Santa Luzia do Norte, onde os holandeses foram derrotados

Prefeitura Municipal de Santa Luzia do Norte nos anos 80

O atual município de Santa Luzia do Norte surgiu de uma concessão de uma propriedade pertencente a Jorge de Albuquerque Coelho e entregue a Miguel Gonçalves Vieira, filho do provedor das rendas reais de Pernambuco, Diogo Gonçalves Vieira. Eram cinco léguas de terras que estendiam ao longo da costa, a partir de Paripueira no sentido sul.

Igreja Matriz Santa Luzia de Siracusa, em Santa Luzia do Norte

Segundo Werther Brandão, o documento mais antigo conhecido sobre o lugar é o “traslado da escritura de doação de uma légua em quadro nas ribeiras do Mundaú, feita pelo filho do primitivo sesmeiro [Miguel Gonçalves Vieira], Diogo Gonçalves Vieira, homônimo do avô, a Antônio Martins Ribeiro“.

Com data de 1610, a escritura informa que “ora se está fazendo a villa e povoando a dita terra“. Antônio Martins recebeu a doação de uma dessas léguas com a condição de ali se levantar um engenho de açúcar no prazo de quatro anos. Honrou o compromisso.

Continua Werther Brandão em seu rico estudo publicado na Revista do Arquivo Público de Alagoas em 1962: “No mapa 14 do Livro que dá Razão do Estado do Brasil — 1612 [de Diogo de Campos Moreno], Santa Luzia é a única localidade assinalada sob a designação de vila — Vila Nova de Santa Luzia do Norte — e nas adjacências já surgem dois engenhos, identificados por Diégues Júnior como o Nossa Senhora da Encarnação e o Nossa Senhora da Ajuda“.

Brandão historia ainda sobre a existência de um documento, datado de 15 de dezembro de 1608 e registrado no Livro de Tombo do Mosteiro de São Bento de Olinda, que faz referência ao lugar como sendo Nossa Senhora da Luz da Villa Nova de Santa Luzia do Norte, revelando que Diogo Vieira já havia feito uma doação anterior e que não conseguia mais precisar o local “por se acharem muitos moradores acomodados nas ditas terras”.

Esse povoamento de 1608 comprova que a ocupação das terras teve início antes desta data e que, portanto, não se pode atribuir a Antônio Martins Ribeiro o pioneirismo. Demonstra ainda que o próprio Diogo Vieira foi quem iniciou o desbravamento, repassando as terras, posteriormente, a Antônio Martins Ribeiro.

Santa Luzia do Norte em 1912

Holandeses

Durante a ocupação holandesa do norte do Brasil, o povoado entrou para história ao enfrentar com heroísmo um violento ataque das tropas batavas.

Em 1633, após saquearem Alagoas do Sul (atual Marechal Deodoro), onde queimaram a igreja de N. S. da Conceição e sacrificaram várias vidas, os soldados holandeses se dirigiram ao povoado de Santa Luzia do Norte, imaginando que também não encontrariam resistência.

Para surpresa deles, a população fora avisada do ataque e estava entrincheirada, repelindo heroicamente os agressores. A defesa do povoado localizado às margens da Lagoa do Norte, depois Mundaú, foi comandada por Antonio Lopes Filgueiras.

Craveiro Costa descreve o combate: “Cada casa foi transformada em fortaleza, onde se abrigavam os habitantes, dispostos à morte em defesa do burgo. A fuzilaria, intensa e mortífera, dizimou o invasor. A luta foi renhida. O inimigo acabou desistindo do seu intento, recuando”.

Os danos ao povoado foram poucos, mas naquele combate Coqueiro Seco perdeu o seu primeiro vulto histórico: Antonio Lopes Filgueiras.

Dois anos depois, a vila formou uma companhia de milícias, “que serviu ao lado de outras três, remanescentes do terço do conde de Bagnuolo que, batido em Porto Calvo, se refugiara na povoação”, cita Werther Brandão.

Praça Getúlio Vargas Santa Luzia do Norte

Por ter uma localização privilegiada, à margem da Lagoa Mundaú, o povoado cresceu rapidamente e durante o período colonial chegou a ser o mais importante entre os povoamentos banhados pelo Rio Mundaú e sua lagoa.

