Oséas Cardoso e o assassinato de Luis Campos Teixeira

Praça D. Pedro II em 1950. Palco do assassinato de Luis Campos Teixeira

No início de 1951, Arnon de Melo tomou posse no governo de Alagoas após vencer surpreendentemente Luis Campos Teixeira, candidato que tinha o apoio do então governador Silvestre Péricles.

Mesmo tendo sofrido durante a campanha ataques pesados de Silvestre, Arnon de Melo iniciou o governo construindo a imagem de quem queria apaziguar os ânimos entre os vários adversários políticos, principalmente entre Oséas Cardoso, do seu grupo político, e Campos Teixeira, que mesmo derrotado, assumira a presidência da Caixa Econômica em Alagoas.

Campos Teixeira, de óculos e escuros e terno preto, ao lado de Silvestre Péricles. Foto do Jornal de Alagoas

A rixa entre os dois vinha das perseguições que Oséas e a família sofreram por determinação de Campos Teixeira durante o governo de Silvestre Péricles, sendo a maior das agressões o assassinato de João Cardoso Paes, pai de Oséas, crime ocorrido em Maceió no dia 17 de fevereiro de 1950, no interior do Hotel Aurora, de propriedade da vítima.

Oséas Cardoso afirmava à época que os mandantes seriam Campos Teixeira e Silvestre Péricles. O governador e o seu grupo político, em resposta, atribuíam a Oséas e ao pai a autoria de vários crimes em Alagoas.

Oséas Cardoso na prisão. Foto de Indalécio Wanderley para O Cruzeiro

Oséas Cardoso na prisão. Foto de Indalécio Wanderley para O Cruzeiro

Para se ter uma ideia das animosidades, dias após o crime o jornal A Manhã, do Rio de Janeiro, publicou a resposta do governador Silvestre Péricles a um comunicado do ministro da Justiça Adroaldo Costa: “Em resposta ao radiograma desta data, 18 do corrente, cumpre-me informar que João Cardoso, conhecido matador e roubador, foi ontem morto a tiros nesta cidade, tendo a autoridade policial instaurado o competente inquérito“.

E prosseguiu: “Seus filhos sempre foram coniventes nos crimes por ele praticados. Atribui-se a morte de João Cardoso a vingança privada da família de alguma de suas vítimas. Entre as pessoas por ele assassinadas contam-se o dr. Venceslau Batista, juiz de Direito do município de Viçosa, e Epifânio Paixão, proprietário no município de Capela”.

Concluiu: “A sociedade alagoana recebeu com indiferença a notícia da morte de João Cardoso, em virtude de se tratar de veterano latrocinista, egresso da Penitenciária do Estado. Cordiais saudações. a) Silvestre Péricles – governador do Estado”.

“Cabra da peste, você vai morrer”

No início da tarde, às 14h40, do dia 30 de maio de 1951, em frente à Assembleia Legislativa de Alagoas, Oséas Cardoso se aproximou por trás de Campos Teixeira, que conversava com Juvenal Guimarães, bateu no seu ombro e disse:

— Vira pra cá, cabra da peste, que você vai morrer.

Reconstituição do crime. Foto de Indalécio Wanderley para O Cruzeiro

Reconstituição do crime. Foto de Indalécio Wanderley para O Cruzeiro

Em seguida, segurando o revólver com as duas mãos, desfechou cinco tiros em Campos Teixeira, que ainda tentou reagir jogando a capa, que estava em seu braço, contra a arma na tentativa de atrapalhar os disparos. Oséas livrou-se da capa e continuou a atirar até ver seu adversário cair.

O autor dos disparos ainda tentou escapar entrando no Parque Hotel e saindo pelos fundos do prédio na Praça dos Palmares, mas foi perseguido pelo deputado José Lucena.

Foi preso em flagrante, levado à 1ª Delegacia e em seguida recolhido à Penitenciária de Maceió. Ao ser abordado durante a prisão, foi perguntado sobre o motivo do crime. Mostrou o retrato do pai no Necrotério e respondeu: Pai é pai.

