Cine São Luiz, o velho Cinearte

Cine São Luiz nos anos 70

O Cine São Luiz, antes de vir a ser um dos mais modernos cinemas da capital, foi inicialmente o Cinema Floriano da Empresa Conte, construído e instalado na Rua do Comércio, Maceió, em dezembro de 1912 (O Norte – RN – de 19 de dezembro de 1912).

Entre as novidades para a época, o cinema oferecia os serviços de dois bufetes: um interno, para atender os ingressavam no seu salão, e outro voltado para a rua do Comércio.

Podia-se comprar neles conservas, frutas, queijos, manteigas, doces e cervejas.

Uma de suas atrações era a orquestra, considerada pela imprensa da época como “harmoniosa e mágica”.

Cineteatro Floriano foi construído em 1913

Funcionava também como uma casa de espetáculos. Em 1916 apresentou um grupo de chineses “exímios prestidigitadores em magia branca e acrobatas extravagantes”, elogiava o Diário do Povo.

O italiano Stefano Conte (também tratado como Estevam Conte ou Estevão Conte) era estabelecido na Paraíba, onde fundou a Empresa Cinematográfica Conte e no final de 1911 arrendou o Cineteatro Rio Branco, Cinema Popular e o Cinema Pathé em João Pessoa. Tinha como sócio o norueguês Einar Svendsen, também morador em João Pessoa.

Até 1908, Conte era um renomado alfaiate da Alfaiataria Conte, que em julho de 1909 tinha passado por grandes transformações e ampliado a clientela: “O maneiroso e diplomático Estevam Conte aceitou este mês, devido a festa das Neves, cerca de cem encomendas de ternos”, registrou naquele ano O Norte, da Paraíba.

Seus primeiros investimentos em Maceió ocorreram em 1912, quando arrendou os cinemas Helvéticas e Delícia. Quem veio da Paraíba para gerenciar estas duas casas foi o sr. Tobia de Paci. Em Maceió, além de investir em diversão, Conte se apaixonou e casou-se com Flávia de Araújo Lima Caldas Xexéo. No dia 19 de março de 1917, o casal embarcou no vapor “Bahia” e foi morar em João Pessoa, onde Conte já tinha negócios.

Depois de também construir o Cinema Floriano em dezembro de 1912, Conte instalou outra sala de exibição na Levada, como noticiou o Diário do Povo de 16 de janeiro de 1917: “Inaugurou-se, anteontem, no princípio da Rua 16 de Setembro, o Cinema Popular, pertencente à Empresa Conte. A função inaugural teve animadora concorrência”. Conte havia vendido o Cinema Floriano a Hypolito Paurílio da Silva.

Rua do Comércio com o Relógio Central e o Cinema Floriano nos anos 20

É provável que foi a partir do Cinema Popular que surgiu o projeto de José Cavalcanti Filho e Iago Coelho, com o apoio do padre Pedro Cavalcanti de Oliveira, para a construção do Cinema Ideal, inaugurado somente em 23 de dezembro de 1928, como informou o Jornal de Alagoas: “Anexo aos festejos do Natal, no Parque Rio Branco, será inaugurado hoje o Cinema Ideal que proporcionará ás exmas. famílias e ao publico em geral, durante as festas de Natal, Ano Bom e Reis, atraentes sessões cinematográficas, com fina e escolhida programação e a preços populares”.

Este Cinema Popular não é o mesmo que entrou em funcionamento em meados de agosto de 1911 no amplo prédio da Rua do Comércio, 37 e 39. Anunciava que a entrada custaria 400 réis, “ao alcance de todos”. Pertencia a Empresa Flores & Cia e deve teve vida curta.

No final do primeiro mês de funcionamento, já publicava que reduziria as exibições para os sábados, domingos, feriados e dias santificados. “Motiva tal resolução da Empresa a pouca frequência verificada durante a semana”, publicou o Gutenberg.

Outro cinema que se estabeleceu também na Rua do Comércio, próximo à Porta do Sol, foi o Odeon. Começou a funcionar em 1915. Ficava na Rua do Comércio numa sala estreita e comprida onde depois se instalou a Padaria Três Coroas e a Loja Super Decorações.

Seu proprietário era o violinista e despachante federal Hypolito Paurílio da Silva, que também tocava na orquestra do cinema ao lado de João Ulysses, Manoel Lopes, José Abreu e Manoel Mattos, que tinha como regente Tavares de Figueiredo.

Foi nessa orquestra que Antônio Paurílio, filho de Hipólito, começou a brilhar ao piano, acompanhado por Ulisses Moreira no violoncelo; Manoel Lopes Ferreira Pinto no violino e na flauta, Narciso Maia.