Em 10 de dezembro de 1830 foi desmembrado de Alagoas (Marechal Deodoro) e elevado à categoria de vila, com sede em Santa Luzia de Alagoa do Norte, instalada em 13 de junho de 1831. Santa Luzia do Norte ainda pertenceu a Pilar e Maceió.

No final do século XIX, com o povoado de Rio Largo sendo beneficiado pela estrada de ferro, a sede da vila foi perdendo importância econômica.

Primeira eleição

Elevada à categoria de município ao ser desmembrado de Rio Largo pela Lei Estadual nº 2.464, de 23 de agosto de 1962, Santa Luzia do Norte teve como primeiro prefeito o sr. José Gomes da Silva, que assumiu o cargo interinamente por nomeação do governador Luiz Cavalcante.

Paulo Vicente de Lima foi o primeiro prefeito eleito de Santa Luzia do Norte. Foto de 1964

Na primeira eleição municipal realizada em Santa Luzia do Norte, no mês de agosto de 1963, além dos vereadores, foi eleito prefeito o cidadão Antônio Holanda, que derrotou Paulo Vicente de Lima por poucos votos de diferença. Holanda não pôde assumir por ser primo do prefeito interino.

Em nova eleição, Paulo Vicente de Lima venceu Deoclécio Feitosa por 4 votos de diferença.

Os componentes da primeira Câmara Municipal foram diplomados e empossados em 29 de outubro de 1963 pelo então Juiz Eleitoral, doutor Ivens Malta Gato, em solenidade realizada na sede da Sociedade Musical Professor Vanderlei.

A sessão inaugural da primeira legislatura foi presidida pelo vereador mais votado, Deoclécio Feitosa, que dirigiu a sessão para eleição da Mesa Diretora, que ficou assim formada:

Presidente: Deoclécio Feitosa
Vice-Presidente: Manuel Moreira da Silva
1º. Secretário: Antônio Romeiro de Lima
2º. Secretário: Valdir Mascarenhas

O primeiro prefeito eleito nasceu no dia 30 de junho de 1930 e tinha origem humilde. Paulo Vicente de Lima foi casado com Inês Nicácio de Lima e tiveram 11 filhos, entre eles os jornalistas e repórteres fotográficos Plínio Nicácio, Marcos Nicácio e Paulo Nicácio.

Antes de se envolver com as eleições de Santa Luzia do Norte, Paulo Vicente de Lima foi operário da Fábrica Alexandria e membro atuante do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria Têxtil de Alagoas. Foi demitido da fábrica por sua atuação em defesa da categoria. Saiu e levou com ele sua esposa, também operária.

Valdir Mascarenhas foi o 2º secretário da Mesa da Câmara eleita em 1963

Com a indenização no bolso e algumas peças de tecido doadas por um gerente, foi morar em Satuba e mascatear tecidos entre Santa Luzia do Norte, Coqueiro Seco, Satuba e Rio Largo.

Em Santa Luzia do Norte estabeleceu boas relações com o líder político Benedito Mascarenhas e seus familiares. Estimulado por eles, filiou-se ao PTB por admirar o trabalhismo de Getúlio Vargas e aceitou ser candidato a vereador naquela primeira eleição, com o compromisso de apoiar Valdir Mascarenhas, filho de Benedito, para prefeito.

Entretanto, logo se descobriu que Paulo Vicente tinha mais chances de chegar à Prefeitura que Valdir Mascarenhas. Inverteu-se a chapa.

Sem muita experiência e tendo que enfrentar todo tipo de adversidade para a partir do nada estruturar uma Prefeitura, Paulo Vicente pouco conseguiu realizar.

Por outro lado, a oposição nunca perdoou a sua inesperada vitória e a todo momento tentava desestabilizá-lo.

Para completar sua via crucis, após o Golpe Militar de 1964 novas forças políticas começaram a atuar em Alagoas e em breve muitos vereadores, prefeitos e deputados foram afastados dos seus mandatos populares sob denúncia de corrupção ou utilização indevida do dinheiro público.

