Quem matou Tobias Granja?

O advogado e jornalista foi assassinado com um tiro na nuca no dia 15 de junho de 1982, na Rua Augusta, Centro de Maceió, quando tinha com 37 anos de idade

Tobias Granja, no centro da mesa, participa de uma confraternização

Francisco Guilherme Tobias Granja nasceu em Palmeira dos Índios no dia 13 de fevereiro de 1945. Filho de Manoel de Araújo Granja e de Maria Bernadete Tobias Granja.

No início da década de 1960, com 15 anos e já morando em Maceió, destacou-se como líder estudantil secundarista, chegando a presidir a União dos Estudantes Secundarista de Alagoas, a UESA. O historiador e professor Douglas Apratto, que foi seu colega na UESA, lembra dele como jovem que sempre alimentou o sonho de ser político e que tinha um discurso contundente:

“Num Congresso estudantil em Palmeira dos Índios, que também participei, ele fez um veemente pronunciamento contra o deputado federal, padre Medeiros Neto, que tinha como principal reduto eleitoral aquele município e andou distribuindo máquinas de costura com os eleitores. Os familiares do padre foram avisados e se dirigiram ao local portando armas à vista de todos. A sorte foi que a Polícia também foi alertada e chegou a tempo de impedir uma cena de faroeste, retirando sob sua proteção o intrépido orador”.

Tobias Granja no julgamento do Cabo Henrique. Foto de José Feitosa do acervo de Bartolomeu Dresh

Ainda jovem, começou a trabalhar no Banco Brasil e logo após o Golpe Militar de 1964 foi tentar a vida no Rio de Janeiro, de onde voltou em 1966 para lançar-se candidato a deputado estadual pelo MDB. Obteve boa votação, mas não conseguiu ser eleito. Tinha 21 anos de idade.

Retornou ao Rio de Janeiro onde consagrou-se como jornalista, sendo repórter do O Jornal e das revistas Manchete e Cruzeiro, nesta foi chefe de reportagem.

Após ser aprovado no vestibular, iniciou o curso noturno de Direito, em março de 1967, na Faculdade Brasileira de Ciências Jurídicas, no Rio de Janeiro. Esse curso foi autorizado em 1952. A Faculdade era privada e administrada pela Sociedade Universitária Escola Superior do Comércio.

Em 29 de dezembro de 1968, casou-se com a alagoana de Santana do Ipanema Railda Vanderley, filha de Ronalso Monteiro Wanderley, que foi prefeito de Poço das Trincheiras, e de Zeni Monteiro Wanderley. A união foi celebrada na Matriz de Santana do Ipanema, às 18 horas.

Foram padrinhos do noivo o ex-deputado Abrahão Fidelis de Moura, o industrial Antônio Moreira, o dr. José Cesário Tobias Granja e senhora e o dr. Álvaro Granja e senhora. A noiva teve como padrinhos os então deputados Aloisio Nonô e Tarciso de Jesus, com suas senhoras, o sr. Rômulo Wanderley e o juiz Antônio Pereira e senhora.

A lua de mel foi em Recife e o casal foi residir no Rio de Janeiro onde Tobias Granja já estava radicado.

No dia 29 de dezembro de 1963, a UESA e o Aeroclube de Palmeira dos Índios realizaram a Festa das debutantes daquele município. Tobias Granja, que era da Uesa, dança a valsa com uma das debutantes, a jovem Zuleide Leal de Oliveira

Foi candidato a deputado federal em 1974 pela Arena, mas sem sucesso. Faltando dois meses para as eleições, avaliou: “Oprimida e sufocada pelas forças da corrupção eleitoral no interior do Estado e ainda sem cobertura oficial ou de quaisquer grupos políticos ou econômicos, minha candidatura a deputado federal pela Arena alagoana, parece-me já sem condições de sobrevivência ou de vitória”.

Não foi eleito, mas permaneceu em Maceió escrevendo uma coluna no Jornal de Alagoas e trabalhando como assessor do governador Divaldo Suruagy. Foi por causa de uma de suas notas nesse diário que quase foi assassinado pelo deputado estadual Mendonça Neto em 8 de outubro de 1975.

Na segunda-feira, dia 6 de outubro, o também jornalista Mendonça Neto protestou junto à Mesa contra colegas que faziam a cobertura da casa por estarem atrapalhando o trabalho da Assessoria da Imprensa da Assembleia.

