Comemorações do Centenário da Emancipação Política de Alagoas em 1917

A Praça D. Pedro II foi palco das comemorações do Primeiro Centenário da Emancipação Política de Alagoas em 1917. Foto de Benjamin Falcão

O primeiro registro sobre os eventos que celebraram a passagem dos cem anos da emancipação política de Alagoas está no relatório apresentado à Assembleia Legislativa, em 15 de abril de 1915, pelo governador Clodoaldo da Fonseca.

Disse o governante em sua mensagem ao Poder Legislativo: “Decretei a organização de uma exposição Agropecuária, para solenizar o centenário da emancipação política do Estado, em 1917. Para estudar a organização desses certames, foram convidados os drs. Redomark de Albuquerque e Ignácio B. Calmon de Siqueira”.

As comemorações ocorreram nos dias 15, 16 e 17 de setembro de 1917 e tiveram como palco principal a Praça D. Pedro II

Segundo o Correio da Manhã de 19 de outubro de 1915, quem também demonstrou com bastante antecedência o interesse em comemorar o centenário foi o Instituto Arqueológico e Geográfico de Alagoas, atual Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas: “Maceió, 18 – (Americana) – Os membros do Instituto Arqueológico tencionam comemorar o centenário da emancipação de Alagoas, tendo sido designada uma comissão para obter do governador do Estado, a ampliação do edifício social e outras concessões”.

Oficialmente, as ações voltadas para este evento tiveram início em 16 de setembro de 1916, exatamente um ano antes.

A iniciativa partiu do governador João Baptista Accioly Junior, que baixou o Decreto nº 800, estabelecendo um “desconto de um e meio por cento (1 ½) sobre toda a receita pública do Estado que não tenha aplicação especial, para a solenidade festiva da data de 16 de setembro de 1917 que marca o Centenário da Emancipação Política de Alagoas”.

O arrecadado, 55:000$000, foi depositado numa conta do Tesouro do Estado no Banco do Estado e a autorização para qualquer pagamento passava pelo aval do governador.

Esse mesmo decreto definiu que para organizar e executar o programa das festas, seria criada uma Comissão Central que funcionaria “por convocação e sob a presidência do Governador do Estado”.

Ainda em setembro, o governador enviou circular a todos os municípios solicitando que também celebrassem a Emancipação.

O Decreto entrou em vigor, mas dependia da “aprovação do Congresso Legislativo do Estado na sua primeira reunião”. Isso somente ocorreu no ano seguinte, como demonstrou o Diário do Povo de 2 de maio de 1917 ao informar que no dia anterior foi lido na Assembleia Legislativa o parecer da Comissão de Leis, Poderes e Justiça “aprovando os decretos do poder executivo referentes à comemoração do centenário da emancipação política de Alagoas”.

Pavilhões e portais foram erguidos na Praça D. Pedro II

A Comissão Central foi escolhida dias depois (25 de setembro de 1916) de publicado o decreto, em reunião realizada a partir das 20 horas no Palácio do Governo. Após explicar aos presentes a importância da data a ser comemorada, o governador Baptista Acioly abriu as discussões sobre a formação da Comissão.

O Instituto Arqueológico, presidido então por Diegues Júnior, propôs que a coordenação fosse composta por oito membros, em homenagem aos oito municípios existentes na data da emancipação. O dr. Leite Oiticica não concordou. Preferia cinco componentes. Deliberou-se pelos oito.

D. Manuel, o bispo diocesano, foi escolhido presidente de honra após ser indicado pelo governador. A comissão ficou composta por d. Manuel Antônio de Oliveira Lopes, presidente de honra, e dr. Costa Leite, secretário geral. Os demais membros foram os seguintes: Leite e Oiticica, Esperidião Tenório de Albuquerque, Moreira e Silva, Joaquim Ignácio Loureiro, Teixeira Basto, Francisco Leão, Manoel Sampaio Marques e Demócrito Brandão Gracindo.

