, nos bons tempos da barateza”.

Avenida da Paz

Intendente Leonino Corrêa, que transformou a Rua do Saraiva em Avenida da Paz

O primeiro grande conflito armado da terra foi suspenso em novembro de 1918, com a celebração do armistício de Copenhagen, mas foi somente com a assinatura do Tratado de Paz de Versalhes, em 28 de junho de 1919, que as potências europeias declararam oficialmente o fim da Primeira Guerra Mundial.

No Brasil, que não participou desta guerra, ocorreram muitos atos festejando o fim do morticínio.

Em Maceió, as comemorações pela paz foram programadas para acontecer a partir do dia 12 de julho de 1919, como publicou o Jornal de Recife daquela data, um sábado. “A abertura das festas terá lugar às 13 horas, no Aterro de Jaraguá, que se achará rica e artisticamente decorado, no pavilhão brasileiro, sendo nessa ocasião, com a presença das principais autoridades civis e militares, assinada uma ata e hasteadas todas as bandeiras aliadas”.

Na sequência estavam programados os seguintes eventos: às 15 horas, esportes marítimos na praia do Aterro de Jaraguá; às 16 horas, formatura dos diversos colégios da capital; e à noite, além do baile no Teatro Deodoro, haveria “divertimentos populares” e a apresentação de várias bandas de músicas no Aterro, que estaria “feericamente iluminado”.

Na manhã seguinte, às 6 horas, missa campal no Aterro de Jaraguá. Às 13 horas, matinê no Teatro Deodoro e ainda pela tarde, no Aterro, haveria corso, batalha de flores, confete e serpentinas. Durante a noite, com o Aterro iluminado, mais retretas e outras diversões.

Na segunda-feira, às 8 horas, parada militar no Aterro, “com a incorporação das bandeiras das nações aliadas, conduzidas por senhoritas da nossa sociedade”.

“Às 14 horas, grande préstito cívico que se organizará na praça Floriano Peixoto [Praça dos Martírios], composto de ricos carros e significativas alegorias patrióticas, evocações da guerra e apoteoses à paz e em que tomarão parte todas as corporações, colégios, sociedades, as exmas. famílias e o povo em geral”.

No Aterro de Jaraguá, a partir das 19 horas, haveria uma “festa veneziana” com “um programa deslumbrante”.

A comissão central que cuidou destes eventos foi composta por: capitão de corveta Vieira Lima, presidente; Arthur Accioly, secretário; N. K. Macray, tesoureiro; e R. W. Browning Paterson e Álvaro Torres.

Foi nesse ambiente comemorativo que se aprovou a Lei Municipal nº 9, de 8 de outubro de 1919, definindo que a partir de então a Rua do Conselheiro Saraiva, no Aterro de Jaraguá, passaria a ser denominada como Avenida da Paz.

Houve ainda, dias depois, a inauguração de uma placa comemorativa dos festejos da Paz na Praça Sinimbu, em 26 de outubro.

Segundo publicação do Jornal do Comércio do Amazonas, em 8 de novembro de 1919, o intendente de Maceió — Leonino Corrêa de Oliveira —, havia sancionado “a lei decretando que a atual rua Conselheiro Saraiva, compreendida da ponte dos Fonsecas até a fábrica Santa Margarida, fica denominada avenida da Paz”.

Para não melindrar o “desomenageado” Conselheiro Saraiva“, renominaram a praça Onze de Junho, em Jaraguá, com o seu nome. Esse logradouro, após servir para diversas outras homenagens, é atualmente a Praça Dois Leões.

A Paz ameaçada pela guerra

Desfile Militar na Avenida da Paz. Foto do acervo de José Maria Correia das Neves

Em 30 de outubro de 1930, o Diário da Noite do Rio de Janeiro especulava com a possibilidade da Avenida da Paz ser renominada como Avenida Juarez Távora. Vale lembrar que a vitoriosa Revolução de 30 tinha colocado Getúlio Vargas no poder seis dias antes. Esse histórico movimento armado político-militar teve a participação destacada do general Juarez Távora. Alguns veículos de comunicação se referiam a ele como o “Libertador do Norte”.

A tranquila e pacata Avenida da Paz resistiu a este primeiro ataque, mas foi derrotada por outro conflito, a Segunda Grande Guerra Mundial. No início dos anos da década de 1940, quando o Brasil se preparava para participar deste conflito, Getúlio Vargas adotou como política de motivação para a guerra o enaltecimento de vultos históricos e dos feitos de militares brasileiros.

