Sandoval Caju, o Conversador

Sandoval Ferreira Caju, alto, cabeleira cheia, paraibano de muito talento, nascido em 16 de novembro de 1923 na pequena cidade de Bonito de Santa Fé, alto sertão da Paraíba, depois de uma temporada no Rio de Janeiro voltou a João Pessoa impressionando aos seus amigos na província ao apresentar um cartão de visita confeccionado em linho, com a seguinte inscrição: Sandoval Caju, locutor da Rádio Relógio do Distrito Federal.

A Rádio Relógio era exatamente isso, apenas hora certa, durante 24 horas. Astuto, palavra fácil e muito espirituoso Sandoval Caju em pouco tempo se tornou um dos maiores radialista do Nordeste, na Rádio Tabajara da Paraíba.

Sandoval Cajú, seu pai José Cajú e seu irmão Orpheu Cajú

Sandoval, filho de José Ferreira Caju e Tamires Ferreira Guarita, um dia veio a Maceió para se encontrar com o irmão mais velho Genival, que não via há mais de três anos e que aqui cursava a Faculdade de Direito de Alagoas, como conta em seu livro de memórias “O Conversador”, impresso na Sergasa e lançado em 1991:

“Eram cinco e meia da tarde de 10 de maio de 1947 quando desembarquei na cidade em que teria de permanecer cerca de quinze dias, segundo um compromisso de honra assumido por mim perante a minha própria pessoa”.

Só que ficou em Maceió durante 47 anos, até o seu falecimento em 23 de maio de 1994. Casou-se com D. Waldette Loiola Caju e tiveram três filhos.

Com seu jeito irreverente, espirituoso, repentista, ingressou na Rádio Difusora de Alagoas onde fez o seu primeiro grande programa de auditório, Palito de Fósforo: o programa incendiário dos auditórios.

Sempre de branco, para ser mais claro

Sempre de branco, para ser mais claro. Comício da campanha em 1960

Autorizado por uma licença médica em 1951, foi passar três meses em João Pessoa. Lá aceitou o convite do
diretor-geral para trabalhar na Rádio Tabajara, onde assumiu a função de locutor chefe. Apresentava os seguintes
programas: Quartel General do Rádio, Página Poética e Papos Noturnos.

Seis meses depois voltou a Maceió e como havia sido demitido da Rádio Difusora, foi ser repórter do Jornal de Alagoas e corretor de publicidade de rádio e jornal.

Em 1958, com o programa Tribuna do Povo na recém-criada Rádio Progresso, passou a liderar a audiência ao
expor os problemas da capital.

Como locutor e animador de auditório, gozando de grande prestigio popular, aproveitou os espaços que os seus programas ofereciam e fez vitoriosa carreira política. Durante a campanha ia para as praças todo vestido de branco e, de cima de um caminhão, começava seus discursos com a seguinte frase:

– “Vim de branco para ser claro”!

E tanto foi de branco e tanto foi claro que acabou vitorioso. Foi eleito, em 3 de outubro de 1960, prefeito de Maceió. Nesta campanha contou com o apoio do alagoano Marechal Floriano Peixoto, que já tinha morrido em 1895.

Marcou um comício para a Praça dos Martírios em frente à estátua de Floriano Peixoto. A praça cheia, começou a falar e de repente abriu os braços:

Marechal Floriano, vós que sois o patrono da terra das Alagoas, dizei a este povo se estais ou não estais apoiando a candidatura de Sandoval Caju à Prefeitura de Maceió.

Sandoval Caju

Sandoval Caju

A praça em silêncio, esperando. Sandoval, braços ao vento, insistia:

– Respondei, Marechal! Respondei! – Depois, com a voz embargada e os olhos marejados de gratidão, gritou:

– Obrigado, Marechal! Muito obrigado! Quem cala, consente!

Venceu a eleição derrotando Jorge Quintela, Joaquim Leão e Cleto Marques Luz. Sandoval ganhou em em todas as 223 urnas da capital.

Durante a campanha, como Joaquim Leão recebeu o apoio da Rádio Progresso, houve uma tentativa por parte do deputado federal Ary Pitombo, proprietário da Rádio, em convencer Sandoval desistir da candidatura.

Em represália, o Tribuna do Povo foi retirado do ar. Voltou dias depois como um jornal semanal de quatro páginas.

Sandoval tomou assumiu o mandato somente no 1º de fevereiro de 1961, cumprindo o estabelecido pela legislação da época, que a posse deveria ocorrer 120 dias após as eleições.

Como havia sido eleito sem o apoio de vereadores e havia tomado posse na Prefeitura e não na Câmara, iniciou seu mandato em conflito com o legislativo municipal. Uma semana após já era alvo de processo de “impeachment” por parte de um grupo de vereadores liderados por Domício Falcão. Os eleitores não aprovaram a iniciativa e a Câmara, na Praça Deodoro, foi cercada por milhares de pessoas em protesto. Os vereadores recuaram.