Na quarta-feira, ficou irritado ao ler na coluna do Tobias Granja que ele estava tentando “queimar” os colegas da imprensa, com medo que eles o “queimem”. Mendonça, que era o vice-líder do MDB, foi até o presidente da Mesa, Guilherme Palmeira, e cobrou providências contra o jornalista, que fora seu amigo no Rio de Janeiro.

Guilherme não considerou como uma ofensa à casa e disse que não tomaria medida alguma. Mendonça Neto então resolveu punir pessoalmente o jornalista e saiu à sua procura nos corredores. Ao vê-lo na entrada do plenário sacou um revólver calibre 32 com a intenção de atirar em Tobias Granja.

Foi impedido pelos agentes de segurança e a arma caiu. O deputado foi levado para uma das dependências da Assembleia, onde conversou com os colegas deputados do MDB e mais tranquilo voltou ao plenário.

O presidente do Sindicato dos Jornalistas, Aldo Ivo, apresentou à Polícia queixa-crime contra o parlamentar, acusando-o de tentativa de homicídio.

Sequestro

Às duas horas da madrugada de 29 de junho de 1977, Tobias Granja dormia em sua casa no município alagoano de São Sebastião, onde passou a morar com sua segunda esposa, Mirtes Paiva Maia, quando acordou com alguém batendo fortemente na porta e se identificando como da Polícia. Gritava: “abra que você está preso”.

O jornalista respondeu que não abriria a porta àquela hora e ela foi posta abaixo por chutes e coronhadas e a casa invadida por soldados sob o comando de um sargento de nome Ulisses. Mais tarde, Tobias denunciou à OAB que sumiram um envelope com documentos, uma arma com o devido porte e vários cheques.

Sob ameaça e violência, foi colocado num carro e levado para Maceió, passando demoradamente por Arapiraca e São Miguel dos Campos. Na capital, por ordem do governador Divaldo Suruagy, foi posto em liberdade.

Tobias Granja denunciou à ABI e OAB que, aparentemente, seu sequestro teria sido motivado por um incidente em São Sebastião, mas acreditava mesmo que uma resposta às denúncias que tinha feito contra a violência policial em reportagem assinada, onde revelava que o delegado José Renê da Silva obrigava os detentos a ingerirem uma mistura que ele denominara de “ponche”, composta de dejetos e urina.

Cabo Henrique

Em dezembro de 1978 tem início uma verdadeira guerra em Alagoas entre as famílias Omena e Calheiros, com várias mortes de ambos os lados. Tobias Granja, que atuou na defesa do Cabo Henrique e seus irmãos no julgamento pela morte de Ernesto Calheiros, conseguiu a absolvição de todos os acusados.

Cabo Henrique

Cabo Henrique

A partir daí, segundo o jornalista José Jurandir no livro Os crimes que abalaram Alagoas, Tobias Granja “apaixonara-se profundamente pela causa, tomando-a para si, puxando-a para as entranhas do seu jovem sentimento, emotivo e sensível. Visceralmente envolvido na defesa do cabo, descambou para um verdadeiro paternalismo, ficando do lado de todos os familiares do acusado, numa ardorosa atitude de lealdade e destemor”.

O Cabo Henrique reconhecia a essa dedicação e deixou isso explicito num bilhete datado de 22 de maio de 1982, após fugir espetacularmente do Quartel da PM, onde estava detido:

Meu caro doutor Tobias, por você eu faço qualquer coisa. Você não é somente meu advogado. É meu irmão, é tudo para mim. Longe de meu Estado, de minha família e de meus amigos leais como você, sinto saudades e tenho vontade de voltar. Mas, quem sabe, um dia voltarei para Alagoas. José Henrique da Silva”.

Assassinado

No entardecer do dia 15 de junho de 1982, na Rua Augusta, Centro de Maceió, Tobias Granja foi abatido com um tiro na nuca. Tinha 37 anos de idade.

Dagoberto Calheiros foi acusado e indiciado por ser o mandante do crime. A execução foi atribuída a Nezinho, que contou com o apoio de Napoleão. Todos cumpriram pena e foram liberados por progressão de regime

O Cabo Henrique não esperou que a lei fosse cumprida e resolveu vingar a morte do advogado. O alvo escolhido por ele foi o Tenente Cavalcante Lins, também da família Calheiros e que teria planejado o crime de Tobias Granja, além de já ter contra ele denúncias por vários outros crimes.

