A andarilha Estátua da Liberdade de Maceió

Estátua da Liberdade na Praça do Centenário, onde permaneceu de 1939 até 1956

Em 14 de junho de 1905, o jornal Gutenberg divulgou que Sampaio Marques, “ilustrado snr. dr. Intendente da Capital” havia autorizado demolir o muro que servia de base para o gradil do Jardim de Jaraguá para transformá-lo num centro de recreio, dando-lhe “a elegante feição das praças modernas”.

Soube-se também, por este mesmo meio, que o projeto de reurbanização do Jardim, que ficaria conhecido como dos Dois Leões, estava sob a responsabilidade de Rosalvo Ribeiro, renomado pintor e artista plástico de Alagoas com formação no Rio de Janeiro e em Paris.

O muro fora ali erguido a partir de 20 de dezembro de 1869, quando o então presidente da Província, José Bento Figueiredo Júnior, autorizou o engenheiro Frederico Mery a dar início às obras do Jardim de Jaraguá, que teria acesso controlado por  muro, gradeamento e portão de ferro.

“O viajante, ao saltar, ficará agradavelmente impressionado, deparando com uma praça de estilo moderno, tendo em frente um elegante chafariz, no centro bancos, canteiros e arborização, e sobre pilares do muro lampiões que mais tarde podem ser iluminados a gás carbônico”, detalhou.

Consulado Provincial antes de 1918, ainda com um só pavimento, e a futura Praça Dois Leões

Surge a Praça e a Liberdade

Da mesma forma que o Jardim de Jaraguá, a reurbanização do local criou expectativas na população, que esperava ter a praça inaugurada no dia 16 de setembro de 1905, como chegou a ser anunciado.

Demonstrando que a obra não tinha o melhor planejamento, mesmo estando sob a responsabilidade de um grande artista, soube-se em 22 de agosto pelo Gutenberg que o intendente acabara “de fazer importante encomenda de objetos de arte, bancos e estátuas para a ornamentação do jardim de Jaraguá”.

No dia seguinte, uma nota informava que a Intendência da Capital havia requerido ao ministro da Fazenda “a isenção de direitos do material importado para o embelezamento do jardim de Jaraguá”.

Dois dias depois, 24 de agosto, foi divulgado que Sampaio Marques havia escolhido “entre outras, duas belas estátuas representando o Comércio (Mercúrio) e a Hospitalidade”. O Gutenberg esclareceu ainda que a escolha foi feita de acordo com Rosalvo Ribeiro e “a encomenda dessas estátuas já foi feita para a Alemanha”.

Frederic Auguste Bartholdi, escultor francês da Estátua da Liberdade

Em 6 de fevereiro de 1906 há o anúncio de que as obras da praça haviam sido retomadas. Estavam interrompidas a espera do material que “havia sido encomendado para a Alemanha”.

Na mensagem de início de ano que o intendente encaminhou ao Conselho Municipal, publicada no dia 13 de fevereiro de 1906, esclareceu Manoel Sampaio Marques que não inauguraria o Jardim de Jaraguá porque “estão a chegar da Europa diversas estátuas decorativas, fontes, lampiões, bancos, etc, sem os quais será impossível dar uma ideia do que ali deve ficar para a satisfação pública”.

Para felicidade do administrador público da capital, as obras de arte que faltavam chegaram no final de fevereiro, como divulgou o Gutenberg de 1º de março de 1906.

“As estátuas encomendadas para a França pelo ilustrado sr. dr. Sampaio Marques, operoso Intendente Municipal, acabam de chegar.
São cinco, uma delas representando a Liberdade (cópia d’après Bartholdi) medindo, do pedestal à cabeça 2m05. É uma belíssima composição, cujo original foi erigido na baía de Jook. As outras são: um tigre, um leão, um javali e um lobo, medindo de altura noventa centímetros por noventa e quatro de comprimento, estátuas estas bem modeladas pelo preconizado artista A. Jacquemar [Henri Alfred Jacquemart].
Com duas, vindas da Alemanha, que já estão colocadas, perfaz o número de sete.
Estas duas representam a Garça e a outra as Duas Irmãs. Essas composições são de distinto artista.
Chegaram também, em número de oito, postes para lampiões e revérberos e mais acessórios. Os modelos são o que há de mais chic e elegante”.