Segundo depoimento de Paulo Vicente, com ele não foi diferente. Sem qualquer fundamento foi acusado de ter desviado uma fortuna da Prefeitura. Preso e mantido na Cadeia Pública de Maceió por 90 dias, foi afastado do mandato pelos vereadores

Em 10 de fevereiro de 1965, assumiu o seu vice, João Lopez Rodrigues. Paulo Vicente foi cassado em 15 de junho de 1965.

“Eu poderia ter saído da prisão com 30 dias, mas não tinha dinheiro para advogado e, mesmo inocente da acusação, tive que esperar que a Justiça me devolvesse a liberdade”, revelou o prefeito destituído argumentando que nada provaram contra ele.

Paulo Vicente de Lima faleceu cobrando o reconhecimento de sua inocência

Querendo recuperar sua imagem, iniciou um processo para reaver o mandato, mas, segundo ele, foi aconselhado pelo major Nilo Amorim a não tentar. Poderia ter que enfrentar reações violentas. Chegaram a lhe oferecer um empréstimo no Banco Itaú para que montasse um comércio e seguisse com a vida fora da política.

Nos 10 anos seguintes, voltou a vender tecidos e depois foi morar em Maceió, onde começou a trabalhar como encanador na Companhia de Saneamento de Alagoas (Casal) e depois na empresa JR, quando prestou serviços na Salgema e ETFAL.

Paulo Vicente de Lima faleceu no dia 30 de maio de 2019, em sua casa na Rua Félix Bandeira, Ponta Grossa, em Maceió.

Formação Administrativa

Em divisão administrativa referente ao ano de 1991, a vila é constituída do distrito sede.

Elevado à condição de cidade com a denominação de Santa Luzia do Norte, pela lei estadual nº 696, de 13 de julho de 1915. Sob a mesma lei transferiu a sede da vila de Santa Luzia do Norte para a povoação de Riacho Largo.

Em divisão administrativa referente ao ano de 1933, o município é constituído de 2 distritos: Santa Luzia do Norte e Rio Largo (sede).

Assim permanecendo em divisões territoriais datadas de 31 de dezembro de 1936 e 31 de dezembro de 1937.

Pelo decreto-lei estadual nº 2361, de 31 de março de 1938, baixado pelo governo estadual, o município de Santa Luzia perde a condição de município passando a ser distrito do então município de Rio Largo.

Em divisão territorial datada de 1º de dezembro de 1960, Santa Luzia é distrito de Rio Largo.

Elevado à categoria de município e distrito com a denominação de Santa Luzia do Norte, pela lei estadual nº 2464, de 23 de agosto de 1962, desmembrado de Rio Largo. Sede no atual distrito de Santa Luzia do Norte ex-povoado. Constituído do distrito sede. Instalado em 15 de dezembro de 1962.

Em divisão territorial datada de 31 de dezembro de 1963, o município é constituído do distrito sede.

Assim permanecendo em divisão territorial datada de 2007.

Fontes: Jornais, depoimentos, IBGE e o livro História das Alagoas, de Craveiro Costa.

4 Comments on Santa Luzia do Norte, onde os holandeses foram derrotados

  1. Dário Augusto // 17 de outubro de 2015 em 08:10 //

    Um artigo sobre minha cidade natal é sempre uma alegria e deleite para leitura.

  2. matheus Cavalcanti // 14 de dezembro de 2020 em 13:00 //

    Boa tarde. Tem conteúdo sobre a igreja Matriz da Cidade?

  3. Aqui é Maria Luiza
    É emocionante ter informações sobre minha cidade!!

  4. Para completar algumas informações de pessoas conhecidas, peço, se possível, enviar para meu e-mail, algumas fotos da Igreja que ficava perto da margem da Lagoa Mundaú, e que foi demolida para a construção da estrada que dava acesso ao Município de Coqueiro Seco. A construção da estrada, segundo relatos, foi devido a impossibilidade do transito de veículos, quando a mare estava alta e impedia a passagem de veículos. Favor enviar fotos e datas dessa ocorrência. Agradeço antecipadamente. AT. RB.

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