Campos Teixeira, foi socorrido pelo deputado José Lopes e levado ao Pronto Socorro, onde foi atendido pelos doutores Abelardo Albuquerque, João Fireman e Ib Gatto Falcão. Chegou a receber quatro litros de sangue em transfusão, mas não resistiu à gravidade dos ferimentos e faleceu às 19h30 daquele mesmo dia, sendo o seu corpo levado para sua residência na Rua Epaminondas Gracindo, nº 127, na Pajuçara. Foi sepultado no dia seguinte no Cemitério da Piedade, no Prado.

Enquanto aguardava a deliberação da Assembleia sobre a autorização para ser processado, Oséas Cardoso recebeu na penitenciária o apoio de vários deputados e lideranças políticas. O Diário de Pernambuco de 3 de junho revelou que ele sofria de “continuados ataques de choro, necessitando sempre de assistência médica devido à tensão nervosa“.

Oséas Cardoso em umas crises de choro quando estava detido. Foto de Indalécio Wanderley para a O Cruzeiro

Oséas Cardoso em uma das crises de choro quando estava detido na Penitenciária Estadual. Foto de Indalécio Wanderley para a O Cruzeiro

No dia 30 de maio, o deputado Muniz Falcão, correligionário de Campos Teixeira, procurou o ministro de Justiça Negrão de Lima e denunciou a falta de segurança no Estado, culpando o governador Arnon de Melo pela ausência de garantias.

“O sr. Oséas Cardoso é um matador contumaz. É uma figura lombrosiana, com vários crimes nas costas. Quando era rapaz, matava para roubar, a mando de terceiros”, acusou Muniz Falcão em matéria publicada na Tribuna da Imprensa de 31 de maio de 1951.

O chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, general Pedro Aurélio de Góis Monteiro, alagoano e irmão de Silvestre, em entrevista publicada no jornal Folha Carioca, reproduzida no Diário de Pernambuco de 1º de junho de 1951, afirmou que o crime tinha natureza política.

Campos Teixeira foi candidato a governador quando das últimas eleições. Foi, também, prefeito de Maceió e um dos principais colaboradores de Silvestre. O atual governador [Arnon de Melo], que é udenista, esteve há pouco tempo aqui tentando afastar Campos Teixeira da presidência da Caixa Econômica. Por essa ocasião, Teixeira se sentia ameaçado de morte, segundo me revelou”, denunciou o general Góis Monteiro.

Oséas recebe a solidariedade de vários deputados. Foto de Indalécio Wanderley para O Cruzeiro

Oséas recebe a solidariedade de vários deputados. Foto de Indalécio Wanderley para O Cruzeiro

Dizendo-se não estar surpreendido com o crime, o general Góis Monteiro afirmou ainda que outros crimes viriam. “Esse deputado Oséas Cardoso, que já é autor de mais de 20 mortes, com certeza será solto em breve. Ele é um bandido, mas é o símbolo da representação de Alagoas na Assembleia Legislativa, tendo sido o mais votado. Teve mais sufrágio que eu. A insensibilidade moral em Alagoas chegou ao auge. É uma terra perdida“.

No dia 5 de junho, a Assembleia Legislativa de Alagoas deliberou por 17 votos contra 13 que o deputado Oséas Cardoso fosse solto imediatamente.

Por 16 votos contra 14, o Poder Legislativo decidiu ainda negar autorização para que ele fosse processado. Ao término da sessão, uma comissão de deputados se dirigiu à Penitenciária de Maceió para comunicar o resultado da votação ao deputado detido, que chorou emocionado e em seguida deixou a prisão.

Dias depois, em entrevista, Oséas Cardoso insinuou que solicitaria à Assembleia que concedesse a autorização para que ele fosse processado, evitando assim o desgaste que estavam tendo ele e o poder legislativo. A ideia não foi levada adiante e o crime ficou impune.