Assim, Duque de Caxias, passou a ser valorizado como o responsável pela unidade nacional durante a Regência e o 2º Reinado. Segundo José Luciano de Queiroz Aires em seu livro Poder, Memória e comemorações na Paraíba (1935-1945), “A memória do Patrono do Exército, elaborada no contexto do Estado Novo, apelava para a lembrança de que seus atos de força sempre foram dosados por ‘brandura’, ‘clemência’ e ‘simpatia humana’, um ‘verdadeiro pacificador’ do Brasil.

Cumprindo esse objetivo, foi realizado em agosto de 1941 a Semana de Caxias em Maceió, como noticiou A Manhã de 12 de agosto.

Na mesma nota o jornal informava que “atendendo à sugestão do Comandante da Companhia de Quadros, o Prefeito da Capital baixará um decreto denominando Avenida Duque de Caxias a atual Avenida da Paz”.

Ainda segundo o jornal, na edição de 14 de agosto, a iniciativa partiu de “estudantes e elementos do 20º Batalhão de Caçadores”. O interventor no Estado era o major Ismar de Góis Monteiro e o prefeito nomeado era Francisco Abdon Arroxelas. Respondia pelo comando do 20º BC o coronel Manoel Cândido Fernandes.

O Duque de Caxias assumiu a avenida por força do Decreto nº 413, de 25 de agosto de 1941.

Mas a Paz prevaleceu muitos anos depois, graças ao vereador Enio Lins, que fez aprovar a Lei nº 3.989, de 7 de agosto de 1990, revogando o decreto acima citado.

Área nobre

Na virada do século XIX para o XX, a Rua Conselheiro Saraiva começou a receber as construções de habitações das famílias mais abastadas da cidade. O trecho mais próximo da Rua Sá e Albuquerque também ganhava investimentos, principalmente comerciais.

A empresa mais importante desta via por muito tempo foi a Fundição Alagoana de Jacintho José Nunes Leite. Inaugurada no dia 2 de dezembro de 1883, às 14h, estava instalada no final da Rua Conselheiro Saraiva. O limite desta via com a Rua da Alfândega, atual Rua Sá e Albuquerque, era a entrada para a Estrada Nova, atual Av. Comendador Leão.

Serraria Modelo e Fábrica de Tecidos Santa Margarida

Há poucos metros dali, na esquina da Rua Desembargador Paulo da Rocha Mendes, antiga Rua Mato Grosso, a Rua Conselheiro Saraiva recebeu, em janeiro de 1914, a Fábrica de Tecidos Santa Margarida, que deixou de funcionar em 10 de maio de 1930 e no ano seguinte, em abril, teve sua falência decretada. Seus bens foram a leilão em 26 de agosto do mesmo ano.

Pertencia à firma L. Vasconcelos & Cia de Luiz de Vasconcellos e entrou na história do bairro por incomodar os vizinhos com o barulho das máquinas e apitos e por fazer os moradores tremerem quando um dos possantes motores da indústria era acionado.

Essa trepidação era tal que, em março de 1928, o Banco de Alagoas, situado na esquina da Av. Comendador Leão, requereu à Prefeitura vistoria em seu prédio por considerá-lo abalado pelo tal motor. O engenheiro municipal constatou que realmente tremia, mas que não iria provocar danos. A Serraria Modelo, ao lado da fábrica, também reclamou de possíveis danos.

Os vizinhos também protestavam contra os apitos acionado ainda na madrugada. O proprietário foi até os jornais para esclarecer a razão dos chamados sonoros naquele horário: “O primeiro apito é para acordar os oitocentos operários, o segundo é para tomarem banho, o terceiro é para tomarem uma xícara de água quente com bolacha, e o quarto é para darem entrada na fábrica, Os incomodados que se mudem”. (J. F. Maya Pedrosa – Histórias do Velho Jaraguá).

Começou a funcionar em 1914. Parou de produzir em 1930 e sua falência foi requerida em abril de 1931. O leilão dos bens ocorreu em 26 de agosto do mesmo ano.

Com o Brasil entrando na 2ª Guerra Mundial em 1942, Alagoas recebeu efetivos militares para aumentar a vigilância do litoral nordestino. Além do 22º Batalhão de Caçadores, Maceió hospedou, a partir de 15 de outubro, o grupo de artilharia II/4º R.A.M., que foi transportado de Itú, São Paulo. Ficou instalado no prédio da antiga fábrica de tecidos Santa Margarida.

Estas unidades estabelecidas em Maceió se constituíram numa grande unidade de comando cujo Quartel General foi instalado na casa nº 1390 da Avenida da Paz, onde funcionou depois uma casa de saúde infantil (ao lado do futuro Hotel Beira-Mar). Na casa vizinha, onde depois residiu Dalmo Peixoto, funcionava a aparelhagem de rádio escuta das forças americanas, que atuavam utilizando os famosos blimps.