O Jardim de Jaraguá foi inaugurado festivamente no domingo, 29 de abril de 1906, às 5 horas da tarde, já com a denominação de Praça Wanderley de Mendonça. Depois seria conhecida como dos Dois Leões, em desrespeito ao imponente tigre. O felino asiático, um ilustre desconhecido no Brasil, foi “promovido” a leão.

Passeio por Maceió

Estátua da Liberdade na Praça 18 do Forte de Copacabana

Em 1918, o governador Baptista Accioly promoveu a reforma da Ponte de Jaraguá, que ficava a poucos metros da Praça Wanderley de Mendonça, e resolveu valorizar a pequena área que ficava nos fundos da Recebedoria e para lá transferiu a Estátua da Liberdade e outras obras de arte. No lugar da obra de Bartholdi foi erguido um obelisco.

Em 1939, em plena ditadura Vargas, os interventores Osman Loureiro, no estado, e Eustáquio Gomes de Mello, na capital, resolveram comemorar os cem anos da data em que a vila de Maceió foi promovida a cidade e capital da província.

Entre as várias inaugurações ocorridas em 9 de dezembro de 1939, foi entregue à população a Praça do Centenário, valorizada pela presença da Estátua da Liberdade, gentilmente sequestrada da então Praça 18 do Forte de Copacabana.

Estátua da Liberdade na Praça do Centenário

Quando tudo levava a crer que a nossa Liberdade ficaria para sempre na importante praça do Farol, a Lei nº 115 de 25 de março de 1950 resolve que a  general Pedro Aurélio de Góis Monteiro, alagoano de São Luís do Quitunde e uma das figuras exponenciais nos vários governos de Getúlio Vargas, principalmente na Revolução de 1930, passaria a ser homenageado na praça. E assim surgiu a Praça Góis Monteiro, com direito a estátua do militar.

Relegada ao ostracismo, lá se foi a nossa Liberdade ladeira abaixo, desta feita para a Praça Manoel Duarte, no início da Pajuçara, onde soberanamente dominou o espaço, levando o local a ser conhecida como Praça da Liberdade.

Em 1994, o então prefeito Ronaldo Lessa devolveu a Liberdade para a sua segunda moradia, na Praça 18 do Forte de Copacabana, onde se encontra até hoje.

Mitos sobre a nossa Liberdade

A Estátua da Liberdade na Praça Manoel Duarte

A principal estátua da Liberdade, denominada A Liberdade Iluminando o Mundo foi a erguida em Nova Iorque e inaugurada em 28 de outubro de 1886. Foi um presente aos Estados Unidos por terem conquistado a independência, derrotando os ingleses dez anos antes. Na verdade, mais uma provocação francesa aos ingleses, seus históricos adversários.

Com a ajuda de recursos arrecadados com o povo francês, a ideia do historiador francês Edouard de Laboulaye só começou a ser projetada pela equipe do escultor Frédéric Auguste Bartholdi em 1875.

Um detalhe importante: toda a estrutura interna desta estátua foi feita por Gustave Eiffel, que foi convidado em 1881 por Bartholdi para ajudá-lo a construir o monumento. Eiffel também foi o responsável pelo projeto, a partir de 1884, da Torre francesa que o eternizou.

Mesmo antes da estátua da Liberdade ser inaugurada em Nova Iorque, outra em menor proporção e que serviu de modelo para Bartholdi foi doada em 1885 à cidade de Paris e colocada na Ilha dos Cisnes, próximo da Torre Eiffel. Sua inauguração, com a presença do seu idealizador, ocorreu no dia 15 de novembro de 1889. Essa réplica tem 11,5m e 14 toneladas.

Estátua da Liberdade no Jardim de Luxemburgo na França

Outra versão reduzida em bronze, também uma doação de Bartholdi, foi entregue em 1900 ao Museu de Luxemburgo e colocada em seus jardins seis anos depois. Esta réplica segura uma tábua com a inscrição “15 de novembro 1889“, uma referência ao dia da inauguração da primeira réplica colocada na Ilha dos Cisnes.

Esta data coincide com a emancipação da República no Brasil, o que motivou mal-entendidos com as cópias expostas no Brasil.

A Liberdade do Jardim de Luxemburgo ficou por lá até 2012, quando foi levada para o Museu d’Orsay.

