Alagoas na Revolução de 30

Da direita para a esquerda. Freitas Melro (de preto), Dom Santino, prefeito de Maceió Baltazar Mendonça e oficiais do Exército em 1930, logo após Freitas Melro assumir a interventoria da Revolução em Alagoas

No dia 3 de outubro de 1930, uma sexta-feira, movimentos articulados entre os estados do Rio Grande do Sul, Paraná, Minas Gerais e Paraíba colocaram em curso uma das trocas de poderes que mais provocariam mudanças no Brasil. Getúlio Vargas, com apoio dos militares, iria enfraquecer politicamente as tradicionais oligarquias do país.

Às 17h30 do dia 3 de outubro, revolucionários comandados por Oswaldo Aranha e pelo alagoano Pedro Aurélio Góes Monteiro tomaram o Quartel General do Exército em Porto Alegre, prendendo o comandante da 3ª Região Militar, general Gil de Almeida, e seu chefe do Estado Maior, coronel Firmo Freire.

O alagoano Pedro Aurélio de Góis Monteiro, um dos principais articuladores da Revolução de 30

Em seguida se apossaram do Arsenal de Guerra e dominaram o 3º e 4º Regimentos de Cavalaria Divisionária.

Na madrugada do dia seguinte, avançaram para o 7º Batalhão de Cavalaria. Os rebeldes tomaram, com poucas exceções — o Regimento de Cavalaria Independente, em São Borja resistiu pouco tempo —, os quartéis e guarnições do Exército em todo o Estado.

Estava deflagrado o movimento que às 3h da tarde de 1º de novembro de 1930 empossaria Getúlio Vargas como presidente, encerrando a chamada República Velha e afastando do poder as oligarquias estaduais, exceto a mineira e a gaúcha. O episódio entraria para a história como a Revolução de 30.

Tentativa de resistência em Alagoas

Álvaro Paes, governador alagoano deposto em 1930

Álvaro Paes, governador alagoano deposto em 1930

Ao receber as primeiras notícias sobre os acontecimentos revolucionários, o então governador de Alagoas, Álvaro Paes, tomou algumas iniciativas para articular a resistência. Mas as informações que chegavam não eram favoráveis ao mandatário alagoano.

No dia 6 de outubro, Paes tomou conhecimento de que o governador de Pernambuco tinha abandonado o poder em fuga. De fato, no dia seguinte ele e outros políticos pernambucanos chegaram durante a madrugada ao Porto de Jaraguá a bordo de um rebocador e passaram para o vapor “Aratimbó”, do Loide Nacional, fugindo rumo ao Sul.

Mesmo testemunhando essa debandada, Álvaro Paes insistia em organizar a resistência.

Carlos de Gusmão, no livro Bôca da Grota, testemunhou que no dia 8 de outubro chegou cedo ao Palácio Floriano Peixoto. “Ambiente bom. Confiança. Se os revoltosos viessem a Alagoas haveria resistência. Esperava-se auxílio prometido pelo governo federal: navios de guerra, tropa e o General Santa Cruz”.

De Porto de Pedras chegavam notícias que as tropas revolucionárias vindas de Pernambuco já estavam em Barreiros. Lá mesmo, em Porto de Pedras, o juiz Pedro Valeriano já estava mobilizando a população em apoio à revolta.

Ainda no dia 8 de outubro, às 11h, a informação sobre a passagem por Barreiros das colunas de revoltosos em direção a Alagoas foi confirmada por José (Juca) Peixoto, filho do Marechal Floriano, chefe do distrito telegráfico e contrarrevolucionário, mas revolucionário dias depois.

No dia 14 de outubro de 1930 chega a Maceió a Coluna Revolucionária vindo de Recife

No dia 14 de outubro de 1930 chega a Maceió a Coluna Revolucionária, vindo de Recife, e desfila na Rua do Comércio

Segundo Carlos de Gusmão, o clima ficou tenso no Palácio e o governador se reuniu longamente com o major do Exército Pedro Pierre, com a presença do também major do Exército e comandante da Força Policial Reginaldo Teixeira, José Peixoto e outros.