Trabalhando com desenvoltura o que atualmente é considerado como “marketing“, elegeu a construção e recuperação de praças como as ações que permitiriam que deixasse sua marca na cidade. E assim aconteceu: a letra “S”, de Sandoval, passou a ser parte integrante da reurbanização dos espaços públicos da capital. Construiu 36 novas praças e recuperou 22 das existentes.

A arquiteta Josy Ferrare, no excelente documentário “Sandoval Caju, além do Conversador“, destacou que “a grande revolução urbanística promovida por Sandoval Caju foi nas praças. Ele mudou a forma do traçado – o layout, modificou a forma dos bancos, que eram até então simples, segmentados, e passaram a ser contínuos, sinuosos, alguns na forma que ele desenvolveu do “S”; bancos circulares em volta de troncos de árvores. Ele deu toda outra dinâmica às praças”.

O Mijãozinho da Praça Sinimbu logo após a inauguração, obra da gestão do prefeito Sandoval Caju

Foram estas praças que receberam televisões públicas, atraindo verdadeiras multidões para vê-las. Cada unidade dessas foi inaugurada solenemente. Na época, uma aparelho de televisão era muito caro, o que impedia o acesso da maioria da população a este veículo de comunicação.

Foi responsável, entre outros feitos, por projetar o jovem economista Divaldo Suruagy para a política. Suruagy era Chefe da Divisão dos Impostos Predial e Territorial, quando recebeu o convite de Sandoval Caju para assumir a Direção-Geral da Municipalidade. Meses depois, no final de 1962, foi promovido a Secretário-Geral de Administração.

No início de 1964, quando começaram as especulações sobre os possíveis nomes que se envolveriam na disputa do governo de Alagoas em 1965, Sandoval Caju despontou entre os mais comentados. Em seu livro O Conversador, Sandoval admite que essa possibilidade foi difundida tão amplamente, que não se podia “mais deter as manifestações de apoio espontâneo vindas de toda parte, – desde o homem-da-rua da cidade aos próceres políticos interioranos”.

Sandoval avaliou que foi esta possível candidatura que incomodou o governador Luiz Cavalcanti e seu grupo político. Pretendiam controlar a sucessão do governador em 1965 e assim passaram então a “maquinar um meio” de afastar o prefeito da capital da disputa.

Isso somente foi possível com o golpe civil-militar de abril de 1964. Sandoval Caju foi cassado e deixou a Prefeitura no dia 8 de abril daquele ano. Seus direitos políticos somente forma restabelecidos em janeiro de 1979.

Em entrevista para o Diário de Pernambuco de 21 de fevereiro de 1978, Sandoval contou que nos dois anos imediatamente após a cassação passou por “muitas necessidades”: “E o pior que não podia exercer a minha única profissão, a de advogado, por consequência revolucionária. Alguns débitos contraídos por mim foram pagos pelo meu pai, que veio da Paraíba. Mas depois me reabilitei, estando agora vivo e tranquilo”. Concluiu o curso na Faculdade de Direito da Ufal em 1963.

Voltou a exercer a advocacia, a partir de 1966, em Recife, mas sempre voltando a Maceió para passar o fim de semana com a família. Permaneceu nesta rotina até 1977, quando abriu mão dos clientes em Pernambuco e se fixou definitivamente em Maceió.

Em novembro daquele ano, teve sua habilitação para advogar cassada pela OAB/AL, então dirigida pelo advogado e ex-delegado Aurino Malta. O argumento foi o de que havia inadimplência nas contribuições devidas àquela instituição.

Antônio Gomes de Barros, Teotônio Vilela, Sandoval Caju e Luiz Cavalcante em um comício na Praça dos Martírios

Na campanha eleitoral de 1974, Sandoval apoiou os candidatos do MDB em Maceió e chegou a participar de alguns comícios. Mantinha imensa popularidade e quase sempre era carregado nos ombros pela multidão.

Em abril de 1976, o MDB de Maceió anunciou que Sandoval seria um dos candidatos a vereador naquele ano. Não foi. Mas em 1978 estava de volta aos palanques do partido apoiando a candidatura a deputado estadual do jornalista Bernardino Souto Maior e a de José Moura Rocha ao Senado.

Após conviver com o MDB por alguns anos, Sandoval Caju voltou à vida partidária em abril de 1981, mas em outra agremiação política: o recém-fundado Partido dos Trabalhadores. Preparava-se para disputar a prefeitura de Maceió em 1982, o que não ocorreu por determinação dos militares, que suspenderam os pleitos para as prefeituras das capitais.