Ao lado da Santa Margarida se instalou, em 1915, a Serraria Modelo (Rua Conselheiro Saraiva, 27). O livro Terra das Alagoas, de 1922, registra esta empresa como pertencente a firma Leão & Irmãos. Entretanto esta pesquisa identificou a firma M. Cavalcanti & Cia, de Manoel Cavalcanti de Mello, como a detentora dessa indústria. Essa mesma empresa controlava também um estaleiro em São Miguel e ainda atuava na construção civil.

Publicações de 1911 já trazem Manoel Cavalcanti de Melo como construtor naval em São Miguel, onde residia. Mudou-se para Maceió em 15 de janeiro de 1917.

Hotel Atlântico

Av. da Paz e o Hotel Atlântico

Outro equipamento importante a se instalar no Aterro de Jaraguá em 1920 foi o Hotel Atlântico. Ocupou o prédio construído pelo próspero comerciante João Nunes Leite, que faleceu em 1906. Era casado com Francisca Gomes Leite.

Em dezembro de 1908, esse imóvel tinha o endereço de Rua Saraiva, nº 103, e foi anunciado que passaria a servir como Quartel General da Inspeção Permanente do Exército, ocupado pelo general de divisão Francisco da Rocha Callado, um alagoano, que lá também residiria. Isso somente aconteceu no final de outubro de 1910.

Segundo Félix Lima Júnior, o prédio foi vendido ao dr. Levino David Madeira, casado com Rosa de Lyra Madeira, filha do coronel Carlos Lira, proprietário da Usina Serra Grande em São José da Lage e do jornal Diário de Pernambuco. As iniciais L e M no portão de ferro faziam referência a Levino Madeira.

Nos anos da década de 1920, esse imóvel foi alugado ao governo do Estado para servir como Casa de Veraneio dos governadores de Alagoas. Com a Revolução de 1930, o palacete foi devolvido aos proprietários, passou alguns anos fechados e foi reaberto como Hotel Atlântico, o primeiro de Maceió na faixa litorânea da cidade. Era explorado por Adib Rabay, também proprietário do Bella Vista Palace Hotel e do Hotel Aurora, na Av. Moreira Lima, nº 8. Este com a firma A. Rabay & Almeida.

Em 1951, o hotel foi adquirido por Manoel Miranda e permaneceu de posse da família até os anos 80, quando deixou de funcionar.

O prédio original teve uma ala demolida por decisão da Prefeitura de Maceió para que fosse construída a parte final da Av. Humberto Mendes.

Palacete Boaventura de Amorim

Palacete construído por Boaventura de Amorim

O jornal Gutenberg de 18 de fevereiro de 1908 anunciou naquela data e nas edições seguintes que se encontrava a venda uma “grande casa sita à rua do Saraiva com frente para o mar, junto a Ponte dos Fonsecas, com grandes cômodos para família de tratamento, compostos de 4 salas, 7 quartos, alguns muito espaçosos e assoalhados, um primeiro andar com grande salão para dormitórios circulado de janelas para todos os pontos, sala de copa, grande cozinha com fogão inglês, extensíssimos terraços cobertos para passeio, jardim com gradil e portão de ferro, grande quintal murado com portão e saída para os fundos, latrina patente, banheiro muito bom com 2 caixas de água, água potável em abundância, cacimba com a competente bomba, grande terreno ao lado para continuação do jardim, instalação de luz elétrica & & a tratar com o proprietário no Bazar de Novidades, Rua do Comércio, 106 — Maceió”.

O Bazar das Novidades era de propriedade do português Boaventura Rodrigues de Amorim, então casado em segunda núpcias com Maria Rodrigues de Amorim, viúva de Manoel Rodrigues.

Outra prova do vínculo deste proprietário com o imóvel anunciado à venda em 1908 foi encontrado no Gutenberg de 26 de abril de 1906. É uma cobrança de Imposto sobre taxa sanitária relacionando os moradores da Rua Saraiva. Lá consta que os prédios vizinhos de nº 141 e 143 pertenciam a Boaventura de Amorim.

Palacete Boaventura de Amorim em 1919, ainda sem a cúpula mourisca

Boaventura de Amorim ficou viúvo de Maria Duarte Amorim em 1896. Nesse período residia em um sobrado na Rua 15 de Novembro, atual Rua do Sol, indicando que ainda não tinha construído o prédio da Rua Conselheiro Saraiva, que colocaria a venda em 1908.

O prédio foi adquirido por outro português no mesmo ano em foi posto à venda. O comendador Eduardo Ferreira Santos era um comerciante que tinha se estabelecido na Bahia, onde em 1882 podia ser encontrado na Loja de Modas, na Rua Conselheiro Dantas, nº 19, em Salvador.