O Cinema Odeon, posteriormente, foi vendido a Luiz X. Machado.

Cine Teatro Floriano, nos primeiros anos da década de 1930, exibindo Frankenstein de Boris Karloff (de 1931)

Foi esse mesmo Hypolito Paurílio que, no dia 30 de janeiro de 1917, em sociedade com Raul Brito, adquiriu o Cinema Floriano. Foi reaberto duas semanas depois.

Outro casa de exibição que veio a participar da história do Cinema Floriano foi o Capitólio, inaugurado no dia 22 de fevereiro de 1927. A escolha do seu nome foi realizada pelos leitores do Jornal de Alagoas, que votaram até o dia 31 de janeiro e essa denominação recebeu 3.534 votos.

O Cinema Capitólio pertencia a Francisco César Pinto (Cesar Pinto & Cia) e funcionava “em um elegante prédio sito à rua do Comércio. Possui um salão de espera profusamente iluminado e uma orquestra magnífica. O salão de projeção, amplo e confortável, tem um serviço de ventiladores que iguala a mesma temperatura do lado exterior”, divulgou O Jornal (RJ) de 17 de abril de 1927. O prédio citado era o de esquina com o Beco do Moeda.

Passinha no trombone e Antônio Paurílio ao piano na Attraction Jazz Band do Cine Floriano

Francisco Cesar Pinto, um guarda-livros e despachante bem-sucedido em Maceió, também proprietário do famoso restaurante Porta do Sol, já havia sido um dos sócios do Cinema Floriano.

A empresa Capitólio, no final da década de 1920, era proprietária do Cinema Delícia e do Capitólio. A Silva & Cia. (Hipólito Paurílio da Silva) controlava o Floriano e o Odeon.

E o Floriano falou

Segundo O Jornal de 13 de abril de 1930, o Cinema Floriano tinha sido remodelado e reabriria apresentando o cinema falado “com os mais modernos aparelhos do  ‘super Photóphone da Rádio Corporation‘, que são os primeiros a serem instalados aqui no Norte. Esses admiráveis auto-falantes irão estrear com ‘Folies 1929‘”.

Assim, o cinema falado foi apresentado aos alagoanos. Foi um ruidoso sucesso a fita em preto e branco Fox Movietone Follies, produzido em 1929 pela norte-americana Fox Film Corporation.

Na verdade a estreia teria ocorrido no dia 4 de abril, mas o atraso na publicação da reportagem com o anúncio do evento somente aconteceu depois dele realizado.

Cinema Capitólio em 11 de outubro de 1930 na esquina do Beco do Moeda com a Rua do Comércio

Em 1931, a Empresa Exibidora Industrial Ltda anunciava que era proprietária em Maceió dos cinemas Floriano, Odeon e Popular. Estava estabelecida na Rua do Comércio, 181.

Não se tem informações mais detalhadas sobre as causas, mas o Floriano abriu falência e sua massa falida foi adquirida pela Empresa Cesar, Paiva & Cia, que tinha como sócios principais o mesmo Francisco César Pinto e alguém da família Paiva. O Capitólio também pertencia a esta mesma firma.

Sabe-se pela revista Novidade em 1º de agosto de 1931 que o Tribunal Superior anulou a venda da massa falida do cinema Floriano por seu liquidatário, considerando que o sr. Antônio F. Antunes era credor da massa falida.

Não se conhece como foi resolvido o impasse, mas a partir de 1933 o Cinema Floriano passou a ser o Cinema Capitólio, e este fechou as portas no seu antigo endereço. Em 1936, o Capitólio pertencia a Manoel Tibúrcio.

Na década de 1940 já era o Cinearte, de propriedade de Sebastião Ferreira Santos, também proprietário dos cinemas Rex, Ideal e Royal.

Foi nesse período que viveu seus dias de glória. Sempre funcionando na Rua do Comércio, manteve esta denominação até 9 de julho de 1957.

Era um dos principais cinemas da cidade e ponto de referência para encontros no Centro da capital.

Nos anos 50, por falta de investimentos e maiores cuidados, começou a apresentar problemas, revelando o seu estado de abandono, recebendo críticas e perdendo público.

Elinaldo Barros, em Recordações de um Cinema de Bairro, cita que em dos carnavais da época um carro alegórico fez sucesso por imitar uma imensa caldeira, em alusão ao calor do cinema.

No dia 6 de julho de 1957, estudantes universitários promoveram uma manifestação na porta do Cinearte. Houve repercussão até na Assembleia Legislativa. Era a famosa Fila Boba.

Cinearte no dia 17 de maio de 1945

Os jovens formavam uma enorme fila em que havia um revezamento entre os mesmos, sem ninguém comprar ingressos e sem deixar os outros usuários comprarem.