O Museu de Artes e Ofícios de Paris expõe ainda uma maquete da estátua montada pelo próprio Bartholdi, inteiramente em gesso. Mais duas réplicas estão em Paris e mais quatro no interior da França.

No Brasil, algumas réplicas foram instaladas no final do século XIX e início do XX. Eram peças da Fundição Val D’Osne, com sede na França. Por aqui desembarcaram encomendadas por particulares ou governos. Eram anunciadas nos catálogos da empresa e vendidas para várias cidades.

Estátua da Liberdade na Vila Kennedy em Bangu, no Rio de Janeiro

Uma destas estátuas está no Rio de Janeiro, mais precisamente na Praça Miami, Vila Kennedy, em Bangu. Foi comprada pelo Barão de Rio Branco, José Maria da Silva Paranhos Júnior, e permaneceu por muito tempo na casa do comendador José Pereira da Rocha Paranhos, na Urca.

Em 1964, foi adquirida pelo governador Carlos Lacerda e colocada onde está até hoje, na Vila Kennedy, conjunto habitacional construído durante o seu governo com recursos da Aliança para o Progresso, instituição americana.

Essa réplica foi tombada pelo prefeito Marcelo Crivella por meio do Decreto nº 43216 de 26 de maio de 2017. Considerou o mandatário que “esta estátua é uma réplica oficial em escala reduzida da Estátua da Liberdade, ambas as obras do escultor Frederic Auguste Bartholdi”.

Existem dezenas de réplicas destas centenárias Estátuas da Liberdade produzidas pela Fundação Val D’Osne espalhadas pelo mundo. Todas são valorizadas por reproduzirem a obra de Bartholdi.

Em alguns lugares, de vez em quando surgem movimentos que tentam transformar as réplicas em esculturas originais do artista francês, mesmo que não se tenha nada que comprove isso.

Recentemente, por exemplo, foi suscitada uma polêmica sobre a existência de apenas três peças dessas com a originalidades de serem cópias produzidas pelo próprio Bartholdi, e a de Maceió seria uma delas.

Não há documento ou depoimento algum que confirme essa possibilidade. As únicas que assim podem ser consideradas estão em Paris.

Lamentavelmente, o município de Maceió não é proprietário de obra única, exclusiva, mas tem um excelente conjunto de peças produzidas pela Fundição Val D’Osne precisando de cuidados.

Catálogo da Fundição Val D’Osne com a Estátua da Liberdade

 

Raras imagens do Gogó da Ema e da Estátua da Liberdade em Maceió em trecho do filme O Gigante, montado em 1968 com imagens colhidas anos antes.

4 Comments on A andarilha Estátua da Liberdade de Maceió

  1. Bom dia! Estou realizando um TCC sobre as fotografias antigas de Maceió para o curso de jornalismo. Vocês poderiam me passar as referênicas desse texto? Gostaria de me aprofundar na história e contexto da Estátua da Liberdade na cidade.

  2. O texto é de autoria do pesquisador e jornalista Edberto Ticianeli. Na referência você pode utilizar o endereço d postagem: https://www.historiadealagoas.com.br/a-andarilha-estatua-da-liberdade-de-maceio.html

  3. Obrigada! Usarei.

  4. Fernando Correia de Araujo Junior // 4 de outubro de 2021 em 22:35 //

    Estou voltando a Maceió depois de quase dois anos longe pela pandemia. Há alguns anos que não passo pelo centro. Estou profundamente abalado com a destruição da cidade. Lojas e casas abandonadas , lacradas com paredes de tijolos, Lixo por toda parte, praças destruidas, sem casa acampados .. uma parte enorme da costa na região central perdida. Um litoral que em um local civilizado valeria ouro o metro quadrado, ocupado por ruinas e favelas verticais. Uma industria que destruiu mais de 05 bairros , contando com o entorno na praia, O predio do Colegio Estadual , o Ginasio anexo, o predio da Secretária de Educação em ruinas, vandalizados , destruidos queimados. A Portuguesa que foi um clube tradicional da classe média transformado em “shopping popular” Maceió é o retrato médio do mundo maior. As grandes cidades estão nesse mesmo caminho e uma fenda abissal está sendo aberta entre a população mais rica que é mínima e a população mais pobre que é incomensuravel. Eu temo pelo resultado disso pois as pessoas acreditam que vamos estar á salvo em condominios de luxo, reduto de um bem estar que ainda não percebeu que o mundo é todo interligado

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