Casado com Adelina Ferreira Santos, com quem teve a filha Georgina Ferreira Santos, expandiu seus negócios para Maceió, onde registrou a firma Ferreira Santos & Cia.

Duas publicações em jornais indicam que este proprietário, tendo se destacado nos negócios e comércio local, continuava residindo em Salvador.

No Correio do Brazil, jornal publicado em Salvador, na Bahia, em 22 de março de 1904, uma nota informava que o “estimado sr. Eduardo Ferreira Santos” havia chegado da Europa, mas já estava de partida para Maceió. “O estimado negociante vai até aquela capital a negócios seus comerciais, demorando-se sua exma. Família nesta capital”.

Em 1906, quando Eduardo Ferreira já era vice-presidente da Associação Comercial de Maceió, o Gutenberg, de 4 de setembro, informou que o “comendador Eduardo Santos”, acompanhado de esposa e filha, haviam regressado a Alagoas. “O sr. Ferreira Santos acha-se hospedado no aprazível Hotel Nova Cintra”.

Avenida Paz e o Palacete Boaventura de Amorim

Quando adquiriu o palacete, em 1908, já era diretor tesoureiro da Companhia das Águas de Maceió, cargo onde permaneceu até 1º de junho de 1909. Em 1911 era um dos diretores da Companhia Progresso Alagoano.

Seu vínculo com o imóvel está comprovado por ter requerido, em 23 de setembro de 1909, autorização para “fazer diversos reparos no prédio nº 143 à rua do Saraiva”. Também requisitou permissão, em 7 de outubro do mesmo ano, para “fazer reparos no muro e calçada do seu prédio nº 137 a rua Saraiva”. Era um imóvel vizinho.

O comendador Eduardo Ferreira faleceu em Fernão Velho no dia 14 de agosto de 1917.

Sua filha única, Georgina Ferreira Santos, havia se casado, em 31 de janeiro de 1910, com o médico Arthur Machado (Gutenberg de 27 de janeiro de 1910).

O dr. Arthur de Mello Machado era filho do comendador José Teixeira Machado, que morava em uma chácara no Mutange. Formou-se em Medicina na Bahia em dezembro de 1907. Dias depois, em 7 de janeiro, viu sua irmã, Rita de Mello Machado, morrer em seus braços vítima de tuberculose.

Foi o dr. Arthur quem, em 1919, reformou o palacete utilizando decorações em gesso, aplicadas por dois artesãos portugueses, e acrescentou as varandas externas reconhecidas por sua cúpula mourisca.

De arquitetura eclética, o prédio foi um marco na Rua Conselheiro Saraiva. Ficou conhecido por muito tempo como Palacete Arthur Machado.

Com a morte do seu proprietário em 1951, o imóvel passou para o filho do casal, dr. Eduardo Ferreira Santos Machado, que anos depois o alugou para Manoel Miranda para ser utilizado como anexo do Hotel Atlântico. Permaneceu como tal até 1963, quando foi desapropriado pela União e entregue à Universidade Federal de Alagoas.

Foi utilizado inicialmente como a Residência Universitária Feminina de Alagoas, mais conhecida como Lar das Universitárias de Alagoas (LUA).

Após passar um período em completo abandono, foi restaurado e, em 1977, quando acontecia em Maceió a V Festa do Folclore Brasileiro, o prédio recebeu a coleção do Museu Théo Brandão, da Ufal, que por lá permanece até a atualidade. O palacete foi tombado pelo Pró-Memória.

Urbanização de 1927

Avenida da Paz nos anos 30

Confirmada como uma área nobre da capital, o antigo Aterro de Jaraguá logo se juntou a outras vias que passaram a receber tratamento diferenciado por parte da municipalidade, a exemplo da limitação imposta pela intendência de Maceió, que passou a proibir a “construção e a reconstrução de casas térreas na ruas dr. Rocha Cavalcanti (Rua do Comércio), Barão de Anadia, Libertadora Alagoana (Rua da Praia), dr. Guedes Gondim, Senador Mendonça, Praça Sinimbu, Avenida da Paz, Sá e Albuquerque e Conselheiro Lourenço de Albuquerque (Rua Boa Vista)”. (Diário de Pernambuco de 13 de abril de 1923).

Entretanto, o maior benefício que a avenida recebeu na primeira metade do século XX veio do prefeito Anfilófio de Melo, o Jayme de Altavila, que assumiu em 1º de fevereiro de 1927 anunciando que realizaria grandes obras na cidade.

Moacir Santana, em seu livro Jayme de Altavila: Evocação, relata que na Avenida da Paz “foram colocados 680 metros de meios-fios ao longo do calçamento, acompanhados de muros de arrimo no sentido longitudinal da praia, com altura média de 1,50 metros e espessura de 60 centímetros, 1.360 metros de meios-fios centrais para proteção dos passeios, além de pequenos meios-fios destinados a proteger os canteiros”.