No dia 9 de julho de 1957, o Cinearte fechou as portas e entrou em reforma, voltando a funcionar somente no dia 27 de fevereiro de 1959, já sob novo nome: Cine São Luiz, com poltronas estofadas, ar-condicionado e tela em cinemascope.

O filme de reestreia foi Tarde de Mais Para Esquecer, com Cary Grant e Debora Kerr. Com as novas instalações, o cinema voltou a ser frequentado, havendo sessões em que a Rua do Comércio ficava interditada pela multidão ao trânsito.

Dois episódios marcaram o cinema da Rua do Comércio nos anos 60. O primeiro deles foi em abril de 1962, quando durante a construção do Banco Econômico, em terreno vizinho, surgiu uma rachadura na parede lateral do prédio. Os frequentadores do cine fizeram protestos exigindo que uma perícia definisse se havia ou não risco de desabamento.

Cinearte nos anos 50, antes de fechar para reforma

Segundo Huayna Padilha, o pior aconteceu dias depois, numa tarde de sábado. “Eu estava no cinema quando se ouviu um ruído muito forte, como se algo estivesse rasgando. Foi um desespero. Sei que quando percebi eu estava do outro lado da rua, na calçada do Edifício Breda. Tudo não passou de molecagem de alguém que passou um lápis ou caneta com toda força no painel de lambri de madeira que ficava no pé das paredes. Foi uma experiência alucinante”, recorda.

Huayna Padilha lembra ainda de outro episódio envolvendo a construção vizinha: “Foi numa tarde. Caiu do décimo andar do banco em construção uma lata com concreto. Furou o telhado e o forro do cinema e caiu direto no assento de uma cadeira de canto. Se tivesse alguém sentado lá, tinha virado mingau”.

Entre o final dos anos 60 e meados dos anos 70, o Cine São Luiz foi palco do Cinema de Arte de Maceió. Uma iniciativa de Imanoel Caldas, Gildo Marçal, Bezerra Neto e Radjalma Cavalcante, então presidente do DCE da Ufal.

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O Cine São Luiz funcionou até 1996, quando fechou as portas após o crescente deslocamento das salas de cinemas para shoppings centers. O último filme exibido foi O preço de um resgate, com Mel Gibson, Rene Russo, Brawley Nolte, Gary Sinise e Delroy Lindo.

Cine São Luiz em, 1971, no lançamento do filme A Volta pela Estrada da Violência

Cine São Luiz em, 1971, no lançamento do filme A Volta pela Estrada da Violência

Cine São Luiz no início dos anos 60

Cine São Luiz no início dos anos 60

O São Luiz e a Rua do Comércio nos anos 70

O São Luiz e a Rua do Comércio nos anos 70

Cine São Luiz em 1974, recebendo um filme de Renato Aragão

Cine São Luiz em 1974, recebendo um filme de Renato Aragão

 

8 Comments on Cine São Luiz, o velho Cinearte

  1. lenilma Xavier // 28 de março de 2016 em 20:18 //

    Recordar é viver !! Emocionada!!

  2. Júlio César // 23 de julho de 2016 em 19:21 //

    Esse filme “a volta pela estrada da violência” foi filmado em Santana do Ipanema, inclusive utilizando moradores locais como figurantes. Parabéns pela reportagem.

  3. Bruno Yuri López // 21 de abril de 2018 em 01:35 //

    Assisti a última sessão do filme O preço de um resgate em 96. Show de matéria !!!

  4. Carlos Emanuel de Melo Gomes // 30 de julho de 2019 em 18:32 //

    Belíssima reportagem. Gostaria de saber se o Filme “Marcelino pão e vinho” foi exibido em que ano na década de 50? Como também, se foi no cinema com nome de cine arte ou são Luiz? Foi o primeiro filme que eu assisti em um cinema. Agradeço se tiverem a história da minha vida.

  5. O filme Marcelino Pão e Vinho foi lançado em Recife no final de dezembro de 1957. Como o Cinearte fechou para reforma no dia 9 de julho de 1957 e somente voltou a funcionar no dia 27 de fevereiro de 1959, já sob novo nome de Cine São Luiz, podemos concluir que você viu o filme no São Luiz.

  6. Kátia Betina // 22 de junho de 2021 em 20:48 //

    Sou neta de Sebastião Ferreira Santos, um dos citados pela matéria, que ensinou minha mãe a amar o cinema, de quem aprendi sobre essa forma de amor.

  7. JOSÉ ELIAS DE OLIVEIRA II // 19 de julho de 2021 em 16:33 //

    AS LEMBRANÇAS NOS DEIXAM TODOS CHEIOS DE ESPERANÇA

  8. Q maravilha. Conheci todos os cinemas de bairros de Maceió

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