7 Comments on Oséas Cardoso e o assassinato de Luis Campos Teixeira

  1. João Marcos Carvalho // 18 de fevereiro de 2016 em 21:02 //

    É simplesmente inacreditável o “salvo conduto” dado pela TJ de Alagoas a um assassino preso em flagrante e que matou seu adversário com cinco tiros à queima roupa. Passados 65 do assassinato de Campos Teixeira, parece que a prática de distribuir “salvo-condutos” continua em moda nesse generosa terra.

  2. Fernando Augusto de Araujo Jorge // 18 de fevereiro de 2016 em 21:40 //

    Conheci de perto o deputado Oseas Cardoso e sempre o tive como homem de bem, cometeu alguns crimes, mas segundo ele todos foram em legítima defesa quer da vida ou da honra.

  3. SEBASTIÃO IGUATEMYR CADENA CORDEIRO // 19 de fevereiro de 2016 em 10:00 //

    É UMA AMOSTRA DO D. N. A. DESSA TERRA ( APPALLOSA ) TODOS SABEM QUE ESTE ATAVISMO , SEMPRE EXISTIU E SEMPRE EXISTIRÁ , POIS , A BARBÁRIE SEMPRE PREVALECERÁ NAS AÇÕES DESSE POVO .

  4. Clênio Tenório Paes // 20 de fevereiro de 2016 em 10:00 //

    Me criei no convívio e tenho como um homem que lutou pela vida e pela honra

  5. Antonio de Padua // 26 de fevereiro de 2016 em 23:44 //

    Tive o prazer de conhecer o cidadão Oseas Cardoso já morando em Brasília e representante da cooperativa dos usineiros de Alagoas, frequentei sua casa Mansao Pajucara em Brasília e quando criança em companhia dos meus pais sua casa em Maceio nas proximidades da praça do centenário, com ele tivemos muitas conversas, tive ainda a oportunidade de acompanha-lo a Câmara dos Deputados em Brasília quando ele foi da entrada na sua aposentadoria de Deputado Federal, nunca deixou de usar seu revólver taurus calibre 38 e gostava das tardes frescas com ventos amenos de Brasilia onde viveu por muitos anos, tendo seu escritório no Edifício São Paulo, era um bravo defêmero das coisas de Alagoas, fiel aos amigos e verdadeiramente inimigo dos seus inimigos, assim era Oseas Cardoso.

  6. Regis Freedom // 21 de julho de 2016 em 00:36 //

    Esse irá prestar contas no juízo final, caso não tenha se arrependido. Nos Estados Unidos, teria mofado na cadeia, tanto ele, como os assassinos do Pai.

  7. Alexandre Neves Baptista // 23 de julho de 2021 em 03:38 //

    Com certeza quem irá prestar conta É o General Silvestre de Góis Monteiro, Munis Falcão, seu sogro o Presidente da assembleia Legislativa á época do tiroteio (ele antes de chegar na assembleia encomendou 23 caixões de defunto, a intenção dessa pessoa tão boa era matar os 23 Deputados de oposição.
    O Silvestre de Góis Monteiro interventor a época antes de Arnon , mandou dois policiais (Jagunço de confiança dele), matar o Deputado Oséas Cardoso que se encontrava na Farmácia Pontestur no Centro de Maceió. (Lógico morreram os Jagunços né?), O General que era um louco e covarde ficou como um louco batendo na mesa, e dizendo, mas como vai matar e morre!!!!
    Foi aí que O Deputado teve que deixar o Estado, e Campos Texeira arquitetou o assassinato do Pai do Deputado, Oséas Cardoso, que foi uma verdadeira Chacina, com á morte do velho João Cardoso e duas filhas feridas a bala, Marieta Cardoso e Nair Cardoso.
    Quando podo ele não matou oGeneral Silvestre de Góis Monteiro para atender um pedido do irmão do General, o Senador Ismar de Góis Monteiro, que deu total apoio a família, e a ele principalmente e pediu para se pudesse não fizesse. (Na minha opinião um erro), Oséas Cardoso sempre foi um homem honrado de uma palavra só, de uma coragem fora do normal, uma moral ímpar, quem teve o privilégio de conhecê-lo sabia disso.
    Amigo dos amigos.
    Se for para falar bem da família Cardoso Paes, não tem página de internet que chegue…..

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