E mais “1.640 metros quadrados de mosaicos nos passeios que contornavam a parte ajardinada, arborização e colocação de gradis para proteção das árvores plantadas; 48 bancos de cimento armado; 22 combustores de ferro para a iluminação do logradouro, feita mediante cabos de eletricidade subterrâneos; construção de uma escadaria de alvenaria, além da execução de calçamento de ruas transversais, uma delas a Silvério Jorge, onde foram construídos 190 metros de esgoto e 130 metros de meios-fios”.

O Jornal do Amazonas de 8 de abril de 1927 também informou sobre estes investimentos, divulgando que naquela data as obras da Avenida da Paz estavam sendo executadas e que “logo após a concorrência para construção dos meios fios, que couberam ao construtor civil, sr. Joaquim Teixeira Medalhas, a seção técnica marcou o terreno de acordo com o projeto”.

Avenida da Paz nos anos 40

O jornal detalhou ainda que “ao longo da avenida correm quatro linhas paralelas de meios-fios, divididos em quatro secções de cento e sessenta metros, havendo entre cada uma destas secções uma abertura ou rua de seis metros, devidamente calçadas a paralelepípedos”.

E ainda que “as duas primeiras linhas de meios-fios limitam o passeio interno, e as duas outras o passeio externo. Entre os passeios ficará uma arca de seis metros e oitenta ocupada pela arborização. Pelo centro correrão, em intervalos de trinta metros, os postes de iluminação, ladeados por dois bancos em cimento armado”.

Contudo, a obra mais festejada da administração de Jaime de Altavila foi o Coreto da Avenida, inaugurado no dia 1º de janeiro de 1928. Recebeu sua primeira apresentação musical no dia 9 de fevereiro do mesmo ano, sendo palco para a banda da Força Policial Militar entre às 18h30 e 20h30.

Com essa obra recebendo elogios da população, os prefeitos que sucederam a Altavila também resolveram investir em melhoramentos no urbanismo da cidade. Assim, no início de 1933, Orlando Valeriano de Araújo anunciou no Diário de Pernambuco de 31 de março, que já estava realizando os trabalhos preliminares de terraplanagem do local onde vai ser construída a Avenida Beira-Mar, em continuação à Avenida da Paz.

Pretendia “facilitar o mais possível a construção dos bangalôs e casas de estilo do futuro bairro elegante da capital”. Essa continuação da Avenida da Paz em direção à Praia do Sobral tinha como limite a foz do Riacho Maceió, que desembocava no mar nas imediações da atual Rua Dias Cabral.

Garage Alagoana e o Clube Fênix

Garage Alagoana

A Garage Alagoana foi uma das primeiras locadoras e oficinas de autos de Maceió. De propriedade da firma Irmãos Leão & Cia, se instalou no Aterro de Jaraguá nos primeiros anos da década de 1910.

O prédio ficava à direita de quem chegava à praia pela Ponte dos Fonsecas e por lá permaneceu até 1936, quando foi demolido para em seu lugar erguer-se a sede social do Clube Fênix Alagoana.

Um dos raros registros de sua atividade está no relatório de 15 de março de 1916 do governador João Baptista Accioly Júnior, que anotou ter pagado à Garagem Alagoana em 30 de setembro do ano anterior a quantia de 10$000 por uma viagem no serviço médico.

A Fênix Alagoana, foi fundado, segundo Félix Lima Júnior em Maceió de Outrora, em 7 de setembro de 1886 e surgiu na Rua da Igreja, em Jaraguá, como uma “sociedade de gente aristocrática, fina, endinheirada, quase toda daquele bairro”.

Como, nas primeiras décadas do século XX, Jaraguá perdeu o título de “nobre área residencial”, principalmente para a Avenida da Paz e Pajuçara, o clube optou, em assembleia geral realizada no dia 9 de junho de 1933, por deixar sua antiga sede na Rua Barão de Jaraguá e erguer outra mais próxima do centro da cidade.

Clube Fênix na Avenida da Paz nos anos 50. Foto Stuckert

O prédio na Avenida da Paz foi inaugurado em 1936. Informou Ednor Bittencourt que “a nova sede, situada na Praça Napoleão Goulart e construída pelo engenheiro Aloisio Freitas Melro, sob o patrocínio do dr. Quintela Cavalcante” custou a quantia de 400 contos de réis.

Antes da instalação da Fênix na Praia da Avenida, a área que viria a ser a Praça Napoleão Goulart recebeu, em junho de 1935, urbanização e a construção de um caramanchão. Foram erguidos ainda mais de 25 metros de cais e 1.420 metros quadrados de calçamento a um custo de 46:647$670.