Dagoberto Calheiros concede entrevista a Jaime Feitosa, Bartolomeu Dresh e Ailton Vilanova. Foto de Josival Monteiro do acervo de Bartolomeu Dresh

A vingança foi consumada às 13 horas do dia 13 de julho de 1982, menos de um mês após o assassinato de Tobias Granja. Cavalcanti foi morto dentro do seu fusca branco na esquina da Praça do Montepio, a poucos metros do Quartel da PM, de onde tinha saído minutos antes.

Tobias Granja, quando morreu, era candidato a deputado estadual pelo PMDB. Seu assassinato motivou forte reação dos jornalistas alagoanos, que tinham Denis Agra à frente do sindicato da categoria. O Sindicato dos Jornalistas, a OAB e outras entidades da sociedade civil denunciaram o clima de insegurança e a pistolagem institucionalizada.

Exatamente um ano antes de ser assassinado, no dia 15 de junho de 1981, Tobias havia peticionado ao presidente do Tribunal de Justiça de Alagoas. Sob o protocolo nº 22.489, ele praticamente vaticinou: “A arma contra a covardia é a fé, a convicção na verdade. Nem as emboscadas, nem as bombas nos amedrontam, porque uma ideia não morre no meio do fogo. Se for preciso, entrego minha vida em sacrifício”.

Na inauguração do Clube dos Repórteres de Alagoas, em 10 de maio de 1972 no Rio de Janeiro, estavam presentes Joarez Ferreira, Tobias Granja,  Mendonça Neto, Ivan Barros, Jorge Oliveira e outros não identificados. Ouvem uma palestra de Arnon de Melo.

Fontes:
– Os crimes que abalaram Alagoas, de José Jurandir, 2ª Edição, 2013.
– Gazeta de Alagoas, edição de 24 de maio de 2012.
– Ficha do DOPSE.
– Mozart Damasceno, o bom burguês, de Geraldo de Majella.

Frente da ficha de Tobias Granja no DOPSE

Verso da ficha de Tobias Granja no DOPSE

Verso da ficha de Tobias Granja no DOPSE

11 Comments on Quem matou Tobias Granja?

  1. Está em extinção homem como Tobias Granja.

  2. fernando da silva feitosa // 8 de junho de 2016 em 22:17 //

    saudade tobias granja..saudade do cabo henrique

  3. Henrique chagas de omena // 6 de outubro de 2019 em 18:39 //

    A família Omensa agradecemos a Tobias por sua coragem a defender o nosso Henrique somos gratos até hoje a família Tobias…

  4. Onde ficou o assassinato de Manoel Tavares da Silva? Apenas falam de pessoas notórias?Ele Manoel ,não merece? O assassino tem mais notoriedade do que o assassinado. Eu me pergunto:Porque?

  5. Pedro Banana // 5 de janeiro de 2021 em 11:04 //

    Essas famílias nem tem poder mais, olha quem governa o estado de Alagoas!

  6. Acompanhei a história do cabo Henrique e a morte de Tobias Granja,quando eu tinha 9 anos, na época, tinha familiares em Maceió q sempre nos passava as informações sobre aqueles fatos, li também o livro,por amor ao nosso pai. Esse livro ainda está com familiares.

  7. José claudio // 5 de setembro de 2022 em 07:01 //

    Faltam Cabos Henriques e Tobias Granja no Brasil. Essa Famílicia é um câncer que há de ser extirpado de nossa sociedade.

  8. Gustavo Henrique chagas de Omena // 8 de setembro de 2022 em 18:01 //

    Família Omena. agradece a coragem de Tobias até hoje. por sua lealdade e coragem .

  9. CAROL Moreira // 10 de novembro de 2022 em 11:20 //

    E meus amigos cresceram sem o pai. Sociedade hipócrita e cruel. Monstros

  10. Dagoberto tirou o meu pai de mim e do meu irmão, deixando minha mãe sozinha com 2 filhos pequenos no mundo. Dormi com ele dizendo que me amava num dia e no outro ele simplesmente deixou de existir. Fazem quase 20 anos desde então. Meu pai tinha muito pra viver ainda! Por mais que eu tente não consigo perdoar esse cara e me entristece que só comentem “por cima” sobre o que ele fez com a minha família. Meu pai também tinha uma história e pessoas que o amavam. Hoje em dia dói menos, mas o vazio que ficou continua igual, foi uma parte de mim que morreu com ele. O nome dele era Manoel Tavares da Silva, ele era pai de 2, marido, temente a Deus, extremamente inteligente e amoroso, um homem de verdade, diferente desse senhor mentiroso que o assassinou.

  11. José Ferro // 9 de junho de 2023 em 17:04 //

    Não tenho palavras para Agradecer a Família Henrique e Tobias Granja

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