Em fevereiro de 1917 a Comissão Central tentava organizar a exposição agroindustrial proposta por Clodoaldo da Fonseca dois anos antes. O local pretendido para tal evento era a antiga Enfermaria Militar ao lado da Estação Ferroviária.

O prédio foi cedido após uma troca de correspondência entre o governador do Estado e o presidente da República Venceslau Brás, mas não foi utilizado, provavelmente pelos altos custos da sua recuperação.

Primeiro Congresso Católico

Em paralelo as comemorações oficiais da Emancipação, a Igreja Católica de Alagoas resolveu realizar no mesmo período o seu Primeiro Congresso. Uma das reuniões de preparação deste histórico encontro ocorreu no dia 18 de março de 1917. Foi convocada pelo monsenhor José Maurício para às 13h na Catedral (Diário do Povo de 15 de março de 1917).

No dia 18 de junho de 1917, uma comissão composta pelo dr. Bernardino Ribeiro, cônegos Manoel Vieira e Antônio Valente e o deputado Luiz Carlos foi até o governador em busca de auxílio para o evento. Baptista Acioly se comprometeu a atender ao pedido.

O Primeiro Congresso Católico de Alagoas foi aberto às 19 horas do dia 9 de setembro na Catedral e encerrado no dia 15, um dia antes da data comemorativa da Emancipação.

Preparativos

Missa campal na manhã do dia 16 de setembro de 1917 na Praça D. Pedro II

No dia 24 de agosto de 1917, o Diário do Povo publicou uma conclamação de alguém que se assinou como Ordep Reivax [palíndromo de Pedro Xavier], incentivando “o povo alagoano a concorrer com toda a sua boa vontade e o seu entusiasmo a essas festas, de uma significação tão alta e nobre, sendo verdadeiramente criminoso o indiferentismo dos bons filhos”.

Ao elogiar a comissão encarregada da realização das comemorações, Ordep Reivax revelou que já estavam construídos “diversos pavilhões para a realização de exposições de produtos agrícolas e industriais, obras de arte, etc”.

Estes quiosques, após as exposições do Centenário, foram aproveitados como salas de aula para o Jardim Infantil.

No dia 2 de setembro, outra nota publicada no mesmo Diário do Povo continuava a exortar a participação de todos e destacava o “esforço desenvolvido pelos poderes públicos, pelo Instituto Arqueológico, pelo Clero e por associações e individualidades sinceramente empenhadas…”.

Entre os preparativos, um Hino do Centenário foi composto por Jayme de Altavila (letra) e Benedito Silva (música). Eis a letra do hino:

Cem anos decorreram do áureo dia
Da Liberdade, da Emancipação,
Como outrora linda a chama d’alegria
Se avulta no teu nobre coração.

(Coro)
Terra de heróis, forte e bendita
Berço imortal de Floriano
Em cada filho teu palpita
Um coração republicano.

Embale-te o dormir, ó pátria querida,
Sempre este augusto e imenso coqueiral:
Tu és livre e não serás jamais vencida
Aqui sob este céu meridional.

Teu lindo flanco o Oceano Palpitante
Num forte abraço estreita juvenil.
Paulo Afonso atesta altiva e deslumbrante
Que és o torrão mais belo do Brasil.

Hosanas, pois, fecunda e amada terra
Que assinalas cem anos de labor.
Por ti nossa’alma enternecida encerra
Grande, sincero e dedicado amor”.

Programação

A partir do início de setembro de 1917, os jornais locais divulgavam em praticamente todos os dias a programação organizada pela Comissão Central:

Dia 15

Às 8 ½ horas exercícios de ginástica sueca pelos alunos do Colégio Diocesano, na Praça Floriano Peixoto (atual Praça dos Martírios).

Às 13 horas abertura da exposição pelo exmo. sr. Governador do Estado acompanhado de seus secretários e de sua casa civil e militar, na Praça D. Pedro 2º.