Muitos anos depois, a Praça Napoleão Duarte foi incorporada ao patrimônio da Fênix por doação da Prefeitura.

No mesmo ano em a nova sede da Fênix foi inaugurada, um grupo de banhistas moradores das imediações da Avenida da Paz resolveu mobilizar recursos para a construção de um trampolim “naquela praia de banhos”.

Não se sabe se tal equipamento foi instalado, mas três anos havia uma quadra de voleibol, como informou o Diário de Pernambuco de 8 de outubro de 1939 ao divulgar que no dia anterior havia sido realizada uma partida entre o Grêmio Atlético Leão e o Sugar Volley Club.

No Gazeta de Notícias do Rio de Janeiro, edição de 5 de fevereiro de1939, uma crônica de Renato de Alencar se refere a Maceió como uma cidade feliz, na ingenuidade de sua vida provinciana: “Que poesia indescritível ali na Avenida da Paz, em noites de luar, as ondas em pelotão impecável a parodiar o ‘chuá-chuá’ dos coqueiros do Sobral e da Pajuçara…”.

Banhos de Mar à Fantasia

Primeiro banho de mar a fantasia em Maceió, noticiado na Revista da Semana de 2 de fevereiro de 1929

Nos primeiros anos do século XX, Maceió começou a ter suas praias procuradas para banhos não mais somente para fins medicinais, como predominou durante todo o século XIX no litoral brasileiro, principalmente no Rio de Janeiro.

As mais procuradas eram a Praia do Aterro e a Praia da Pajuçara, esta localizada, então, num distante bairro de Maceió.

Em meados da década de 1920, começaram a acontecer no Rio de Janeiro os “Banhos de Mar à Fantasia” durante as prévias carnavalescas. Mesmo que já existissem desde o final do século XIX, estes eventos ganharam força com a popularização do uso das praias para banhos e por surgirem vários clubes com suas sedes próximas ao litoral.

Em Maceió, onde a Praia do Aterro já era utilizada nos carnavais para o corso, o primeiro Banho de Mar à Fantasia ficou registrado na Revista da Semana (RJ) de 2 de fevereiro de 1929. Três fotos na cabeça de uma página receberam a seguinte legenda: “O primeiro banho de mar à fantasia em Alagoas, na Avenida da Paz. Na gravura do centro, assinalado, o professor João Agnello Marques Barbosa, catedrático do Lyceu Alagoano, com 67 anos de idade (1º prêmio — Índio)”.

Av. da Paz e o Banho de Mar à fantasia nos anos 60

O sucesso do primeiro evento de banho de mar carnavalesco foi tal que voltou a ser realizado até fora do período reservado para estes festejos, a exemplo do divulgado pelo jornal A Província de 1º de outubro de 1930: “Constituiu uma nota “chic” nas elegantes rodas mundanas da cidade o banho de mar à fantasia, na enseada de Jaraguá, à avenida da Paz, no domingo 21, em que tomaram parte muitas senhoritas e rapazes de nossa sociedade. Exibiram-se na festa o rancho do “Casamento da Fuzarca”, um grupo de “Indígenas” e o cortejo das “Misses”, que foi a nota humorística, constituindo de rapazes, em “travesti”, em carroças ornamentadas e precedido de original banda de música. Fizeram-se representar vários países, cabendo a distribuição dos prêmios o primeiro lugar (“miss” Universo) a “miss” Tchecoslováquia; o 2º a “miss” Estados Unidos e o 3º a “miss” Turquia. Devido ao sucesso dessa festa os nossos elementos de sociedade promovem para breve novos números de recreio naquela praia”.

Em 1932, o Diário de Pernambuco constatou que na capital alagoana vinha “se revestindo de grande animação a temporada balneária nas principais praias da cidade. Pajussara e Aterro, principalmente aos domingos, são as mais concorridas”.

Carros Alegóricos e troças na Av. da Paz no início do século XX. Foto de Luiz Lavenère

O mesmo Diário de Pernambuco, mas de 14 de fevereiro de 1935, voltou a destacar o sucesso do banho de mar à fantasia realizado na Avenida da Paz em Maceió. Identificou, durante os desfiles do dia anterior, os “vários grupos com críticas interessantes”. Neste ano foram distribuídos 25 prêmios, mas a sensação foi “uma espécie de cavalhada corrida com jumentos”.

Com a instalação da sede da Fênix Alagoana na Avenida da Paz a partir de 1936, o Banho de Mar à Fantasia se consolidou e sobreviveu ali até os anos 70. Voltou a acontecer na Praia da Pajuçara nos primeiros anos do novo milênio graças à Liga Carnavalesca de Maceió e ao seu associado mais antigo, o histórico Bloco Vulcão.