As autoridades militares argumentavam que não tinham munição suficiente para uma resistência e o major Reginaldo disse que não mobilizaria o 20º BC para tal, porque não tinha ordens do presidente da República para isso.

Esta postura contrariava telegrama oficial do presidente que havia sido publicado no Diário Oficial autorizando o major Reginaldo a tomar todas as medidas, já que o Estado de Sítio tinha sido estendido a todo território nacional.

A Revolução em Alagoas

A primeira atividade revolucionária de 1930 em Alagoas foi uma panfletagem aérea em Maceió. Às 14h do dia 10 de outubro foram lançados boletins de um avião conclamando os alagoanos e os militares a aderirem ao movimento. O manifesto intitulado “Aos briosos camaradas do 20º BC e ao heroico povo na obre terra de Floriano Peixoto e Deodoro da Fonseca”, terminava assim:

Governo revolucionário de 1930 em Alagoas

Governo revolucionário de 1930 em Alagoas

“Confiantes de que nosso brado às armas ecoará nos vossos corações como o hino de uma alvorada em nome do Brasil, em nome das gerações de amanhã, em nome da mocidade que verte corajosamente seu sangue pela causa do bem comum, erguei-vos povo de Alagoas, companheiros do 20º BC e da Polícia Alagoana, vindo fundir com o mesmo bronze das estátuas de Floriano e Deodoro o monumento em que se há de esculpir a imagem simbólica de um Brasil novo e redimido. General Juarez Távora, Chefe da Revolução no Norte do Brasil”.

Neste mesmo dia 10 de outubro, Carlos de Gusmão viu, ao passar pela Rua do Macena às 21h30, dois carros e um caminhão sendo carregados com malas nos fundos do Palácio. Era o governador em fuga.

Algumas outras autoridades também embarcam num iate (ou barcaça) e viajaram rumo ao Sul. No final da noite do dia 10, Maceió estava com as ruas desertas e a população em pânico.

Quem assumiu o poder em Alagoas em nome da revolução vitoriosa foi o major Pedro Reginaldo Teixeira, comandante da Força Policial. Isso aconteceu à meia-noite de 10 de outubro de 1930. Ele era o oficial mais graduado do Exército presente no Estado. Isso se deu porque o comandante do 20º BC, tenente-coronel A. Castro Nascimento, tinha se deslocado para o Sul do país em missão militar da Revolução, só regressando no dia 20 de novembro de 1930.

No dia 11, confirmada a vitória da Revolução em Alagoas, o clima nas ruas era de festa, com lenços vermelhos. De “Delírio, Carnaval”, como registrou Carlos de Gusmão.

Tropas evolucionárias na Rua do Comércio no dia 14 de outubro de 1930

Tropas evolucionárias na Rua do Comércio no dia 14 de outubro de 1930

“No dia 13, cerca de 11 horas, vi passar na Rua do Comércio 66 caminhões e automóveis conduzindo uma coluna de revoltosos vinda de Recife por Palmares e Leopoldina, etc. O delírio dos que chegavam e da multidão que os recebia era uma coisa empolgante”.

No dia 14 de novembro de 1930 o Decreto nº 19.398 do Governo Provisório da República nomeou o deputado federal Hermilo de Freitas Melro como interventor em Alagoas.

Para a sua indicação, Juarez Távora esteve em Alagoas articulando as forças militares para aceitá-lo, ficando a encargo do próprio general o anúncio do interventor da sacada do Palácio Floriano Peixoto.

O secretário do Interior passou a ser Orlando Valeriano de Araújo e para a Secretária da Fazenda o indicado foi Alfredo de Maya. Sobre este primeiro núcleo do poder revolucionário em Alagoas, a avaliação de Carlos de Gusmão, homem do governo deposto, dá pistas importantes para entender o que fato estava acontecendo em Alagoas.

