Alagoas na proclamação da Independência do Brasil

Embarque de Dom João VI para o Brasil no dia 27 de Novembro de 1807, foto de Mário Novais de um quadro do Arquivo Municipal de Lisboa

O sentimento nacionalista que mobilizava muitos brasileiros na luta pela independência, em 1822, encontrou uma Alagoas vivendo os primeiros anos de sua própria autonomia, conquistada poucos anos antes como consequência do movimento emancipador que eclodiu no dia 6 de março de 1817 em Recife e Olinda, então principais cidades da Capitania de Pernambuco.

A chamada Revolução Pernambucana expôs de forma radical as animosidades que as lideranças da próspera economia nordestina tinham com a Família Real e seu séquito, que precisavam de muito dinheiro para custear salários, comidas, roupas e festas da Corte.

Além disso, naquele período o Nordeste ainda vivia a crise econômica iniciada no século anterior, provocada pela desvalorização do açúcar, que passou a ser produzido também nas Antilhas pelos holandeses que estiveram no Brasil e dominaram a sua fabricação.

Com a redução da demanda europeia por açúcar, caiu drasticamente a produção açucareira no Nordeste, ampliando a pobreza e a miséria na região.

A nascente indústria regional tentou voltar-se para a produção de algodão e conseguiu relativo êxito, principalmente em Pernambuco. Mas não suportou a escorchante cobrança de impostos por parte da coroa portuguesa no Brasil.

Foram estas as principais causas da Revolução Pernambucana, que foi derrotada militarmente pelas forças da Coroa.

Desenho com base na planta de Maceió de José da Silva Pinto, de 1820, arquivado no IHGA. Esta planta foi encomendada pelo presidente da Província Melo e Póvoas

Como a emancipação de Alagoas ocorreu logo após esse movimento pernambucano, ainda é considerada por alguns historiadores como resultado de uma sanção de João VI aos revoltosos pernambucanos e um prêmio aos proprietários rurais do sul da Capitania, que se mantiveram fiéis à Coroa.

Os fatos de 1822 vão mostrar que na jovem província de Alagoas havia o mesmo sentimento contra a decadente monarquia portuguesa, que há séculos sugava as riquezas da Colônia.

Nos anos imediatamente após a emancipação de Alagoas, os embates entre as Juntas de Governo Provisório, que claramente atuavam em apoio às Cortes de Lisboa, e os nacionalistas vão marcar todo o processo político que levou a Colônia à Independência.

D. Pedro I. Acervo da Fundação Biblioteca Nacional

D. Pedro I. Acervo da Fundação Biblioteca Nacional

Eleita em julho de 1821 por exigência da recém promulgada Constituição portuguesa, a nossa primeira Junta foi presidida pelo coronel português Sebastião Francisco de Melo e Póvoas, que já tinha tomado posse em 22 de janeiro de 1819 como Capitão-General da Capitania das Alagoas.

Melo e Póvoas, sentindo o ímpeto pela Independência, 11 dias depois da posse cobrou das Câmaras da Vila das Alagoas (atual Marechal Deodoro) e de Maceió que se pronunciassem prometendo obediência à Corte. Isso aconteceu em um ato realizado em Maceió e deixou muita gente insatisfeita.

Outro episódio que marcou o início do ano de 1822 foi a decisão dos dois deputados alagoanos no Congresso Português — Martins Ramos e Marques Grangeiro — de não jurarem a Constituição portuguesa em clara atitude de insurgência contra a política recolonizadora.

Os deputados de Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Rio de Janeiro, Ceará e São Paulo tiveram postura semelhantes e, como punição, estas províncias perderam o direito de terem representantes na Corte (Decreto de 14 de janeiro de 1822).

Com a partida de Melo e Póvoas para Portugal, a segunda Junta foi eleita no dia 31 de janeiro de 1822, sendo presidida, também, por um português, José Antônio Ferreira Braklamy e tinha ainda os seguintes membros: José de Souza Melo (secretário), Manoel Duarte Coelho (outro coronel português), Nicolau Paes Sarmento e Antônio Holanda Cavalcante de Albuquerque.

Braklamy, que tinha a mesma postura de apoio às Cortes de Lisboa, teve que enfrentar o crescente movimento nacionalista motivado pela primeira vitória importante: a decisão de D. Pedro I de ficar no Brasil (9 de janeiro de 1822, o Dia do Fico). Com este fato, os defensores da Independência ganharam ânimo, se fortaleceram, enquanto que a Junta governativa se dividia e perdia forças.

Jose Antonio Ferreira Braklamy

Jose Antonio Ferreira Braklamy

O próximo episódio envolvendo D. Pedro I com repercussão importante em Alagoas foi a entrega a ele, em 13 de maio de 1822, do título de Defensor Perpétuo do Brasil, uma homenagem da Maçonaria adotada pelo Senado da Câmara do Rio de Janeiro.