Às 14 ½ “match” de foot-ball no “ground” do Jacutinga, praça Jonas Montenegro (atual praça do Centenário).

À noite — grande baile na Phenix Alagoana

Dia 16

Missa campal no dia 16 de setembro de 1917, nas comemorações do Centenário da emancipação. Ao fundo a Catedral na Praça D. Pedro II

Missa Campal por s. exc. o snr. D. Manoel, Bispo Diocesano, às 8 horas da manhã na Cathedral, com sermão pelo snr. conego Franklin de Lima.

Às 13 horas abertura do Congresso do Estado, no respectivo palacete a praça D. Pedro 2º.

Às 14 horas grande corrida hippica no hypodromo do Jockey Club Alagoano.

Às 20 horas em ponto sessão solene do Instituto Archeologico e Geographico Alagoano e da Comissão Central para as festas do Centenário, no Theatro Deodoro.

Dia 17

Às 11 horas regatas na enseada da Pajussara.

Às 15 horas lançamento da 1ª pedra fundamental do monumento ao 1º Governador da Nova Capitania tenente-coronel Sebastião Francisco de Mello e Povoas.

À noite — divertimentos públicos: batalhas de confettis e serpentinas, corso de automóveis e fogos de artifício na praça Floriano Peixoto para encerramento das festas.

A exposição estará aberta de 10 da manhã às 9 da noite até o dia 17. A entrada é franca a todas as pessoas decentemente vestidas”.

Avaliação

Atendendo à solicitação do governador, vários municípios alagoanos também realizaram eventos comemorativos, quase todos organizados por professores e alunos das escolas públicas. Em Maceió, as principais instituições de ensino também tiveram programações próprias.

O Diário de Pernambuco de 18 de setembro de 1917 ao noticiar os eventos realizados avaliou que “os festejos do centenário da independência política, conforme a opinião geral, ficaram de certo modo aquém das expectativas”.

Entretanto, informações veiculadas em matérias do próprio jornal pernambucano contrariam essa avaliação.

Maceió recebeu expressiva quantidade de visitantes nesse período, o que levou a que todos os hotéis e pensões da capital fossem totalmente ocupados.

No dia 16 de setembro, o Jornal de Alagoas, Correio da Tarde, O Semeador e O Imparcial imprimiram edições especiais e tiveram suas tiragens esgotadas, tamanha foi a procura.

Quase toda a programação foi cumprida, como se percebe pelo relatório a seguir.

O primeiro evento do programa oficial para o dia 15 de setembro ficou ao encargo do Colégio Diocesano, que apresentou ginástica sueca com 150 alunos na Praça Floriano Peixoto, todos fardados de branco com cinta azul.

Sob a direção do irmão Gabriel Aubert e puxados pela banda de música da Polícia Militar, os alunos diocesanos desfilaram pela Rua do Comércio e outras do centro da cidade. Chegaram até o Palácio Episcopal, onde cantaram os hinos de Alagoas e do Brasil. Depois regressaram ao Colégio, onde foram fotografados.

A inauguração da exposição que deveria ocorrer às 13h foi transferida para o dia seguinte por causa das fortes chuvas que começaram a cair em Maceió no final da manhã. A partida de futebol também não ocorreu pelo mesmo motivo.

À noite houve o encerramento do Congresso Católico na Catedral com a presença de d. Manoel de Oliveira Lopes e autoridades. O orador foi o dr. Edgar Valente de Lima.

O baile na Fênix, presidida então por Américo Passos Guimarães, também foi realizado “tendo comparecido numerosos cavalheiros, senhoras e senhoritas de nossa alta sociedade”.

No dia 16 às 8 horas, como previsto ocorreu a missa campal em frente à Catedral. Foi celebrada pelo bispo diocesano e teve como orador o cônego Franklin Lima. Em seguida ocorreu a abertura da exposição de produtos agrícolas e industriais.