A maloca do Moleque Namorador

O Diário de Pernambuco de 6 de setembro de 1935, em reportagem intitulada “Como vivem os ‘maloqueiros’ em Maceió”, denunciando onde se localizavam as malocas na capital, encontra uma delas na Avenida da Paz, praticamente no fundo do novo prédio da Fênix.

O chefe desse grupo de menores era o futuro passista Moleque Namorador (tinha 16 anos), então um gazeteiro já bem conhecido pelo 1º Delegado Auxiliar, dr. Mendonça Braga, que foi entrevistado e revelou que as malocas eram “buracos cavados na areia, onde agora estão morando vários deles”, aproximadamente uma dúzia.

Armando Veríssimo Ribeiro, o Moleque Namorador, com 18 anos e 1,43m de altura. Era gazeteiro

Mendonça Braga explicou que tinha começado uma campanha, com alguns resultados, “contra esse desgraçado entorpecente, a ‘maconha’, usada em larga escala por estes infelizes”. Relatou que havia proibido a venda “que se fazia às escâncaras no Mercado Público e o consumo certamente tem decrescido”.

A reportagem esteve no local e foi recebida pelo próprio Moleque Namorador, caracterizado como alguém muito vivaz: “Um pedaço de gente, ameaça qualquer um dos maiores da ‘tribo’ ou homem mais robusto, que o desagrade, empunhando cinco ou seis centímetros de faca”.

Vendia jornais e revistas e era ele quem se dirigia ao delegado para solicitar a soltura “dos pivetes de sua maloca”. Para ser fotografado, convocou seu pessoal: “Chega macacada! Vai sair o retrato da gente no Pernambuco”.

Maceió, à época, convivia com o problema de menores abandonados nas ruas. Era “uma pequena legião de meninos e rapazes sem ocupação, esmolando ou furtando o pão que comem, dormindo ao relento nos batentes das casas ou nas calçadas das praças, cobertos de farrapos”.

Novo curso do Riacho Maceió

Ponte do Salgadinho destruída pela tromba d’água de 1949

Uma das principais mudanças que a Avenida da Paz sofreu ocorreu a partir de 1948, quando o Riacho Maceió teve o seu trajeto final modificado e o curso anterior foi aterrado. O surgimento de novas áreas edificáveis ampliou principalmente a área urbana do trecho sul da via, permitindo a abertura de vias e a construções de novas edificações.

Essa modificação exigiu a construção de uma nova ponte, considerando que a dos Fonsecas ficou sem uso. Os recursos para esta obra foram conseguidos com o Governo Federal e foi realizada durante a gestão do prefeito Reinaldo Carlos de Carvalho Gama, que teve que desapropriar cinco imóveis entre o Hotel Atlântico e a residência do professor Lavenère Machado para permitir que o Riacho Salgadinho encontrasse o mar nesta nova embocadura.

A nova ponte teve a vida mais curta entre as pontes construídas em Alagoas. Foi completamente destruída pela tromba d’água que desceu o então já Riacho Salgadinho na madrugada da quinta-feira, dia 19 de maio de 1949.

As principais consequências urbanas da retificação do curso do Riacho Salgadinho foram as seguintes: surgimento do prolongamento da Rua Silvério Jorge até a Praça Sinimbu; surgimento da Rua Arthur Jucá; prolongamento da Rua Barão de Anadia até a então Av. Duque de Caxias; prolongamento da Rua Dias Cabral até a continuação da Av. Duque de Caxias e o surgimento da Av. Humberto Mendes. A maior parte destas vias foi urbanizada pelo prefeito João Teixeira de Vasconcelos.

Espaço dos grandes eventos da capital

Exibição de carros voadores em meados dos anos 70 na Av. da Paz

Além das festas carnavalescas, a Avenida da Paz também foi palco de outros eventos da cidade, principalmente os que exigiam grandes espaços.

Alguns deles ainda permanecem, como os desfiles cívicos-militares comemorativos da independência e da emancipação política de Alagoas.

As areias da Praia da Avenida também serviram para receber os primeiros aviões que pousaram em Alagoas.

Os circos também por lá se instalavam, utilizando o espaçoso terreno onde depois se ergueu o prédio das Lojas Americanas.

Já nos anos da década de 1960, a via foi utilizada como pista de corridas automobilísticas ou para demonstrações de habilidades de alguns pilotos de automóveis e motocicletas.

Entretanto, como é uma avenida litorânea, seu principal evento foi, por décadas, o banho de mar dominical.

A faixa frequentada por maior período foi o trecho entre a Rua Barão de Anadia e a Rua do Imperador, acessos naturais dos moradores dos bairros distantes à praia.