Em aclamação ao Defensor Perpétuo, foi marcada um ato na Vila das Alagoas para o dia 28 de junho de 1822. A reunião aconteceu na Igreja Matriz com a participação da Junta de governo, clero, Senado da Câmara da Vila, oficiais de guerra, milícias e ordenanças, além da representação popular de diversos pontos da Província.

Segundo a Ata da reunião, a Junta havia requerido dias antes uma assembleia para “chamar à ordem a fermentação interna, difundida por movimentos políticos dignos de atenção superior”. Braklamy de fato queria que o ato fosse uma demonstração de respeito à autoridade do príncipe regente.

O que aconteceu foi muito diferente do planejado. Um verdadeiro levante revolucionário exigiu o afastamento de todos os portugueses do governo alagoano, com a exceção de três autoridades, entre elas o sargento-mor João Eduardo Pereira Colaço, comandante da tropa de linha da capital.

O movimento pela Independência transformou a reunião numa rebelião. Assim, populares cercaram a Igreja Matriz, ao lado do corpo de Tropa de Linha, que estava sublevado, e mais 400 voluntários amotinados sob o comando de Jerônimo Cavalcante de Albuquerque.

Uma nova Junta foi nomeada e Braklamy permaneceu provisoriamente na presidência até que o seu sucessor, o juiz Caetano Maria Lopes Gama, voltasse de viagem. O tenente-coronel português Manoel Duarte Coelho requereu licença da Junta por um ano, acreditando que poderia haver uma reviravolta política que o trouxesse novamente ao poder.

Caetano Maria Lopes Gama, o Barão de Maranguape

Caetano Maria Lopes Gama, o Barão de Maranguape

Lopes Gama assumiu por somente um mês, afastando-se para assumir o mandato de deputado da Constituinte Brasileira, onde se projetou conquistando uma cadeira no Senado do Império, para em seguida atingir o baronato com o título de Barão de Maranguape.

Em 11 de julho de 1822, em correspondência enviada ao príncipe regente, a Junta informou os acontecimentos de 28 de junho e comunicou que havia escolhido José de Sousa e Melo para a presidência da Província.

Coube ao próprio José de Sousa e Melo levar a correspondência a D. Pedro, mas este somente chegou ao Rio de Janeiro com a Independência já proclamada.

Sousa e Melo levava também correspondência do Senado da Câmara de Alagoas, parabenizando o príncipe regente e, no mesmo documento, pedindo proteção para a Vila, que avaliavam ter sido abandonada pelo governo anterior, de Melo e Póvoas.

Essa insatisfação contra Melo e Póvoas era motivada pela preferência que o governante externava por Maceió. Foi essa reclamação que deu início a uma rivalidade entre as duas vilas e que somente foi resolvida em 1839 com a mudança da capital para Maceió.

Outro fato que provocou desdobramentos foi a ascensão de Jerônimo Cavalcante de Albuquerque a vogal da junta. O grupo político liderado pelo coronel Jacinto Paes de Mendonça, de Porto Calvo, não ficou satisfeito com o poder acumulado pelo adversário político. Essa disputa entre os grupos oligárquicos terminaria por derrubar a Junta em 1823.

Uma novidade para a Vila de Alagoas após os episódios de 28 de junho foi a criação da Companhia de Infantaria Miliciana dos Pretos Forros Henrique Dias. Tinha um efetivo de 114 praças, dois sargentos, quatro cabos e não recebia soldo. Há registros da criação de outras companhias deste tipo em Alagoas.

Alagoas ainda teve participação nos momentos que antecederam a Independência quando elegeu cinco deputados à Assembleia Constituinte Brasileira. Os escolhidos foram: Caetano Maria Lopes Gama, José de Souza e Melo, Inácio Aciolli de Vasconcelos, padre José Antônio de Caldas e dr. Miguel Joaquim de Cerqueira. Este último não tomou parte da Constituinte.

O grupo político de Porto Calvo não concordou com a eleição e denunciou a Dom Pedro I o processo como fraudulento, informando que foram prejudicados os candidatos Floriano Vieira da Costa Delgado Perdigão e padre Francisco José Correa Franco. A reclamação não prosperou, mas os termos utilizados contra os três membros da Junta acusados de fraudadores serviram para acirrar os ânimos, aumentando a disputa entre as oligarquias, provocando no ano seguinte a sedição de Porto Calvo.

Segundo Craveiro Costa em História das Alagoas, os acontecimentos de 28 de junho na Vila de Alagoas colocaram a província como a primeira a se insurgir ostensivamente contra a metrópole, formando um governo de brasileiros e demitindo dezenas de portugueses de suas funções.

Nem mesmo após a proclamação da Independência os ânimos se acalmaram em Alagoas. “A campanha contra o elemento português intensificou-se”, revela o historiador alagoano.

Fonte:
– As Alagoas na guerra da Independência, de Abelardo Duarte. Publicado pelo Arquivo Público de Alagoas em 1974).
– História das Alagoas, de Craveiro Costa.
– Documentos para a história da Independência.

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