“A praça d. Pedro de Alcântara, onde funciona o certame, acha-se aformoseada por lindos pavilhões e a iluminação apresenta aspecto feérico”, assim descreveu o local o Diário de Pernambuco, avaliando que a concorrência de visitantes tem sido avultada.

Nos pavilhões de exposições destacavam-se os produtos da fábrica de sabão e sabonetes da firma Loureiro Barbosa & Cia. Na secção de pinturas, os mais vistos eram os quadros de Rosalvo Ribeiro e da senhorita Noemia Duarte, filha do dr. José Duarte.

Ao meio-dia, também como previsto, houve a abertura do Congresso Legislativo sob a presidência do senador cônego Capitulino de Carvalho.

Às 15 horas o batalhão escolar do Colégio 15 de Março percorreu as ruas “sendo ovacionado pelo povo”. Em frente às estátuas de Floriano e Deodoro cantaram os hinos à bandeira e o do Estado.

As regatas do Centenário aconteceram na Praia da Pajuçara com início às 11 horas do dia 17 de setembro de 1917. Foto de Luiz Lavenère

No Teatro Deodoro, às 20h, aconteceu a sessão solene do Instituto Arqueológico e da Comissão Central. Foi presidida pelo dr. Leite e Oiticica. O orador oficial foi o dr. Costa Leite. O Hino do Centenário foi cantado pelas alunas da Escola Normal.

A entrada era franca para “cadeiras, camarotes de 2ª e gerais a todas as pessoas decentemente vestidas”.

No Lyceu de Artes e Ofícios também houve comemorações. Após cantos de hinos, discursaram as alunas Maria Cortez e Diomédia dos Santos. O aluno Euclides Costa declamou a poesia “16 de Setembro”, de Cyridião Durval. Às 20 horas os estudantes fizeram uma demonstração de ginástica sueca sob a direção do professor Colombo Silva.

Houve ainda, no dia 16, a inauguração do busto do dr. Bráulio Cavalcante à praça do Montepio numa iniciativa do Centro Cívico Bráulio Cavalcante. Discursou o bacharelando Povina Cavalcanti e a concorrência foi regular.

A atividade mais animada, entretanto, foi a do Jockey Club no Prado, que fez correr sete páreos. O grande prêmio (dois contos de réis) foi entregue ao puro sangue “Goshawk” montado por Manoel Martins. Em segundo ficou “Roldan”.

No dia 17 de setembro, além das regatas realizadas às 11 horas na Pajuçara, houve o lançamento da pedra fundamental da Nova Capitania Tenente Coronel Sebastião Francisco de Mello e Povoas, às 15 horas.

Para encerrar, houve “divertimentos públicos” à noite na praça Floriano Peixoto, com batalha de confetes e serpentinas, corso de automóveis e fogos de artifícios.

Assim Alagoas comemorou seu primeiro centenário de emancipação em 1917.

4 Comments on Comemorações do Centenário da Emancipação Política de Alagoas em 1917

  1. Nossa, quanta elegância naquela época, em ler isso dá até para voltar no tempo (nem minha vó tinha nascido e meu avô só tinha 4 anos), deveria ser lindo aquele tempo, claro que com seus problemas para a época, ah se pudesse voltar no tempo, essa praça Dom Pedro II deveria ser esplêndida junto com a cidade ao todo. 😌😊

  2. Alexandre Toledo // 9 de junho de 2021 em 22:59 //

    Afinal, na praça da Catedral repetiram os pavilhões de 1859, da visita do Imperador?
    “No largo da Matriz, a sua comissão construiu quatro arcos nas quatro embocaduras da praça e um palanque para a música junto ao Paço Imperial.” Duarte, p.86

  3. Alexandre Toledo, acredito que sim. Só não identifiquei o palanque para música.

  4. Ricardo Ramalho // 7 de novembro de 2022 em 22:10 //

    Riqueza de detalhes. Expõe muito bem a linguagem da época e os costumes. As foto são verdadeiros testemunhos das importantes comemorações.

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