Competição de lambretas na Avenida da Paz em 1958

No início da década de 1970, com a inauguração do Clube da Associação Atlética Banco do Brasil (AABB) no final da Avenida da Paz, próximo à Rua Dias Cabral, surgiu na praia à sua frente o primeiro ponto de encontro da juventude maceioense após a chamada revolução comportamental dos anos 60.

De forma espontânea, anos depois esse ponto se deslocou para a frente do monumento da Jangada, em frente à Rua do Imperador. Provavelmente por estar também nas proximidades do Lar da Universitária de Alagoas (LUA), que ocupava o prédio do hoje Museu Théo Brandão.

Não durou muito tempo aí. A poluição do Salgadinho tratou de levar o point para a praia do Coreto, então utilizado por um bar de nome Castelinho. O próximo ponto já foi na Praia da Pajuçara, em frente ao Iate Clube. Depois essa juventude se espalhou entre Ponta Verde e Jatiúca.

Atualmente, a Avenida da Paz é palco do evento carnavalesco Jaraguá Folia, da Liga Carnavalesca de Maceió, além de manter os tradicionais desfiles cívicos-militares.

Comércio e Serviços

Av. da Paz no final do anos 60 com o Edifício São Carlos

Do seu início como um logradouro onde predominava o uso residencial, a Avenida da Paz guarda poucos sinais.

Um deles, o Edifício São Carlos, foi a primeira grande unidade multifamiliar da capital. Inaugurado em 1964, tem onze pavimentos e dois apartamentos por andar. Ao seu lado e com as mesmas caraterísticas, subiu o Edifício Núbia, que foi entregue em 1970.

Entretanto, aquela que seria uma área nobre da cidade não suportou por muito tempo os efeitos da praia poluída à sua frente e, aos poucos, seus habitantes foram preferindo se estabelecer nas novas praias da capital. Assim, os antigos imóveis foram sendo ocupados por empresas comerciais ou de serviços.

Outro investimento pioneiro na Avenida da Paz foi o Luxor Hotel, inaugurado em 25 de fevereiro de 1975. Foi o primeiro estabelecimento deste ramo em Maceió com estrutura capaz de receber público mais exigente. No ato de inauguração, estavam presentes o governador do Estado, Afrânio Lages e Walter Ribas, presidente do Grupo Luxor.

Salva-vidas na Av. da Paz com a Praia do Sobral ao fundo

Em 1977 foi a vez da inauguração do Hotel Beira-Mar, vizinho ao Luxor e disputando o mesmo público que este.

Estes dois grandes empreendimentos também foram vítimas de suas localizações, em área de praia poluída e distante da atrativa e crescente Ponta Verde.

A última grande obra pública realizadas na Avenida da Paz foi a construção do Memorial à República. Inaugurado em 15 de novembro de 2005, o monumento ocupa uma área total de 2.500 metros quadrados e foi construído pelo governo do Estado a um custo de R$ 1,5 milhões. O projeto foi de autoria do arquiteto Alex Barbosa e homenageia os marechais alagoanos Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto.

7 Comments on Avenida da Paz, o aterro de Jaraguá

  1. José Julio Camelo Ferreira // 19 de setembro de 2019 em 21:15 //

    Muito interessante. Parabéns! Publiquem maus histórias de nossa Maceió com fotos.

  2. ELIAS FERNANDES DE SOUSA // 19 de setembro de 2019 em 22:35 //

    FANTÁSTICO

  3. Simplesmente fantástico. Ótimo acervo.

  4. Parabéns pelo belo trabalho de pesquisa e pelo material compartilhado. Sou guia de turismo e utilizo seu site sempre como fonte segura para as minhas narrativas.

  5. SANDRA MACILDA NOBRE // 12 de maio de 2022 em 23:33 //

    GOSTEI MUITO DAS PUBLICACÕES ,AMEI, QUERO VER MAIS HISTORIA DA NOSSA TERRA ,POIS NO PASSADO ELA ERA LINDA HOJE ESTA FEIA, SEM ATRATIVOS, TIRANDO AS NOSSAS PRAIAS , O RESTO ESTA SEM VIDA E SEM HUMANIDADE PARA O POVO, FICO TRISTE COM ESSAS MUDANÇAS TAO BRUSCAS E SEM BELEZA.

  6. Excelente documentário . Parabéns

  7. Carmo Lobo // 22 de abril de 2024 em 19:17 //

    Maceió só retrocedeu.Inchou.Sem infraestrutura.Sem humanização.
    Desarborizada, poluída, castigada pelos maus tratos.
    Só se salva o mar, que está sendo também destruído pela ganância do capital, com destruição dos corais e das populações primitivas.Uma pena!

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