Somente em 1985 foi que Sandoval Caju voltou a disputar uma eleição. Era a primeira eleição para a capital após longo período de impedimentos autoritários. Candidataram-se as seguintes lideranças: Djalma Falcão (PMDB/PSB/PCdoB), João Sampaio (PFL), Sabino Romariz (PDT), Sandoval Caju (PTB), Nilson Miranda (PCB) e Reinaldo Cabral (PT). Houve ainda a candidatura de José Buarque por um curto período. Ele se retirou da campanha para apoiar Djalma Falcão, que venceu o pleito com 56.174 votos. Sandoval conseguiu 2.oo9 votos, ficando em quarto lugar.

Sandoval Caju faleceu no dia 23 de maio de 1994, aos 70 anos, vítima de câncer de pulmão.

Do texto original de Pedro Macedo (AQUI) com inserções de informações do texto de Divaldo Suruagy (AQUI), do livro O Conversador, disponível (AQUI) e jornais da época.

14 Comments on Sandoval Caju, o Conversador

  1. Sou neto de Sandoval Cajú. Por gentileza corrigir o detalhe que Sandoval Cajú faleceu em 1994, e não em 1974. Obrigado.

  2. Léo Caju, já corrigimos o erro. Obrigado pela contribuição.

  3. Francisco Ferreira caju // 1 de outubro de 2015 em 22:14 //

    Não tive contato com Sandoval mais sei que foi um homem de uma sabedoria sem limite.

  4. Mirian Luiz // 18 de abril de 2016 em 00:32 //

    Com esta manifestação histórica política, acabei lembrando de Sandoval Caju o qual conheci na minha adolescência e estudei com sua filha Daniela, gostaria muito de ter notícias. Há 21 anos sai de Alagoas e perdi o contato.

  5. Adriana de Paula // 30 de janeiro de 2017 em 09:10 //

    Sou Adriana neta de Sandoval Caju e filha de Marcos que mora no Rio de Janeiro,e tive o prazer de conhecê-lo antes que Deus o levasse.Um homem bom.

  6. Meu pai Moises Vieira Alves, trabalhou com ele na epoca que ele era prefeito. eram amigos, segunda minha familia trabalho tb na campanha p prefeito dele.

  7. Marcos Silva // 16 de julho de 2017 em 10:31 //

    Tenho 45 anos, mas ainda vi alguns discursos de Sandoval Cajú em Maceió.boas lembranças, parabéns Ticianelli!

  8. Clemenceu Caju // 19 de julho de 2017 em 20:36 //

    Sou filho de Sandoval Cajú, favor corrigir a data de falecimento. O correto é 23/05/1994.
    Obrigado.
    Clemenceau Caju

  9. A correção foi feita. Obrigado.

  10. Marcos Monte // 30 de abril de 2020 em 14:59 //

    Quando do afastamento do Prefeito Sandoval Caju, assumiu a prefeitura de Maceió o então presidente da Câmara Municipal, vereador Antônio Milton Pessoa (Marinho) Falcão.

  11. Lenir soares // 16 de maio de 2020 em 02:20 //

    Sou professora de história aposentada.
    Gostei muito de conhecer esse grupo, e rememorar fatos e conhecer outros, referentes a nossa querida Alagoas.

  12. Henrique Gomes // 8 de junho de 2020 em 14:55 //

    Ola, Sr. Edberto Ticianeli, meu nome é Henrique Gomes e estou escrevendo uma dissertação de mestrado sobre Sandoval Caju e o bairro da Ponta grossa. Gostaria muito de entrar em contato por e-mail ou telefone para conversarmos um pouco sobre o tema. desde já agradeço
    atenciosamente
    Henrique Gomes

  13. Pedro Rosset Filho // 23 de março de 2021 em 21:27 //

    Cheguei de São Paulo, minha cidade natal, em fevereiro de 1969, no início desse mesmo ano, conheci e comecei um namoro com Adélia Caju, logo conheci seus pais, e comecei a frequentar sua casa, daí surgiu uma grande amizade com Sandoval onde batiamos longos papos e, como bom ouvinte, gostava de ouvir suas estórias, onde ele sempre explicava a diferença de história para estória e dele ouvi diversos causos. Mesmo quando deixei de namorar sua filha, continuamos amigos, e, tinhamos um respeito mutuo grande. Eu sempre o admirei muito, tenho muito orgulho de tê-lo conhecido e a seus familiares, aos quais tenho muito carinho.

  14. Thiaguinho // 9 de agosto de 2022 em 19:53 //

    Conheci Sandoval pela Maceió antiga no Instagram com certeza esse Homem foi um Bom Prefeito uma Pena eu não ter conhecido ele Pessoalmente Mais adoraria conhecer sua Família 👪 Moro em Maceió

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