General Juarez Távora, ainda jovem, participando da Coluna Prestes

General Juarez Távora, ainda jovem, participando da Coluna Prestes

“Tive boa impressão diante dessas primeiras escolhas. Não recaíram sobre revolucionários, que, aliás, não sabia existissem nas Alagoas. Os dois secretários, se não foram homens da situação decaída, e não eram mesmo, estranhos eram também aos quadros da oposição”.

Revolucionários alagoanos de 1930

Revolucionários alagoanos de 1930

Freitas Melro ficou no cargo até 9 de agosto de 1931. Perdeu o poder após se desgastar na indicação do chefe da Guarda Civil. Uma verdadeira rebelião o tirou do governo.

Dois dias antes circulou um manifesto pelas ruas de Maceió convidando “o povo alagoano para um meeting, amanhã às 8 horas da manhã, na praça dona Rosa da Fonseca, a fim de que se possa demonstrar que Alagoas não é uma feitoria ao mando de quem quer que seja. Basta de tolerância! Pede-se ao comércio para só abrir depois do comício. Maceió, 7 de agosto de 1931”.

O panfleto tratava Freitas Melro como um aproveitador da Revolução que não estava à altura do cargo e traía “os verdadeiros revolucionários, como o heroico general Juarez Távora, José Américo de Almeida, Aguinaldo Menezes, Luiz de França Albuquerque e tantos outros defensores da liberdade do Brasil”.

A manifestação, que ocorreu como programada no dia seguinte, contou com oradores como Orlando Araújo, que tinha sido o secretário do Interior de Freitas Melro até que divergências, como a nomeação do chefe da Guarda Civil, o levou ao afastamento do governo.

Também discursaram o professor Auryno Maciel e Bernardes Júnior, que atacou o secretário geral Amando Sampaio Costa por ter exonerado o irmão do coronel João Alberto, engenheiro Augusto Leal de Barros, então chefe do Departamento da Viação e Obras Públicas do Estado.

Ignácio Brandão Gracindo, que não queria falar, foi convencido pela aclamação popular. Se ateve a destacar a necessidade do povo ser atendido em suas demandas.

Em seguida, os manifestantes se deslocaram alguns metros até o Relógio Oficial na Rua do Comércio, onde passaram a aguardar a adesão do Exército ao levante que pretendia depor o intendente.

Como o Exército não apareceu, resolveram ir até ele e rumaram para o quartel do 20º BC no Prado, onde souberam que uma comissão já estava no Palácio dos Martírios confabulando com o governador sobre o assunto. Para lá se dirigiram.

Como Freitas Melro estava de viagem marcada para o dia seguinte ao Rio de Janeiro e seria substituído pelo secretário geral Amando Sampaio Costa, os mais próximos a ele pretendiam apresentar essa “substituição” como o atendimento aos manifestantes.

A maioria da Comissão não concordou sob o argumento que isso não seria aceito. Por indicação do major Pedro Pierre da Silva Braga, comandante da Guarnição Federal, e dos tenentes Aguinaldo Sotero de Menezes e Francisco Nunes de Almeida, o escolhido foi o tenente Luiz de França Albuquerque, então comandante da Força Policial e Chefe de Polícia.

Tinham acabado de tomar essa decisão, quando chegaram à Praça dos Martírios os revoltosos. Tiveram acesso ao Palácio representados por uma comissão. Foram designados: Orlando Araújo, João Palmeira, Ignacio Gracindo, Auryno Maciel e Bernardes Júnior.

Após Orlando Araújo apresentar as reivindicações, foram informados pelo major Pedro Pierre que já estava tudo resolvido e que o governo seria interinamente transmitido ao tenente Luiz de França Albuquerque.

Freitas Melro, que insistia em permanecer no poder, afirmava que somente quem o colocou lá poderia tirá-lo. Assim aconteceu. Não mais retornou ao governo.

Oligarquias voltam ao poder

Na verdade, a Revolução de 30 em Alagoas começava a viver o assédio das forças políticas derrotadas, que matreiramente voltavam a ocupar espaços no poder.

Assim, a Era Vargas em Alagoas foi marcada por raros momentos de estabilidade de poder.

Abaixo a relação dos governantes até 1945. Em 15 anos, Alagoas teve 12 mandatários.

  1. Hermilo de Freitas Melro, de 14 de outubro de 1930 a 9 de agosto de 1931.
  2. Luís de França Albuquerque, de 9 de agosto de 1931 a 31 de outubro de 1931.
  3. Tasso de Oliveira Tinoco, de 31 de outubro de 1931 a 25 de outubro de 1932.
  4. Luís de França Albuquerque, de 25 de outubro de 1932 a 10 de janeiro de 1933.
  5. Francisco Afonso de Carvalho, de 10 de janeiro de 1933 a 2 de março de 1934.
  6. Temístocles Vieira de Azevedo, de 2 de março de 1934 a 1º de maio de 1934.
  7. Osman Loureiro de Farias, de 1º de maio de 1934 a 26 de março de 1935.
  8. Edgar de Góis Monteiro, de 26 de março de 1935 a 10 de maio de 1935.
  9. Benedito Augusto da Silva, de 10 de maio de 1935 a 27 de maio de 1935.
  10. Osman Loureiro de Farias, de 27 de maio de 1935 a 31 de outubro de 1940.
  11. José Maria Correia das Neves, de 31 de outubro de 1940 a 1º de fevereiro de 1941.
  12. Ismar de Góis Monteiro, de 1º de fevereiro de 1941 a 10 de novembro de 1945.
Décadas depois, o encontro dos revolucionários com o governador deposto. Freitas Melro, Arnon de Mello, monsenhor Valente, general Juarez Távora e Álvaro Paes

Décadas depois, o encontro dos revolucionários com o governador deposto. Freitas Melro, Arnon de Mello, monsenhor Valente, general Juarez Távora e Álvaro Paes

A Revolução de 1930 em Alagoas enfraqueceu o poder dos coronéis, mas não tirou deles a força política e o domínio econômico.

Nas comunidades interioranas, principalmente, alguns destes senhores diminuíram a capacidade de atuar como juízes nas contendas locais. A fraude eleitoral e a aplicação de uma justiça extremamente parcial também foram reduzidas.

Fontes:
Bôca da Grota, de Carlos Gusmão, Gráfica Gazeta de Alagoas, 1970.
Fatos para uma história da Polícia Militar de Alagoas, de José Amâncio Filho, de dezembro de 1976.
Formação Histórica de Alagoas, de Cícero Péricles de Carvalho.
Pesquisa de Olavo de Freitas Machado para o fascículo Memórias Legislativas nº 24, editado pela Assembleia Legislativa de Alagoas em maio de 1998.
Chrônicas Alagoanas, notas sobre poder, operários e comunistas em Alagoas, de Luiz Sávio de Almeida. Edufal, 2006.
Wikipédia. https://pt.wikipedia.org/wiki/Lista_de_governadores_de_Alagoas.
Fundação Getúlio Vargas. https://cpdoc.fgv.br/sites/default/files/Revista_Semana_2_2.jpg

1 Comentário on Alagoas na Revolução de 30

  1. João Marcos Carvalho // 10 de outubro de 2017 em 21:10 //

    Na foto onde está só, Juarez Távora está em plena atividade durante a Revolução de 1930. Capitão, ele tem nas mangas da túnica as estrelas de general de brigada honorário. Patente revolucionária concedida a ele até o final do conflito, em 4 de novembro daquele ano, quando Getúlio Vargas tomou o como chefe do governo provisório da República.

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